A ascensão de Thanos: um eterno diferente
Introdução
Thanos, o conhecido vilão da Marvel – que teve seu destaque recente nos filmes Vingadores: Guerra Infinita (2018) e em Vingadores: Ultimato (2019) – é um personagem das histórias em quadrinhos que surgiu em 1976. Criado pelo artista Jim Starlin com inspiração na figura mitológica de Thanatos e visualmente inspirado em Darkseid, personagem da DC Comics. Comumente descrito como um Titã – o “Titã louco” – é, na verdade, um dos eternos, porém fisicamente diferente devido a uma mutação genética.
Sua história de origem oficial – até o momento – pode ser encontrada na graphic novel A ascensão de Thanos (2014), escrita por Jason Aaron, com arte de Simone Bianchi e Riccardo Pieruccini e cores por Simone Peruzzi e Ive Svorcina, e distribuída pela Panini Books, sob o selo Nova Marvel, no Brasil. A obra em questão tem 116 páginas, capa dura, com o adicional de uma coleção de capas variantes realizadas por diversos artistas e reúne as cinco edições de Thanos Rising (2013), publicadas originalmente nos Estados Unidos. Aqui, o leitor descobre um Titã mais complexo, com mais dúvidas e crises que o apresentado nos filmes com seu plano falho e inconsistente de “equilíbrio”.
Ao longo da obra, o leitor acompanha Thanos desde seu nascimento; passando pelos seus relacionamentos sociais, tanto em ambientes comuns, como a escola, como também em viagens espaciais; suas relações com figuras complexas como uma companheira de infância peculiar; sua busca por se entender até a percepção de seus atos à partir de, majoritariamente, flashbacks. O autor busca adicionar camadas à figura do vilão, aprofundar sua história e a dramaticidade de sua formação. Aviso, desde já, que contém spoiler sobre a obra, uma vez que é uma resenha sobre a mesma.
A estrutura e a narrativa da obra
A primeira parte acompanha a volta de Thanos, sozinho, ao seu local natal, Titã, a maior lua de Saturno, dizendo que “Thanos, o destruidor, voltou para casa”. Revela-se que o personagem visita seu lar uma vez a cada ciclo solar para se lembrar de quem é. Então a narrativa é alterada para o traumatizante momento de seu nascimento, no qual sua mãe tenta matá-lo ao ver a morte em seus olhos, dizendo: “veja esses olhos” Não vê a morte neles? Se não o matarmos agora, todos vamos... todos vamos morrer. Olhe para essa coisa. Isso não é meu filho... Isso é...”, então é sedada pela equipe médica para que o assassinato não ocorra.
Então, adiante, ocorrem cenas rápidas pelas páginas para apresentar sua infância. É mostrado Thanos na escola e em como, apesar de sua aparência diferente dos demais, é aceito para brincar com outras crianças; uma cena em que o pai não demonstra atenção por estar trabalhando é mostrada; Thanos visitando sua mãe que está internada num manicômio; e então sua repulsa ao dissecar um animal para a aula de ciência, sendo instigado, posteriormente, por uma figura que se fará presente em sua vida.
A segunda parte já transporta o leitor para acompanhar um Thanos que busca, através de experimentos com mortes, o conhecimento, principalmente de quem é e por que está ali. A companheira de escola continua ao seu lado lhe dizendo para expandir seu campo de busca, então, como última cena, matando sua mãe.
A terceira parte apresenta um Thanos adulto, o qual mantém relacionamento com diversas figuras na jornada e escolhe por abandonar seus filhos e suas companheiras. Se filia a um grupo de piratas, porém evitava a morte nas missões. Devido a divergências, entra em conflito com o líder do bando, acabando por matá-lo e assumindo sua posição. Em seguida, a figura presente desde sua infância “cobra” que, se quiser o que busca, deve realizar e se mostrar capaz e livre, resultando na morte de seus filhos e ex-companheiras.
A quarta parte mostra o Titã já poderoso e destruidor de mundos, implacável a qualquer um que apareça em seu caminho. Nesta seção é revelado que a figura que o acompanha, com quem se relaciona, apenas ele pode ver, pois esta seria a Morte. Ela lhe diz que o acompanha desde seu nascimento e que é a única coisa que ele já amou. Porém, em meio ao surto da descoberta, Thanos descobre alguém que não podia matar: ele mesmo.
Ainda crente nos seus objetivos e que esses seriam os meios pelos quais conseguiria, na quinta parte, Thanos entrega à Morte as vidas de seu local natal. Num diálogo com seu pai, o Titã é questionado se mantém sua sanidade mental, pois ele teria matado por escolha própria e não pela influência de outrem, estaria usando isso para se esquivar da verdade. Seu pai lhe diz que: “você não ama a Morte, Thanos. Nunca amou. Você só ama a si próprio”.
Por fim, a narrativa retorna ao presente, retoma a ideia de que voltou ao seu planeta para se lembrar quem é. Mostra uma Morte decrepita, em oposição à jovem que antes o acompanhava e que precisava de Thanos. A quinta seção é encerrada explicando que tudo que fez e conquistou, ele fez só.
Diálogo com as críticas à obra
Certas críticas têm sido feitas nos últimos anos sobre o roteirista ter tentado “humanizar” o personagem, talvez justificando sua violência para com os outros como resposta ao que sofreu ao longo da vida e, com isso, tentar gerar empatia para com o personagem. Ou ainda acusam de que a presença da Morte ao seu lado na jornada seria a justificativa para seus atos. O Titã, em suma, deveria ser composto de pura maldade. O que não se sustenta, uma vez que não há motivações éticas e morais para gerar identificação ou empatia com a figura de Thanos. Colocá-lo em um contexto, com uma história e sua relações não corresponde a simpatizar com o mesmo, é, simplesmente, um aprofundamento no personagem, é torná-lo mais complexo.
Outro ponto, a presença da Morte ao seu lado não se torna a influência pelas suas atitudes, sendo reflexo mais do próprio eterno do que a entidade em si, uma vez que ela não o acompanha ao longo de toda sua vida, pois ele chega sozinho para se lembrar de quem é e também vai embora só. Ela não o tem mais como objeto de manipulação e ele não a tem como objetivo de relacionamento.
Tal ideia de que Thanos seria um vilão “plano” no qual o prazer de matar não deveria ter justificativa, somente uma “loucura” e busca por poder seria responsável por seus atos é se manter numa leitura rasa e banal que ignora o diálogo entre a narrativa e as artes.
Em suma, a obra agrega valor ao peso e a história do personagem, tornando-o mais complexo e com acontecimentos que o marcaram. Com restrições de idade pela violência expressada, leitores e fãs de quadrinhos em geral têm a oportunidade de aproveitar a obra de origem de um dos vilões que estão em alta na cultura pop. Destaco a arte realizada ao longo das capas e páginas que cumprem a tarefa de realizar a imersão no ambiente e nos pensamentos do personagem.
Referência bibliográfica
AARON, Jason. A ascensão de Thanos. Barueri, SP: Panini Books, Roteiro Jason Aaron/ arte Simone Bianchi com Riccardo Pieruccini; 2014.
Este artigo foi escrito por Maurício Brugnaro Júnior e publicado originalmente em Prensa.li.