A sina de um serial killer: review do final de Dexter: New Blood
Dexter marcou uma geração de aficionados por crime, investigação e serial killers. Quando estreou, em 2006, a série se destacou dentre as excelentes produções do mesmo gênero dos anos 2000: CSI e Criminal Minds.
Charmoso, inteligente e sempre de bom-humor, o Dexter Morgan de Michael C. Hall deixou todo mundo em conflito moral ao se apresentar como um analista forense especialista em sangue da Polícia de Miami. Com um detalhe especial: ele também é um assassino em série de outros assassinos.
A abertura de 'Dexter' é tão sedutora quanto seu personagem principal. Imagem: Reprodução | Showtime
E, mesmo com um final desastroso em 2013, foi a fidelidade dos fãs e a grande insatisfação com o desfecho da série que levou o produtor principal, Clyde Phillips, a criar Dexter: New Blood – a suposta redenção.
“Tonight is the night”
Dexter é um serial killer com um propósito: eliminar os assassinos que, por falha do sistema, conseguiram sair impunes de seus crimes horrendos.
Surfando na mesma onda de ‘Crime e Castigo’, celebrada obra literária do russo Dostoiévski, a série ‘Dexter’ deixa o telespectador em um verdadeiro conflito ao se ver compreendendo e concordando com o personagem com moral duvidosa.
Dexter em seu processo de matança. Imagem: Reprodução | Showtime
Mas o que Raskólnikov não tinha, Dexter Morgan tem em sobra: carisma. Não é à toa que Michael C. Hall ganhou 7 prêmios pela sua atuação na série, incluindo “Melhor Performance de Ator em Série Dramática de Televisão” no Golden Globes de 2006.
Em ‘New Blood’, dez anos após os acontecimentos de ‘Remember the Monsters?’, episódio final da oitava temporada de ‘Dexter’, encontramos o serial killer vivendo como Jim Lindsay na pequena e gélida cidade fictícia de Iron Lake.
Spoiler alert: a partir daqui, vou comentar com spoilers os acontecimentos finais de ‘Dexter: New Blood’.
Os pecados de Dexter Morgan
Depois de uma série de erros, como matar por impulso, sem se preparar da forma meticulosa como ele sempre fez, Dexter é preso pela sua própria namorada, Angela, a chefe de polícia da cidade. E, dessa vez, a lábia dele não o ajuda a escapar.
O problema é que o assassino que conhecemos nos 96 episódios de ‘Dexter’ não é mais o mesmo nesses 10 episódios de ‘New Blood’. Ele erra de forma estúpida, é apressado e despreparado como se ainda fosse aquele adolescente aprendendo a matar.
A partir do episódio 'Runaway', a minissérie ganha fôlego e o ritmo começa a ficar mais intenso, lembrando as primeiras temporadas da série original – a época de ouro de Dexter.
Ainda assim, as cenas por pura conveniência, como sua namorada e chefe da polícia da cidade, Angela (Julia Jones), encontrando Angel Batista (David Zayas) em uma convenção e ele falando sobre Dexter e seu filho Harrison (Jack Alcott), brincam com a paciência dos fãs.
De forma preguiçosa, o roteiro leva Angela a pesquisar sobre Dexter Morgan e descobre que ele e Jim Lindsay são a mesma pessoa. Ao mesmo tempo, ela também chega à conclusão de que Dexter é o assassino ‘Bay Harbor Butcher’ – algo que a polícia de Miami e o FBI não conseguiram desvendar durante todos esses anos.
E a nossa inteligência é subestimada.
Dexter não conseguiu driblar a bola de neve que ele mesmo criou com todos os erros ao longo da temporada. Mas ele pelo menos teve tempo de desmascarar Kurt Cadwell (Clancy Brown) como o assassino de diversas garotas que estavam desaparecidas durante 25 anos.
Assim como fazia o Dexter que conhecemos anos atrás.
Nesse momento, fica claro o quanto ele se perdeu no personagem que foi criado pelo seu pai: de que ele é um assassino “do bem”, que salva o mundo dos verdadeiros bad guys.
Quando ele descreve Kurt como o assassino cruel e sedento por sangue, o próprio se encaixa no mesmo perfil - e nós podemos enxergar isso.
Dexter, assim como qualquer outro serial killer, mata porque gosta. Pelo prazer da caçada. Ele não é o justiceiro que acredita ser em ‘New Blood’. Nós, assim como os roteiristas da série original, nos apaixonamos pelo psicopata e ignoramos os seus crimes.
Dexter saiu impune por muitos anos, mas não podia ser de outra forma. Dexter Morgan tinha que morrer.
Descanse em paz, Dexter.
Dexter precisava desesperadamente que seu filho fosse como ele. Mas no último episódio, 'Sins of the Father', Harrison tem uma epifania ao descobrir que seu pai matou o policial Logan (Alano Miller), que não se encaixava no “código”.
E percebe que ele não mata para salvar ninguém, mas apenas para satisfazer seu Passageiro Sombrio.
Harrison viu sua mãe ser assassinada, foi abandonado pelo pai e perdeu Hannah (Yvonne Strahovski), sua única referência materna. Ele sofria por essas perdas e por ainda estar tentando se encontrar no mundo.
Ele não tinha o mesmo Passageiro Sombrio que o pai, e isso fica claro para todos nós - especialmente para o sofrido Harrison - nos últimos minutos do episódio.
New Blood oscila entre momentos certeiros e falta de sentido total. A morte de Dexter é um exemplo disso. Sim, Dexter precisava morrer. Mas não sem dignidade, como um cachorro raivoso. Ou pelas mãos do próprio filho.
Harrison contradiz tudo que acaba de concluir ao matar o pai a sangue frio. E o menino não precisava de mais um trauma, convenhamos.
A cena, que tinha tanta importância para a conclusão da saga de Dexter, foi apressada e sem lógica. E, nesse caso, nós que não precisávamos de mais um traumático final.
Por fim, vemos o lendário Dexter, que escapou da morte tantas vezes, morrer estirado na neve. Tão indigno que nem mesmo o fantasma de sua própria irmã quis segurar sua mão até seu último respiro.
Vamos ter que nos contentar com o fato de que, pelo menos, seu destino foi selado e ele poderá, finalmente, descansar em paz.
Em sua carta para Harrison, que ouvimos nos últimos segundos do episódio, Dexter diz: “...deixe-me morrer, para que o meu filho possa viver.”.
Vamos deixar.
Adeus, Dexter Morgan.
Onde assistir Dexter: HBO Max, Prime Video e Globoplay.
Onde assistir Dexter: New Blood: Paramount+