A resposta do vira lata
Primeira criança vacinada contra covid-19 no Brasil. (NELSON ALMEIDA/AFP)
O povo brasileiro sempre olhou a si por lentes alheias. Querendo ser francês, julgou-se incivilizado. Tentando ser americano, chamou-se vira-lata. Não faltam, porém, perdidos pela história, exemplos de grandes mobilizações e luta por aqui.
O brasileiro se mobilizou para lutar do lado certo na segunda guerra mundial. Manifestações repudiaram o fascismo e impulsionaram a Força Expedicionária Brasileira. Se mobilizou nas “Diretas Já”, exigindo o direito básico ao voto democrático e universal. Vêm se mobilizando desde 2013, quase ininterruptamente.
Sem entrar nos méritos de por onde descambaram as ruas depois de junho de 2013, é perceptível que há uma massa de pessoas, de várias vertentes políticas, dispostas a se organizar em prol do que acreditam ser o melhor. Isso, por si, derruba qualquer tese de imobilismo.
Mesmo sem grandes mobilizações a olhos vistos é possível perceber sinais às conjunturas. A resposta da população brasileira em torno da vacinação pode ser interpretada como uma delas. Com sabotagem e “campanha oficial” contrária, é nítido o aceno positivo do povo - navegando mares turbulentos - de compreender o momento que se passa. Aderiu quase que voluntariamente – invejando muita civilização - ao uso das vacinas como combate à pandemia.
Deveríamos considerar isso uma vitória. Uma demonstração de vitalidade e força por parte da população, ainda que haja parte expressiva sequestrada pelo conto do vigário. Em todas as pesquisas, inclusive as mais recentes envolvendo vacinação infantil, está patente a adesão.
Mas batalhas não ganham guerras. Em muito por falta de direcionamento ostensivo, temos pelo menos um terço de brasileiros não vacinados, ou não completamente. Isso reflete diretamente na alta das internações, e mortes, oriundas da nova-nova-nova variante.
Temos muito a discutir com esse nosso povo. Nada ficou mais fácil – talvez tenha ficado menos difícil. Ainda há fragmentação política enorme, uma descrença maior ainda no sistema – não sem motivo – e a máquina pública voltada ao negacionismo.
A expectativa, um tanto esperançosa, é de mais uma demonstração de vitalidade em outubro: retirar o assaltante de salário de assessor no voto é obrigação de todo brasileiro, já que o congresso se locupletou. E que não o arrancamos de lá na força.
Temos, nos índices de rejeição ao atual governo, mostras de que grande parte do eleitorado entendeu o que aconteceu nos últimos anos.
Nada estará resolvido ano que vem. Independente dos problemas que virão, e não serão poucos, a eleição, de outro que não o que aí está, é uma vitória do povo brasileiro. Vitória de resposta mais silenciosa, mas não menos poderosa.
Tal como na campanha de vacinação, deixemos claro - à revelia de midiosferas – que a realidade se impõe.
Este artigo foi escrito por Matheus Dias e publicado originalmente em Prensa.li.