“A cara do governo”: O Enem na disputa política
Uma polêmica fala de Bolsonaro dias antes da prova do Enem põe em voga a disputa política por trás do ingresso nas universidades e na vida científica do país. Por qual motivo o Enem está na mira do governo?
Chegamos aos últimos meses do ano e como de costume, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é realizado por inúmeros jovens que buscam ingressar no Ensino Superior. Em 2021 não foi diferente, cerca de 3 milhões de pessoas realizaram a prova no final de semana; embora pareça um número grande, este é o menor número de inscritos desde 2005, superando até mesmo o auge da pandemia em 2020. As razões destes dados são diversas, mas a questão política e econômica do país é o ponto mais alarmante.
O Enem foi criado em 1998 e adotado pela maior parte das universidades brasileiras - e até internacionais - como método de vestibular. Em conjunto, programas como o SISU, PROUNI e FIES possibilitaram o ingresso de mais de 2 milhões de pessoas nas universidades, segundo censo de 2019.
Desde 2018, quando o governo de Jair Bolsonaro assumiu o país, as provas do Enem têm sido alvo de críticas quanto ao direcionamento das questões abordadas. Para relembrar, podemos citar o dialeto pajubá - tipo de linguagem utilizada pela comunidade travesti - que foi tratado no Enem de 2018 e bastante criticado pelo governo. Temas relacionados à minorias sociais, como a comunidade LGBTQIA+ e movimentos feministas, são as principais reivindicações para a reelaboração das provas sob a acusação de ideologia.
Mas afinal, o que é isso? O termo ideologia, recorrentemente utilizado para designar parcialidade em prol de determinadas causas, tem por definição o seguinte significado: aquilo que seria ideal; ou conjunto de ideias e pensamentos. Sendo assim, todos nós temos ideologia e baseamos nossas ações no que acreditamos ser o mais correto.
Qual é a cara do governo?
A prova, que costuma problematizar temas sociais relevantes, entrou na mira de disputas políticas. Poucos dias antes da prova deste ano, Bolsonaro afirmou que a prova passou por reformulações e começou a ter “a cara do governo”. A fala foi alvo de críticas, já que desde os anos iniciais do governo, temas como o regime civil-militar, deixaram de ser abordados.
Além do mais, a crise sob o exame chega a níveis internos, já que houve a constante mudança dos gestores do INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, órgão responsável pela organização e realização da prova. Servidores do instituto deixaram o órgão nas vésperas da prova sob acusações de assédio e interferência política na elaboração de questões, incluindo a censura de determinados temas.
A imparcialidade defendida pelo governo é algo distante ao perceber que o discurso presente nos debates políticos apenas reafirmam a parcialidade inerente ao ser humano. Somos, todos, seres políticos em nossa existência. Fica para reflexão, o seguinte questionamento: qual é a cara do governo?
Fontes:
Crise no Inep: servidores reúnem e entregam denúncias de assédio e interferência ao TCU e à CGU
Enem 2021: primeiro dia de prova tem 26% de abstenção, diz Inep
Relatórios #06: Ingressos via Enem nos últimos 10 anos
Crise no Inep: servidores reúnem e entregam denúncias de assédio e interferência ao TCU e à CGU
Este artigo foi escrito por Amanda Casado e publicado originalmente em Prensa.li.