1981 no cinema
Imagem do Acervo Estadão
Recentemente muitos filmes consagrados completaram 40 anos de seu lançamento nos cinemas, ao analisarmos as suas temáticas percebemos algumas tendências e através delas podemos juntar esses filmes em vários grupos e tentar entender o que aguardava o espectador das salas de cinema da época.
1981 foi o ano do lobisomem no cinema. Foram lançados pelo menos 5 filmes com criaturas meio homem meio lobo: LOBOS de Michael Wadleigh, GRITOS DE TERROR de Joe Dante, EL RETORNO DEL HOMBRE LOBO de Paul Naschy, O JOVEM LOBISOMEM de Larry Cohen e UM LOBISOMEM AMERICANO EM LONDRES de John Landis, sendo este com certeza o mais famoso de todos, principalmente por conta da cena de transformação que garantiu um Oscar de Melhor Maquiagem para Rick Baker no ano seguinte. Contudo, apesar do enorme sucesso, o filme não gerou uma série de continuações, ao contrário de Grito… que virou uma franquia de 8 filmes, inclusive a sequência direta deste primeiro tem o curioso subtítulo “Sua irmã é um lobisomem”(!!!). O filme de Paul Naschy pertence a uma tradição do cinema de horror espanhol, mas que infelizmente por aqui é mais conhecido pelos fãs hardcores do gênero. “Lobos” também passou batido à época, contudo, o mais desconhecido aqui é O Jovem… que era na verdade uma comédia com temática de horror, que era o gênero mais popular da época.
Além dessa tivemos também DEPOIS DA SEXTA 13 de Howard R Cohen, que apesar do nome (também no original em inglês) não é uma paródia dos filmes de Jason, mas sim um filme que faz referência aos filmes antigos de monstros. Paródia mesmo dos filmes de assassino mascarado é STUDENT BODIES de Mickey Rose, que se vangloriava de ser a primeira paródia do sub-gênero recém-criado e contava com um assassino de voz rouca que narra o trailer do próprio filme e seu massacre tem como cenário o ambiente escolar, como sugere o título.
Aliás vários filmes de assassino mascarado em série daquele ano seguem uma temática escolar, como por exemplo ESCOLA NOTURNA de Ken Hughes, FINAL EXAM de Jimmy Huston e DIA DE FORMATURA de Herb Freed, provavelmente inspirados por BAILE DE FORMATURA do ano anterior com a Jamie Lee Curtis. Mas também a temática de acampamento continuava forte, pois tivemos A VINGANÇA DE CROPSY de Tony Maylam e SEXTA-FEIRA 13 PARTE 2, desta vez finalmente com Jason como o assassino. E assim como Jason, Michael Myers também ganha um novo filme sobre ele, HALLOWEEN II de Rick Rosenthal, que se passa quase todo em um hospital, assim como HOSPITAL MASSACRE de Boaz Davidson. Para completar, também tivemos dois assassinos sangrentos usando uniforme e máscaras de gás: DIA DOS NAMORADOS MACABRO de George Mihalka e QUEM MATOU ROSEMARY de Joseph Zito
E por falar em Jamie Lee Curtis, 1981 foi ano em que tentaram assassinar seus personagens em tela, pois além de enfrentar novamente Michael Myers no Halloween, ela estrelou também a cinebiografia para a TV, MULHER ARDENTE: THE DOROTTY STRATTEN STORY de Gabrielle Beaumont, sobre uma ex-playmate da Playboy que fora assassinada e esteve na trilha de um assassino nas estradas australianas em JOGOS DE ESTRADA de Richard Franklin sobre um homem que suspeita que o motorista de uma caminhonete verde seja um assassino e passa a perseguí-lo.
A mesma Austrália que nos deu JOGOS DE ESTRADA, nos daria naquele ano a obra-prima do cinema do país: MAD MAX 2: THE ROAD WARRIOR sequência do clássico que tornou Mel Gibson famoso em todo mundo (GALLIPOLI também de 1981 ajudaria a consolidar esse sucesso)e que também consagrou o diretor George Miller que nos deu também esse filme que se tornaria mais clássico ainda pois inspiraria centenas e centenas de imitações até os dias de hoje, pois todo filme pós-apocalíptico copia ou esse filme ou FUGA DE NOVA YORK de John Carpenter também daquele ano e cujo anti-herói Snake Plissken, interpretado magistralmente por Kurt Russell, serviu de inspiração para o personagem Solid Snake da franquia de games “Metal Gear” e sua trama ecoa até hoje em várias outras. De FUGA DO BRONX a ESQUADRÃO SUICIDA
E por falar em herói de ação, naquele ano Steven Spielberg nos apresenta Indiana Jones, o arqueólogo mais badass de todos os tempos com OS CAÇADORES DA ARCA PERDIDA. No mesmo ano em que Ronald Reagan inicia seu primeiro mandato, Harrison Ford interpreta um herói com figurino muito parecido com o que o republicano usou em HONG KONG em 1952, em que seus parceiros eram uma mulher e um garoto oriental, bem como na sequência INDIANA JONES E O TEMPLO DA PERDIÇÃO (o que denota bem a inspiração que o diretor foi buscar nas matinês dos anos 50 para sua trilogia). Assim como os filmes citados no parágrafo anterior este aqui também gerou inúmeros clones na década de 80 como TUDO POR UMA ESMERALDA, AS MINAS DO REI SALOMÃO, AVENTUREIROS DO FOGO dentre outras.
