A Cilada no Enredo de Matrix
Imagem - divulgação
Matrix, sem sombra de dúvidas, foi um marco na cinematografia mundial. Por mais que existam muitas críticas aos dois filmes que fecharam a trilogia, não se discute sua importância e grandiosidade.
Não se trata de acreditar que realmente estamos em uma realidade onde as máquinas nos controlam dentro de uma simulação virtual, para usar nossa energia, como o filme retrata, mas do quanto nossa vida é realmente “virtualizada” e “automatizada” para que o sistema continue se mantendo intacto. As analogias sempre foram o ponto forte do enredo, que se disfarçavam por trás dos efeitos especiais e cenas de ação incríveis.
Matrix Resurrections superlativa esse conceito e extrapola, a começar com o uso de metalinguagem. Ao colocar o protagonista Neo como alguém dentro da Matrix acreditando que era o criador de um jogo que contava a própria vida dele, ou seja, os três filmes anteriores, Lana Wachowski, busca escrachar o que deve ter acontecido com ela própria e com a irmã.
A necessidade descabida de existir uma continuação de uma obra acabada, que era Matrix. A morte do casal, ao final do terceiro filme, simbolizava justamente o objetivo original daquilo não ser um produto. Não era para ser confortável, não era para ser agradável. Matrix é um golpe em nossas mentes, completamente visceral.
E Lana deixa muito claro, apesar de ser nas entrelinhas, o que aconteceu para que aquele filme existisse. Ela conta isso dentro do próprio filme. Precisa ser feita uma continuação! O que ela e a irmã pretendiam, caso a história tivesse um futuro, era que houvesse muito mais por trás de outros personagens, dos futuros alternativos pós Neo. Mas o público precisava de Keanu Reeves. Não só dele, mas de sua companheira. Um não poderia estar sem o outro. Essa imposição faz a história quase que satirizar a necessidade do casal estar junto, de existir uma história de amor, com final feliz, pelo desejo do público.
Mas se o público escrevesse histórias, não seriam necessários autores que quebram qualquer expectativa e mostram, através do choque, o que realmente era necessário ser visto e ninguém enxergava.
“Mas se é isso que vocês querem, é isso que vocês vão ter!”
O filme inteiro é praticamente essa frase sendo gritada. E ao mesmo tempo, deixando subentendido que o que a Matrix tentava fazer era justamente isso. Todos sendo completamente controlados e levados a querer algo que nem sabem o motivo de quererem. Hipnotizados dentro de suas próprias realidades e cegos demais ou sem interesse mesmo de optar pela pílula vermelha e saírem daquela caixa, viverem a vida real.
No final das contas, usando uma estratégia de auto-depreciação, entregando um tipo de "fanservice" que se assemelha a um atendente de confeitaria que entrega o bolo pedido pelo cliente esfregando-o em sua cara, Matrix consegue impregnar sua mensagem para quem não queria escutar.
É como se estivesse desistindo de mostrar pra sociedade o que já é tão evidente que todos continuam fazendo ainda mais questão de não olhar.
No final das contas, o filme se tornou vítima do próprio sucesso, transformando-se em algo que tentou desde o começo ser exatamente o oposto.
Se você assistiu o filme querendo ver uma continuação de alto nível, como um fã desavisado, você caiu vergonhosamente na cilada que o filme propôs.
Este artigo foi escrito por Eder B. Jr. e publicado originalmente em Prensa.li.