40 anos de Indiana Jones - Aventura sem fim
Steven Spielberg sempre quis dirigir um filme de James Bond.
Vamos ponderar um pouco o mundo do cinema num universo alternativo, onde o cara que fez Tubarão, E.T., A Lista de Schindler, Jurassic Park e Contatos Imediatos de Terceiro Grau, nunca entrega essas obras. E dirige, por exemplo, 007 contra Goldeneye.
Nada contra os filmes de James Bond, que tem o seu estilo, seu público, sua própria reação à como o mundo mudou (ainda que mantendo seus pontos de vista acorrentados à Guerra Fria). Mas a ideia passou por outros nomes-categoria do cinema (Christopher Nolan também diz que sempre quis dirigir um 007), e o desejo gerou certas ações por parte dos cineastas. Nolan, por exemplo, fez aquelas cenas de ação um tanto genéricas em Inception.
Steven Spielberg mudou a história do cinema. E o fez seguindo o esquema clássico tão de perto que tem gente que ainda teima em dizer que Os Caçadores da Arca Perdida não faz sentido.
"Vamos lá Harrison. Batido, e não mexido." (Imagem - DIvulgação/Lucasfilm - Via IMDB)
Jones. Henry Jones.
Vamos lá: em 1936, o arqueólogo/aventureiro Henry “Indiana” Jones, sacramentado pelo mau humor e pelo carisma infinito de Harrison Ford, passa o tempo visitando cavernas, ruínas e templos abandonados nos lugares mais inóspitos do mundo à procura de relíquias antigas. É um cara durão, inteligente, honesto e bem intencionado.
No meio de desventuras e perigos, ele recebe uma missão do governo estadunidense. Tem esse sujeito estranho na Europa, um tal de Hitler, que está à procura de um dos mais renomados e misteriosos artefatos perdidos de todos os tempos: a Arca da Aliança. Diz o texto sagrado que essa arca é o lugar onde Moisés guardou as Tábuas da Lei, escritas pelas próprias mãos de Deus. A lenda fala que quem tiver posse da Arca jamais perderá uma batalha.
A ideia de Hitler não perder nenhuma batalha preocupa o governo, e lá vai Indiana Jones numa busca ao redor do mundo (mas basicamente só a Ásia Central e o norte da África mesmo). Ele é ajudado por um romance antigo, Marion (Karen Allen), seu colega Brody (Denholm Elliot) e um amigável e gigantesco egípcio, Sallah (John Rhys-Davies).
Então temos perseguições, mistérios desvendados, cavernas repletas de cobras, muitos socos em nazistas, tudo para descobrir onde está a Arca, e como impedir os caras maus de ficar com ela. E bem perto do final do filme, nosso herói… Falha. Os nazistas pegam a Arca, e vão para uma ilha deserta abri-la, no meio de ritual meio estranho, para descobrir se ela tem mesmo poderes divinos.
E é claro que você lembra o que acontece. Indiana Jones e Marion, amarrados, são os únicos sobreviventes de uma experiência sobrenatural assustadora, já que ele lembra que “ninguém pode ver o conteúdo da Arca”. Os nazistas, por sua vez, são massacrados por forças desconhecidas. Aí a Arca então vai para um armazém gigante, e fica lá segura, novamente sumida para o mundo.
A narrativa dos que não foram
A capacidade que Spielberg tem de criar momentos eternos é praticamente invicta. Os Caçadores da Arca Perdida é um daqueles filmes onde cada cena se tornou um ícone da categoria - queira seja a categoria “cinema” ou “aventura” - ao mesmo tempo que conta uma história descomplicada e divertida ao extremo.
Spoiler: isso dá errado. (Imagem - DIvulgação/Lucasfilm - Via IMDB)
Não são só os momentos como “a pistola é mais forte que a espada” ou a célebre “troca de um ídolo de ouro por um saco de areia”. Até coisas pequenas (e completamente úteis ao filme), como a introdução de Marion, são inesquecíveis;
Porém, muita gente gosta de revisitar o clássico para fazer críticas chatas e anacrônicas, como “este filme não tem porque existir”, dado que o protagonista não faz nenhuma diferença na trama. No momento crítico, Jones desiste de destruir a Arca, se rende e “perde o jogo”. “Os vilões vencem”. Só para serem derretidos por fantasmas angelicais.
O argumento é que a ação do protagonista no filme não altera em nada o resultado final. Os nazistas iriam morrer no final, com ou sem a ajuda do arqueólogo. Então, porque a história existe?
Existem as explicações óbvias: é um filme de aventura, inspirado por matinés e pulp do começo do século XX. Tanto as habilidades de Spielberg para traduzir tensão, ação e humor ao Cinema, como as de Ford para carregar qualquer produção nas costas são extraordinárias. Mas talvez seja preciso sair do óbvio, olhar para a trajetória do filme para finalmente entendê-lo como “Cinema de alto nível”. E, ao mesmo tempo, responder aos gurus de internet que nunca sairão da adolescência chata.
McGuffin
Sabe o Hitchcock? Ele criou o termo “McGuffin” para representar “a coisa que o protagonista da história busca”. A palavra em si é uma piada - uma invenção que, na mais livre das traduções, quer dizer “Qualquer Coisa da Silva”. Exatamente porque ele não importa nada para a história em si.
O protagonista precisa de alguma coisa para, simplesmente, sair de onde está. Ele necessita de um ponto focal para sua ação, um objetivo. Atingir o objetivo é completamente secundário, ele só precisa se mover. E essa é a parte importante: o movimento. Porque é indo numa busca que o protagonista vai encontrar obstáculos, gerar conflito, vencer desafios e, no processo, se transformar.
À esquerda, um egípcio gigante. Á direita, um arqueólogo. E no centro, um McGuffin. (Imagem - DIvulgação/Lucasfilm - Via IMDB)
Não que, no papel (ou na tela), Indiana Jones seja um estudo profundo das transformações psicológicas que ocorrem em um ser humano ao, por exemplo, correr de uma pedra gigantesca rolando em sua direção. Mas o filme não é sobre a Arca da Aliança. Uma história nunca é sobre o McGuffin. É sobre o que a busca faz com alguém.
O que a aventura, e as pessoas encontradas pelo caminho, e como antes daquilo tudo acontecer, Jones era um, e depois, é outro.
E é por isso que ainda assistimos Os Caçadores da Arca Perdida, lançado nos cinemas americanos em 14 de junho de 1981. Inventado por George Lucas para seu amigo Spielberg, porque este queria fazer um filme de James Bons. Muita coisa mudou nesse tempo todo. A ponto de Indiana Jones, hoje, ter até uma morada nova na Disney e um quinto filme em produção.
Quem diria que são 40 anos de aventura, 40 anos de cinema puro, correndo atrás de tesouros, lutas, com um chicote na mão e um chapéu na cabeça.
(Imagem da capa - DIvulgação/Lucasfilm - Via IMDB)