Batem à porta (2023)
M. Night Shayamalan continua procurando seu caminho de volta pra casa, na trilha do gênero que o consagrou. Em Batem À Porta (2023) ele conserta erros, redescobre influências e um bom tamanho para o seu cinema.
Por mais de duas décadas, o cinema é sinônimo de plot twists, reviravoltas mirabolantes e estórias tensas e inventivas. A trajetória errática do diretor indi-estadunidense começou a ganhar tração com o fenômeno O Sexto Sentido (1999), seu terceiro filme, e o alçou ao patamar de grandes ícones do cinema moderno em uma hora onde David Fincher e Paul Thomas Anderson firmavam suas bandeiras no terreno de Hollywood. Seus projetos tiveram grande êxito durante um bom pedaço do começo do novo milênio, até se desgastar em produções de gosto duvidoso como Avatar - O Último Mestre do Ar (2010), After Earth (2013) e The Happening (2008).
The Happening inclusive é, em minha opinião, um dos filmes que mais demonstra esse desgaste. Em Batem À Porta, alguns temas constantes da obra de Shayamalan retornam com uma força poderosa: o desenvolvimento da história do ponto de vista exclusivamente dos personagens; o questionamento metafísico do papel humano em um destino possivelmente traçado por uma força maior; a relação dos personagens definindo suas decisões diante dos desafios que se apresentam.
Além disso, um diretor ainda mais maduro de 53 anos redescobre suas influências que ecoaram tão bem no começo de sua carreira: um remix sampleado de longos planos de Hitchcock e Spielberg, composições de Kubrick e De Palma e, depois de 18 produções com altos e baixos, uma boa dose de autorreferência muito bem aplicada.
Esse é talvez o filme mais modesto desde o retorno do diretor à boa forma (que eu identifico no formidável A Visita (2015). E, tanto em temática como em execução, parece muito como um pedido de desculpa por The Happening que chega um tanto atrasado. A escalação de Dave Bautista em um papel chave do filme é uma das melhores escolhas do diretor, bem como a jovem Kristen Cui, atriz estreante que junto ao experiente ex-wrestler carrega o filme nas costas. A sensação claustrofóbica e contida do filme é um bom callback à Sinais (2002), um dos filmes de M Night que envelheceu em forma. Também consegui sentir ares de Festim Diabólico, definitivamente um dos meus preferidos de Hitchcock, justamente por conseguir resolver uma história inteira dentro de praticamente um cômoda e uma tomada.
Todo esse esforço entrega um filme sem virtuose, mas longe de ser mediano. A história é interessante, os personagens cativantes e o ritmo é adequado. O que me deixa um pouco frustrado com o diretor é o hábito de não permitir ao espectador conclusões próprias, e neste filme isso infelizmente acontece justamente no clímax, o que por consequência pode ser bem anti-climático. De qualquer maneira, se eu posso recomendar: assista na maior tela possível. Batem À Porta é uma produção boa o suficiente para encontrar uma desculpa para ir ao cinema neste começo de ano.
Rating: 🎬🎬🎬🎬
Este artigo foi escrito por Marcel Trindade e publicado originalmente em Prensa.li.