A Antropologia da Música Afro-brasileira e Afro-Americana
A repressão brutal dos escravocratas do Sul dos EUA destruiu quase que completamente a cultura africana dos negros estadunidenses. Com isso, não quero dizer, obviamente, que por aqui não fomos muito reprimidos, apenas afirmo que por lá o projeto genocida teve muito mais sucesso. Para quem não sabe, genocídio implica não apenas na eliminação física de um povo, mas também na destruição de sua cultura e tradições.
Na condição de quase total aniquilamento da sua cultura africana, o negro americano não pôde preservar seus instrumentos de percussão como nós por aqui, sem isso só lhe sobrou o instrumento mais antigo do mundo: a voz. As reuniões e ritos religiosos foram absolutamente reprimidos, de forma que quase não existe religião afro-americana, só conheço o chamado voodoo da Luisiana, praticado por pouquíssimos negros, nada comparado ao alcance do nosso candomblé e umbanda.
Devido a esta repressão, a manifestação musical só poderia se dar de forma individual e por meio do canto, dando origem ao chamado spiritual, um canto de lamento negro com forte influência religiosa cristã que dará origem ao blues.
Podem perceber que a música negra americana valoriza muito mais o alcance vocal do que a nossa, contudo, isso não se deu por questão estética, mas porque a música deles foi forjada basicamente na voz por lhes ser negado a incorporação de instrumentos africanos de percussão, e, inevitavelmente, se concentraram mais no desenvolvimento vocal. Claro que ainda assim o ritmo, o suingue, a percussão e a dança ainda estão ali, basta ouvirmos James Brown.
Entretanto, não tão percussivo quanto nosso samba, maracatu, baião, tambor de mina, tambor de crioula etc. Até porque nossa concepção africana de fazer música dá maior ênfase ao ritmo, diferente da europeia que privilegia a harmonia, aqui me refiro à música erudita europeia. A música negra americana incorporou mais elementos e requintes da música europeia, como o atonalismo e o virtuosismo da música erudita incorporados ao jazz bebop.
Talvez os dois dos nossos maiores violonistas, João Gilberto e Jorge Ben, dão um grande exemplo do quanto nossa música é percussiva, pois até o violão deles tem esse caráter rítmico.
Referências Bibliográficas:
COSTA E SILVA, Alberto da. A África explicada aos meus filhos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013.
Imbatível ao Extremo: Assim é Jorge Ben Jor! Rio de Janeiro: Rádio Batuta, ims.com.br/radiobatuta, 15 de novembro de 2021.
Este artigo foi escrito por Célio Roberto e publicado originalmente em Prensa.li.