BeReal – Uma rede social mais realista
Imagem: Freepik
Lançada em 2020, inicialmente na França, a rede social em ascensão, BeReal, tem a proposta der ser o que praticamente nenhuma rede social atual é: realista.
Mais popular no segmento estudantil em faculdades e universidades – assim como foi o início do gigante Facebook – o BeReal não é uma rede social para se manter viciado e ativo nas 24 horas do dia, não aceita vídeos até o momento, não é uma rede que permite filtros e distorções nas fotos e, assim, não promove falsos padrões de beleza e nem desejos artificiais de consumo.
Recebendo uma notificação em momentos distintos a cada dia, a pessoa tem apenas 2 minutos após o aviso para tirar e postar uma foto com a câmera frontal e a traseira do seu celular, refletindo a espontaneidade e a autenticidade de seu momento mostrando quem ela realmente é e o que faz parte da sua vida cotidiana para trocar com os outros.
A visualização do que os amigos e outras pessoas da comunidade também estão postando só é possível a partir do momento em que você mesmo inicia sua postagem.
Toda essa dinâmica dissolve o grande modelo usado pelas demais big techs de social media ao promover interações verdadeiramente reais e não agendadas pelos usuários. Na BeReal não há feeds ou stories em ambientes totalmente montados para parecerem perfeitos e invejáveis. Há simplesmente o que você está fazendo em um momento aleatório de sua vida apenas quando o aplicativo avisa a você que é hora de fotografá-lo, naquele curto período de 2 minutos.
De acordo com levantamentos obtidos pelo The Wall Street Journal em 2021, a holding do Facebook (agora, Meta) tinha ciência de dados que indicavam que 32% das garotas usuárias da rede social Instagram, afirmavam que, quando se sentiam mal com seus corpos, o Instagram as fazia se sentirem piores devido ao falso padrão de beleza compartilhado na rede.
Assim como também mostrou o documentário lançado na Netflix, O Dilema das Redes, e várias discussões psicológicas e científicas que se sucederam, o modelo das redes sociais que se instala atualmente é comprovadamente prejudicial em muitos aspectos para bilhões de indivíduos, não excluindo os jovens disso.
Depressão, estresse, transtornos de ansiedade, sobrecarga de tempo nas telas, a chamada síndrome da “rolagem infinita” nos feeds, influências e até manipulações em decisões de consumo, política, saúde, estética, alimentação, desinformação e diversos outros fatores negativos são originados ou compartilhados em massa entre as pessoas por meio das redes sociais de hoje.
Uma rede social que se demonstra propor interações mais esporádicas, menos controladoras e mais autênticas entre seus usuários – como a BeReal – pode ser uma das novidades tecnológicas no ramo de social media que mais precisamos, principalmente no caráter psicológico.
Contudo, não é novidade uma nova rede social se propondo a ser diferente das demais. As próprias gigantes que existem hoje como Facebook, Instagram e TikTok começaram justamente com esse ideal, e são elas hoje que dominam e causam muitos prejuízos.
Não podemos esquecer que muitas redes sociais já vieram e já foram. Dentre elas, podemos citar as antigas gigantes como o MySpace, Google+, o famoso Orkut, o ClubHouse que virou febre e logo decaiu bastante, e a Ello – uma rede social sem publicidade muito interessante, mas que não cresce de maneira significativa em número de usuários.
Isso só para não citar as dezenas de outras que podem ter se originado e começado a deslanchar em seus respectivos nichos e países, mas que logo se estabilizaram e decaíram.
A rede social BeReal, como qualquer outra novidade e até “inovação”, pode influenciar e receber diversas influências positivas, da mesma forma como corre grandes riscos de se tornar “só mais uma” do mercado repleto de concorrentes, se estabelecer em apenas um nicho específico ou pior, ser uma moda passageira que irá desaparecer de vez.
Por mais que tenha um objetivo relevante até então...
• E se nos momentos em que for liberada a chance de a pessoa postar, ela esteja em uma situação que não possa compartilhar?
• E se as pessoas se cansarem de ver imagens comuns e cotidianas dos outros ou se cansarem de postar suas próprias imagens cotidianas?
• Como fica o uso dessa rede social se não houver materiais, interações ou usuários suficientes nos momentos em que as pessoas a acessarão?
• E se o que for cotidiano para muitas pessoas em determinadas condições, na verdade, for algo invejável para várias outras? Não caímos no mesmo problema de comparações e influências sociais?
• E se essa tendência provocar o efeito contrário em várias comunidades e faça com que os usuários se forcem a mudar seus cotidianos naturais para estarem sempre em condições artificiais invejáveis para quando chegar o momento de tirar as fotos e postar na rede social?
• E se essa tendência realmente vem para ficar, mas por todas as questões financeiras que a empresa necessita para existir, ela crie recursos, propagandas ou artifícios que corrompam a ideia original – assim como ocorre com as outras redes?
Ainda que haja centenas de perguntas – e até de algumas respostas já adquiridas – tanto no caráter negativo quanto positivo e até no duvidoso, mesmo que essa nova rede alcance o sucesso, as concorrentes que já estão estabelecidas, no momento, possuem bilhões de dólares e um grande armamento de ferramentas, parcerias e algoritmos usados diariamente em grandes massas para influenciar as atitudes e interesses das pessoas.
Como toda mudança e novidade no mercado, ela pode não ser aceita e morrer por terra, assim como pode sim se difundir entre toda a sociedade. Essa novidade também pode se difundir, mas logo ser substituída por outra mudança futura por um novo ou mesmo um antigo concorrente, como os que já existem hoje, e várias outras possibilidades.
Uma nova rede social independente – qualquer que seja – realmente teria alguma chance de concorrer com as gigantes da tecnologia que possuem tanta experiência e poder em manipular o mercado e seus usuários? É claro que teria!
Afinal, essas gigantes da tecnologia de hoje também passaram por essa mesma experiência anteriormente. Agora, se essa chance realmente se concretizará em alguma vitória efetiva no mercado, quem dirá é o tempo, os números, nossa análise constante e a aderência (ou não) das pessoas por essa nova rede social.
Este artigo foi escrito por Gabriel Tessarini e publicado originalmente em Prensa.li.