AI x FK = SE, a fórmula da verdade
Em tempos de abundância de instrumentos de comunicação, esta – a comunicação – deveria ela própria ser instrumento de melhoria nas relações sociais. As opiniões deveriam ter base em fontes minimamente confiáveis, fontes construídas por mentes conscientes da importância do papel da internet no dia a dia das sociedades. AIxFK=SE, a fórmula da verdade, pode ajudar muito.
Como esse comportamento anda longe da realidade, qualquer iniciativa que ajude a nortear aquelas mentes é válida; qualquer estratégia de que se lance mão leva a algum resultado minimamente razoável que seja.
Uma sociedade imune a notícias falsas talvez seja utopia, talvez seja estado impossível. Entretanto, é possível se chegar nível mínimo de espalhamento de mentiras via internet ou via realidade. Uma série infindável de fatores contribui – ou impede – para se chegar a algo parecido:
--> Estratégia acadêmica
--> Condições econômicas capazes de apoiar essa estratégia
--> Apoio à leitura constante
--> Conscientização de formandos em Comunicação Social - em especial, Jornalismo
--> Campanhas efetivas contra fake news
--> Política mais humana e consciente
A verdade sempre prevace. [Imagem: Flickr]
Entre alguns outros. O problema é que tais fatores são interdependentes em muitas situações. Apoio à leitura constante depende de campanhas midiáticas fortes; estratégia acadêmica depende de política mais humana; conscientização de formandos depende de estratégia acadêmica e assim por diante.
Mas há uma luz no fim do túnel traduzida na fórmula criada para este artigo – ou seja, é fictícia. E provavelmente é a luz das estrelas de Mário Quintana, conforme se vê mais abaixo.
AIxFK=SE
A fórmula da verdade, onde AI = Inteligência Artificial; FK = Fake News; SE=Sociedade Evoluída, ainda é utopia, já que representa o impossível atual. Entretanto, talvez o escritor irlandês Oscar Wilde tenha oferecido um caminho interessante:
O progresso não é senão a realização das utopias.
E o brasileiro Mário Quintana pensava no impossível a partir da magia de seu olhar sobre a realidade:
Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!
Fake News e Inteligência Artificial
Pensando como Wilde e agindo como Quintana, uma equipe de pesquisadores brasileiros desenvolveu um aplicativo capaz de identificar notícias falsas. O que a maioria das mentes humanas não consegue fazer – ou não quer fazê-lo – a tecnologia faz.
Trata-se de um detector de notícias falsas, objeto do trabalho publicado em janeiro último por um dos grupos de Mestrado Profissional em Matemática, Estatística e Computação Aplicadas à Indústria – Mecai do Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria - CeMEAI da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - Fapesp. É curso de pós-graduação stricto sensu oferecido pelo ICMC e um dos cursos da área de educação corporativa.
A ideia central é responder à seguinte questão: “Quantas vezes você já se perguntou se aquela notícia era mesmo verdadeira?” – que, aliás, é a pergunta do início da apresentação do projeto. Leitoras e leitores da Prensa, sendo claramente cidadãos responsáveis, certamente já se perguntaram centenas e centenas de vezes.
O Detector e sua face conceitual
Luiz Giordani é um dos responsáveis pelo projeto e coordenador do grupo de pesquisa. Lembra que a diversidade de visão, percepção e opinião dos componentes da equipe foi importante para o desenho da estrutura do aplicativo. Afinal, permitiu que todo o processo se mostrasse bastante abrangente, já que o escopo da ideia do detector de mentiras é justamente a abrangência de interpretação de conceitos. Disse Giordani:
“Também a diversidade de opiniões no grupo de trabalho foi muito produtiva. O grupo era composto tanto por alunos da disciplina quanto os alunos de doutorado e pós-doutorado e cada um sempre trazia uma opinião e uma visão diferente sobre as nossas abordagens”.
