A Sra.Dalloway - Virginia Woolf
Muito além do "A Sra. Dalloway disse que ela mesma ia comprar as flores.’’
Todo mundo que já ouviu falar sobre este livro, (inclusive eu) conhece muito bem essa frase. É a frase que parece definir o livro, porém está longe disso. É apenas a fagulha do incêndio que este ato da Mrs. Dalloway provocará em todos os que lerem este livro.
E que incêndio!
Com a fama de ser difícil, de ser chato, de ser incompreensivo e de consequentemente ser largado e deixado para trás. Mas eu acredito que um livro é como um paciente, nós pegamos ele, e lentamente pelo o que ele nos informa vamos entendendo melhor sobre o que se trata. Com este livro é assim. Você pode ouvir tudo o que dizem sobre ele, mas ainda assim não vai te preparar para a história que você vai encontrar. É a sua bagagem de vida, de leitura que vai fazer você ter a sua experiência com o livro.
Qualquer livro que seja, ele vai se abrir de uma forma totalmente diferente da qual ele se abriu para o outro. Para mim, ele revelou o seu mistério de uma maneira, para você ele vai revelar de outra forma. Devemos também tentar entender o que estamos lendo, tentar entender o que o autor quer que nós vejamos. Embarcar em sua história, no caso desse, em seu fluxo de consciência.
Quantos pensamentos temos por dia? Quantos pensamentos temos por minuto? Caminhando pelas ruas, indo trabalhar, indo estudar, no trânsito diário. Pensamos no presente, no passado e até mesmo no futuro. No que pode ser, já aconteceu ou está acontecendo? Fazemos um comentário, dizemos que temos que fazer isso ou aquilo, e assim é diariamente nosso fluxo de consciência.
Assim é o que acontece em A Sra. Dalloway. Temos os pensamentos de um grupo de personagens além daquela que foi comprar flores, ela mesma. Mas que de uma forma todos estão entrelaçados em suas teias, à Clarissa Dalloway.
E é uma teia gigante. A grande aranha é o tempo? Que a cada badalada do Big Ben ou dos outros relógios vão se fechando sobre eles? Da hora que se vai passando? Mostrando-lhes que tudo o que eles não têm a cada pensamento é tempo. Vão sendo enterrados a cada Badalada. O seu tempo está se esgotando a cada momento em que você vive, então viva da sua melhor maneira, antes que o tempo se acabe.
O livro é muito maior de um ato de ir comprar flores, ele trata de uma gama de assuntos; trata sobre solidão, sobre angústias, dores, receios, medos, arrependimentos? O que poderia ter sido se eu tivesse pegado tal caminho? Como a minha vida seria? Teremos que aprender a viver com as nossas escolhas.
Fala sobre depressão, loucura, sendo talvez, quando alguém realmente nesta trama está com os olhos abertos e, vê completamente às coisas que os outros não entendem. Septimus ao passar pela experiência do horror da guerra. Clarissa no final, ao contemplar a morte em sua festa, a morte desse homem com quem ela nunca trocou uma palavra, conseguiu ficar feliz por ele, ao entender que ele está a salvo das chatices do cotidiano. Clarissa quando observa a senhora, que vive tranquilamente do lado de sua casa e, se da conta de que aquilo, sim, é a vida?
Todos estão num labirinto de suas mentes, de suas almas, procurando a saída. Cada um muito solitário a seu próprio modo. Cada um se agarrando a algo, ‘’ sua pequena felicidade.’’ Cada um tentando da sua melhor maneira viver, alguns se agarram às suas dores, medos, frustrações, etc.
Há alguém ainda capaz de escapar e de se livrar dessa enorme teia? Dessa aranha invisível que arma suas teias invisíveis por toda a vida? O primeiro passo é se dar conta, alguém se deu conta dessa teia enorme? Se sim, galope, galope, para bem longe. Onde os seus sonhos estarão longe de tudo.
Não temos tempo! Nem para chorar pelo que foi, pelo que podia ter sido. Largue suas armas, chega de alimentar o ódio, a raiva, suas frustrações. Perdoe, é um antídoto para o veneno que você mesmo tomou querendo matar o outro, ele está matando você.
O tempo anda só para frente, então não perca ele olhando para trás, só vai ser mais doloroso. Pois, ele vai te empurrar para frente, você querendo ou não.
Ao longo de um único dia parece que conhecemos aqueles personagens por anos. E por este belo recurso, o fluxo de consciência. Através dele podemos saber do passado e presente de cada personagem e assim ter vivido com eles, mais do que um simples dia.
Eu falei, falei, só um pouco da experiência que tive com este livro e, ainda não disse nada. Esse é daquela categoria de livros que iremos pensar nele, fabular e filosofar sobre, por séculos. Não é o que estamos fazendo agora? E o que pessoas antes de nós, fizeram?
Há esse fluxo de pensamento, que nos pega na primeira frase que abre o livro. Vai depender de cada um se deixar levar por ele, em suas ondas. E esperar que se atraque em algum porto, em algum lugar a que ele te levar no final da leitura. Cada um vai ter o seu porto à sua própria maneira.
Eu estou no meu porto, doido para embarcar novamente nesta onda de Virginia Woolf.
Obs; E a frase de abertura também poder ser vista como um ato de você mesmo tomar o controle da sua vida. Eu penso que ela quer dizer isso. Ela mesma foi. Ela não deixou para que ninguém fosse. Tudo bem, todos estavam ocupados, fazendo algo, você pode me dizer. É verdade, porém se ela mesma mandasse que alguém fosse buscar, alguém iria. Ela tomou esse ato, para si mesma. Eu mesma irei. E ela foi. E que bom que ela foi, pois, senão, de outra forma não estaríamos aqui, comentando sobre A Sra. Dalloway.
Kaique Britto
Este artigo foi escrito por Kaique Britto e publicado originalmente em Prensa.li.