Brasil: a triste realidade da insegurança alimentar no celeiro do mundo
Segundo a FAO, a fome atinge atualmente quase 1 bilhão de pessoas, principalmente na África Subsaariana, América Latina, além da Ásia. Esse triste número sofreu um grande expansão a partir da pandemia de COVID-19. O presente artigo tem como objetivo discutir como a fome assola as populações mais vulneráveis e, na verdade, é uma consequência dos problemas sociais no Brasil e no mundo.
A inanição, como um problema social, é definida quando uma pessoa não tem acesso, por falta de recursos alimentares, a uma refeição por dia. Todos possuem o direito a três refeições diárias ou à quantidade de consumo calórico suficiente para a reprodução social do indivíduo.
A insegurança alimentar também pode ser diagnosticada a partir da falta de nutrientes suficientes para o amplo desenvolvimento das pessoas.
É muito importante lembrar que, até a década de 1970, a carestia era um problema estrutural presente no mundo capitalista e uma alimentação qualificada era um grande privilégio atingido por poucos. Porém, as mudanças tecnológicas introduzidas pela Revolução Verde a partir da década de 1960, e a introdução de sementes geneticamente modificadas, pacote químico e mecanização e qualificação da mão de obra revolucionam o método produtivo e elevam a produtividade a níveis superiores a toda história da humanidade.
A elevação da produção agropecuária proporcionou um salto quantitativo nunca antes visto na história contemporânea e a produção alimentar atinge a marca de ser suficiente para alimentar 10 bilhões de pessoas. Ou seja, a produção agropecuária no mundo é capaz de alimentar toda a população mundial. Hoje, segundo as estimativas, o mundo conta com 7,8 bilhões de pessoas.
O caso brasileiro é um triste exemplo entre o desequilíbrio entre a produção alimentar e o acesso aos alimentos por parte da população, pois nós somos o terceiro¹ maior produtor de alimentos do mundo e, segundo a FAO, até 2050 o país irá atender 40% da demanda mundial de alimentos.
A nossa produção de alimentos é capaz de sustentar 1 bilhão de pessoas no mundo. Porém, de acordo com a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar², 33 milhões de pessoas estão na situação mais grave da insegurança alimentar no nosso país.
É importante destacar que a agropecuária brasileira promoveu uma mudança estrutural na sua produção ao privilegiar os produtos voltados para o mercado externo, ou seja, produção de commodities ancorado na alta lucratividade, produtividade e impacto ambiental.
Como exemplo, observamos o avanço das áreas plantadas de milho e soja, porém a queda de 54% da área de produção de feijão, um alimento básico e necessário na mesa da população.
É urgente mudar a nossa estrutura econômica e entender a elevada insegurança alimentar que atinge o país e o mundo como uma consequência das mudanças estruturais, sociais e econômicas provocadas no sistema produtivo e na desigualdade social existente nos países e entre países que permite uma concentração de maior consumo calórico nos países mais desenvolvidos.
Ademais, as causas estruturais que potencializam a fome no país são: a redução de políticas públicas voltadas para a alimentação da população mais pobre, a falta de subsídios que consigam diminuir o valor do produto no mercado interno, a expansão do desemprego e do subemprego, ocupações que provocam a diminuição da renda dos trabalhadores, a falta de investimento em programas da agricultura familiar, setor responsável pela alimentação de 2/3 dos lares no Brasil, a concentração fundiária, além do elevado desperdício de alimentos.
Ainda é importante destacar que a elevação dos preços dos alimentos no Brasil, com taxas muitos maiores do que a inflação oficial em muitos gêneros alimentícios de primeira necessidade, faz com que milhões de pessoas busquem produtos ultraprocessados, diminuindo a inanição, porém com produtos industrializados de péssima qualidade com um alto valor calórico e baixo valor de nutrientes necessários ao bom desenvolvimento do organismo.
Como exemplos de produtos alimentícios ultraprocessados que tiveram a sua comercialização em expansão no país nos últimos meses temos: macarrão instantâneo, soro de leite, salsicha, achocolatados, além dos processados de frango. O consumo desses alimentos pode levar à subnutrição e, nas fases iniciais da infância e adolescência, o consumo exagerado desses alimentos está associado ao desenvolvimento cognitivo mais lento, e também a problemas cardiovasculares³.
Portanto, o Brasil vai bater todos os recordes de produção agropecuária, mas a fome e a subnutrição serão marcas sociais presentes no nosso país, pois a concentração de renda permite um desequilíbrio no consumo de alimentos. A fome é consequência e é necessário entender suas causas e propor mudanças no que provoca o problema, como uma ação na saúde das pessoas.
¹ - https://profills.com/artigos/maiores-produtores-de-alimento-do-mundo/. Acesso em 30 de agos. de 2022.
² - https://idec.org.br/noticia/em-2022-33-milhoes-de-brasileiros-passam-fome-no-brasil#:~:text=No%20final%20de%202020%2C%20o,estavam%20em%20situa%C3%A7%C3%A3o%20de%20fome. Acesso em 30 de agos. de 2022.
³ - https://www.bbc.com/portuguese/geral-48451985. Acesso em 30 de agos. de 2022.
Este artigo foi escrito por Magno FERREIRA e publicado originalmente em Prensa.li.