Para quem gosta de filmes esportivos tivemos o vencedor de prêmios Oscar CARRUAGENS DE FOGO que consagrou a trilha sonora do Vangelis e menos premiado, mas bastante marcante FUGA PARA A VITÓRIA de John Huston, que conseguiu a proeza de reunir astros do calibre de Sylvester Stallone, Michael Caine e Max Von Sydow e astros de futebol como Ardilles, Bobby Moore e Pelé
O medievalismo marcou presença em uma obra aclamada (EXCALIBUR de John Boorman), em uma bomba (O DRAGÃO E O FEITICEIRO, um caso de fracasso da Disney, que é algo difícil de ver hoje em dia, mas mais comum nos anos 80 ) e em um filme que se passa nos dias atuais (CAVALEIROS DE AÇO de George Romero).
O erotismo também se fez presente nos lançamentos de 1981. As ascendentes comédias adolescentes como PORKY’S e UMA PROFESSORA MUITO ESPECIAL dividiam espaço com o suspense. O thriller CORPOS ARDENTES escrito e dirigido por Lawrence Kasdan com Kathleen Turner querendo se livrar do marido e viver um romance tórrido com William Hurt. Não bastasse o nome fazer referência a calor tanto em português quanto no original em inglês (BODY HEAT), os atores parecem estar suando o tempo todo e a várias referências a quentura, o que reforça essa ideia. Menos quente na temperatura, mas provocando calores tivemos MULHER OBJETO de Sílvio de Abreu, com várias cenas de nudez e uma carga de terror psicológico ao mostrar uma protagonista (Helena Ramos) que sofreu um forte trauma no passado, que a faz deixar de ter relações com seu esposo (Nuno Leal Maia) ao mesmo tempo em que fantasia com outras pessoas
Por falar nisso, e aqui no Brasil? O falecimento de Nelson Rodrigues no ano anterior, que coincidiu com o lançamento de OS SETE GATINHOS de Neville d’Almeida deve ter instigado os cineastas a adaptarem as obras dele para o cinema, pois no mesmo ano sairiam BONITINHA, MAS ORDINÁRIA de Braz Chediak, ENGRAÇADINHA de Haroldo Marinho Barbosa e BEIJO NO ASFALTO de Bruno Barreto (este é do ano anterior, mas foi lançado mundialmente em 1981). Curiosamente, todos os 3 filmes são referência até hoje e ganharam novas versões, respectivamente a versão de Moacir Góes de 2013, a minissérie da Globo de 1995 abordando as duas fases de Engraçadinha '' e a versão dirigida por Murilo Benício em 2018.
Naquele mesmo ano seria verificado um fenômeno muito curioso nos cinemas brasileiros. Com o imenso sucesso dos filmes dos Trapalhões no cinema, especialmente OS SALTIMBANCOS TRAPALHÕES, qualquer filme com Jerry Lewis que estreasse no Brasil naquela época tinha que ter “trapalhão” no nome. Foi assim com UM TRAPALHÃO MANDANDO BRASA (“Hardly Working” no original) e seria também no ano seguinte com TRAPALHÕES DO FUTURO (“Slapstick of another kind”). Ao longo da década ainda apareceriam outros trapalhões “não-oficiais”
Ainda em 1981 teríamos também FÚRIA DE TITÃS, A GUERRA DO FOGO, A MORTE DO DEMÔNIO/UMA NOITE ALUCINANTE, PIXOTE A LEI DO MAIS FRACO, 007 SOMENTE PARA OS SEUS OLHOS, RECRUTAS DA PESADA, UM TIRO NA NOITE, MENSAGEIRO DO DIABO, GALÁXIA DO TERROR, MULHER NOTA 10, ELES NÃO USAM BLACK TIE, EU TE AMO, SCANNERS, ASA BRANCA: UM SONHO BRASILEIRO, TOQUE DE RECOLHER, OS BANDIDOS DO TEMPO, QUEM NÃO CORRE VOA, PROFISSÃO: LADRÃO, REDS, O DESTINO BATE À SUA PORTA e tantos outros filmes.
Se formos nos guiar pelas tendências e colocar “tags” no cinema do ano de 1981 elas poderiam ser tranquilamente “lobisomem”, “slasher”, “escola”, “Austrália”, “terror”, “Nelson Rodrigues”, “Jamie Lee Curtis”, “sexo”, “estrada”, “Mel Gibson”, “paródia”, “máscara de gás", “Trapalhões”. dentre outras. E se fizéssemos o mesmo exercício com 2021, que tags usaríamos?
Este artigo foi escrito por O Poderoso Chofer e publicado originalmente em Prensa.li.