A cultura do estupro e o silêncio das vítimas
A pauta de hoje tratará sobre um assunto delicado, intimista e comum: ESTUPRO!
O estupro é um ato que viola, delimita, envergonha e principalmente impossibilita algumas ações no ser humano. Nas últimas semanas alguns casos foram divulgados pela mídia que envolviam situações de agressões sexuais. Vítimas expostas e novamente agredidas, seja pela mídia ou pelo público que consome o que foi publicado.
Recentemente, a sociedade soube sobre o caso da garota de 11 anos que sofreu um estupro, seu agressor teria apenas 13 anos e de acordo com o que foi divulgado pela mídia, a família tinha consentimento sobre o relacionamento dos dois. A notícia veio à tona quando a menina descobriu que estava gestante de 22 semanas, no entanto, estava sendo proibida de realizar o aborto por conta do tempo gestacional. De acordo com a lei essa permissão só pode ocorrer até a 20ª semana de gestação.
Os comentários encontrados a respeito do caso eram todos a favor da liberação do aborto, afinal, os internautas garantiam que uma criança de 10 anos não teria maturidade e preparação para gestar e cuidar de outra criança. No entanto, a justiça permanecia firme em sua afirmação e proibição da retirada do feto.
No final desta última semana, foi liberado que a criança realizasse o aborto, considerando todos os fatores envolvidos. Porém, logo após a permissão foi questionada pelos mesmos internautas que antes apoiavam tal liberação: “Como pode a justiça permitir que matem uma criança que não tem culpa de nada?”.
Entretanto, vale enfatizar que não se trata apenas de uma permissão da justiça ou até mesmo do ato de abortar, tal fato entra em meios psicológicos e físicos que podem trazer traumas ainda maiores para o futuro da jovem criança. Vale lembrar que de acordo com o artigo 217ª, qualquer relação com menores de 14 anos é considerada estupro de vulnerável.
De acordo com uma pesquisa realizada no ano de 2021, a cada 10 minutos ocorre ao menos 1 estupro no Brasil, tal levantamento foi feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Foram cerca de 56.098 casos de estupros do gênero feminino em todo país. Vale ressaltar que esse número foi contabilizado apenas com os casos que chegaram até 27 unidades da federação da Polícia Civil.
Quanto tempo uma vítima demora para perceber que foi alvo de um estupro?
Devido à exposição que as mulheres acabam tendo após serem vítimas de tal ato, muitas optam por não denunciar e guardam a violência sofrida a sete chaves. Conversamos com uma mulher de 22 anos, vítima de violência sexual que optou por não se identificar. O primeiro questionamento realizado por ela ao iniciarmos a conversa foi: “Quanto tempo uma vítima demora para perceber que o que ela sofreu foi um estupro?”
A mulher contou que sofreu violência sexual aos 16 anos e seu agressor era o ex-namorado, na época estavam juntos há quase um ano e como ela não se sentia confortável para ter relações com o parceiro, evitava determinados contatos. Entretanto, após um incidente, chamou-o para que ele lhe ajudasse, porém, em sua própria residência foi vítima de um ato cruel.
A jovem mencionou que demorou um certo tempo para confirmar o que havia acontecido, pois até então, possuía a ideia de que o estupro só poderia acontecer com pessoas que não possuíam vínculo afetivo. De acordo com o que nos foi revelado, a vítima só percebeu que havia sofrido um abuso sexual meses após o ato, mas optou por não compartilhar tal informação, pois sabia que lhe causaria mais danos.
Seis anos após o fato, ela menciona que poucas pessoas sabem da realidade do que lhe aconteceu e até hoje, os fantasmas do passado lhe perturbam em momentos íntimos. Enfatiza que até hoje algumas situações são constrangedoras ou lhe remetem aos atos cometidos pelo seu agressor na época.
Os traumas causados em decorrência de um ato tão invasivo são marcas para o resto da vida, podem causar distúrbios e problemas psíquicos, caso você conheça ou seja uma vítima de estupro busque ajuda e lembre-se a culpa nunca é da vítima. Busque deixar de lado os comentários ofensivos e as críticas e entenda que por mais difícil que seja, sempre existirão pessoas que apontarão o dedo ao invés de ajudar.
Sendo assim, finalizo com um recado para você que é mulher e que de alguma forma se sentiu violentada. Em até 7 dias é possível a constatação do ocorrido através de exames, mesmo que as evidências estejam fracas. Sendo assim, é fundamental que procure um médico ou até mesmo um departamento policial nas primeiras horas após o estupro.
Caso tenha passado esse prazo solicitado pela lei e não tenha se sentido confortável, procure por uma ajuda psicológica ou até mesmo vá a uma delegacia, pois até 16 anos após o ato, o agressor poderá ser penalizado pelo Estado.
Finalizo esse texto com as mesmas palavras de uma garota de 16 anos, publicado há alguns anos em seu Facebook: “Todas podemos um dia passar por isso. Não, não dói o útero, e sim a alma, por existirem pessoas cruéis sendo impunes! Obrigada ao apoio”. Sendo vítima ou não, é um problema que dói a alma e enquanto houver pessoas sofrendo com tamanha invasão, lutaremos para que tenham voz e presença em uma sociedade controladora e hostil.
Este artigo foi escrito por Rafaella Ranulfo e publicado originalmente em Prensa.li.