O mecanismo do projeto se baseia em interação efetiva entre análise estatística e aprendizado de máquina (ou machine learning). Ou seja, é composto por aplicativos desenvolvidos com capacidade de observar dados, produzir padrões entre eles e, assim, “aprender” e aplicar o que aprendeu em outros conjuntos de dados.
A intervenção do conhecimento humano em si é mínima em todo o processo. O conceito do Detector de Fake News trabalha com captura do sentido subjetivo da mensagem analisada. Nesse cenário, uma abrangência enorme de análise de vocábulos entra em ação.
De certa maneira, essa capacidade de máquinas contraria a noção de que apenas a mente analítica humana é capaz de identificar intenções subjetivas. Nesse caso, que não se confunda subjetividade com subminaridade intencional. E, ao que parece, esse ainda é grande problema para o aplicativo.
A funcionalidade do Detector de Fake News
Quando explicado em palavras, o sistema parece simples demais. E lógico. Afinal, basta o interessado copiar o texto da notícia duvidosa e colar no corpo do aplicativo. E pode ser qualquer pessoa interessada, pois o Detector de Fake News está disponível neste link.
Feito isso, o sistema observa determinados detalhes do trecho copiado:
--> Estilo de redação
--> Frequência de aplicação das classes gramaticais
--> Palavras mais repetidas
--> Características de escrita
--> Equívocos gramaticais dos mais simples aos mais bizarros
--> Quantidade de sites em que o foco da mensagem foi replicado
E uma série de outros tópicos. A partir de então, o sistema identifica o padrão comunicacional daquele trecho e o compara com os de outros registrados em seu bando de dados. Isso inclui notícias verdadeiras e falsas, de forma que o aplicativo consiga comparar tais padrões efetivamente.
Os resultados têm sido promissores. Num universo geral de análise, o índice de acerto chegou a 96%. Nada mal para uma máquina de análise de intenções às ezes obscuras.
O início da AIxFK=SE
Tudo começou, obviamente, com o avanço do fluxo de notícias falsas nas mídias atuais - em especial, no campo da política. Uma vez identificado esse avanço e as implicações que têm causado tantos empecilhos, a equipe debruçou-se em discussão interna para pré-desenhar o sistema.
Para tanto, os pesquisadores e idealizadores criaram um banco de dados com mais de 100 mil notícias dos cinco anos anteriores. Classificaram cada uma delas segundo probabilidade de falseabilidade e de veracidade. Assim, nasceu verdadeiro dossiê de informações diversas.
Com base nesse banco, o Detector de Fake News compara os trechos para o qual o cidadão solicita análise. Então, todo o trabalho interno do aplicativo gera um gráfico com 04 barras horizontais coloridas de rosa e verde da esquerda para a direita. Quanto menos área verde nas barras, mais probabilidade de o trecho analisado representar inverdade.
Já a última barra inferior do aplicativo apresenta um percentual médio tanto das áreas rosa quanto das verdes.
Hipótese problema
Francisco Louzada Neto é um dos diretores do órgão, também coordenador do projeto. Vê uma espécie de guerra sem fim a ser enfrentada pelo Detector de Fake News. Com isso, pretende se precaver de eventuais estratégias de produtores de notícias falsas.
Ou seja, incentivadores desse tipo de atividade podem usar o próprio sistema para criar textos não identificáveis pelo aplicativo. Dessa maneira, tanto quanto no caso de qualquer outro tipo de crime, a segurança deve estar sempre um passo à frente.
Assim, Louzada Neto e sua equipe pretendem usar o período eleitoral como instrumento de aprendizagem para seu sistema. Em tempos de campanhas eleitorais – e nesta próxima especificamente –, a produção de notícias inverídicas se propaga. Com isso, o Detector de Fake News pode se alimentar de mais padrões de identificação.
Portanto, parafraseando Quintana, por mais inatingível que seja a identificação de fake news, toda sociedade deve querê-la. Afinal, as estrelas da hombridade e da evolução social podem iluminar todo o caminho da busca.
Este artigo foi escrito por Serg Smigg e publicado originalmente em Prensa.li.