Completamente perdido
Estou perdido. Amor da minha vida, onde estamos? O que somos? Onde estão as suas migalhas? Perdi a linha. Envelheci. Engatinho. Não sei andar. Não distingo o certo do errado. Não... Penso. Sonho com o gozo eterno, o descanso celestial. Encaro o mundo do meu canto. Bebo, esperando por seu sussurro. Vejo suas irmãs me importunando. Vejo seus irmãos flertando.
Por que nos perdemos? Era puro fingimento? Amava suas histórias, mas já não me lembro. Eram os deuses astronautas? Passageiros perdidos? Lendas indignas? Até São Pedro? Para o meu desespero. Eram só prateleiras vazias. Pó ao furacão. Miragem para quem não sabe. Não somos mais crianças. Percebe? Somos machos e putas. Somos líderes e ditadores. Somos coisas e bichos.
E quem não é nada disso? E eu? O que faço? Para onde vou? Que teta tenho que chupar para chegar aonde devo? Perdoe o desespero. Nada mais faz diferença. Educação, pudor, honra. Esqueça! O negócio é içar a vela e sair navegando. Estamos na era dos descobrimentos. Descubra. Conheça. Experimente. Sinta os seus pelos... Divirta-se! Quem chegar por último é mulher do padre.
Jesus Cristo! O que vou fazer? Que serei ao amanhecer? Que serei à largada? Estou entre santos. Não tenho tempo. E só tenho um conselho. Estou perdido. Sim, meu amor. Não tenho escolha. O penhasco acena. Quanta obscenidade! Por que não lhe entendo? Quero silêncio. Não aguento. Os outros mastigam... Mastigam. Bando de travecos! Desgraçados! Insetos! Por que me afeto? Se me explicassem seu sentido... Por que não falam? Por que seus intérpretes são tão esquisitos? Eles me lembram tanto você.
Será que nunca prestei atenção? Aonde você ia quando eu dormia? Como você é bonita... Por que me protege? Por que me trai? Deixe! Não quero saber. O que vou fazer sem você? Escute. Deite comigo. Sorria. Fique comigo. Não me deixe. Me queira. Me ame. Me cale. Se não adiantar, volte os ponteiros do relógio e me lembre de nosso passado. Ele está lá, no espaço, em algum lugar. Não desista. Me beije... Você me conhece. Creia. Não sou o estranho de que falam. Ou sou? O tempo não é gentil. Os pelos cresceram.
A voz mudou. Os interesses mudaram. Acontece... Não percebemos. Fica difícil acordar com a realidade. Fica difícil dormir com a fantasia. Desmontam seu castelo. Roubam suas fantasias. Deixam-lhe nu. Distribuem máscaras e petelecos na bunda. E, assim, vivemos de segunda a sexta. Nada mal! Pode-se dizer. Mas se eu quisesse mais... Acordaria em Roma e anoiteceria em Paris.
Dormiria com Gilda e Rita. Buscaria silêncio no oceano. Teria a mulher que quisesse, onde quisesse e quando quisesse. Contaria nossos feitos com paixão e afinco. Conversaria sem medo. E quando, finalmente, meu legado conduzisse sua última homenagem a minha pessoa, dir-se-ia que fui feliz, apesar do mundo. Mas seria o bastante? Não creio. Afinal, qual é o limite para a ambição humana? Deus? Em relação às terrenas, nenhum. Isso dificulta a minha vida. São muitos caminhos para um só sujeito.
Como escolher? Qual será a resposta certa? Não sei o que fazer. Pode ver? Ainda está aí? Meu professor disse que sou prolixo, meu pai disse o mesmo. Devo encarar como algo sério? Será que um dia serei curado? Não sei se isso é importante. Não quero mudar. Não quero deixar de pensar como penso. Não quero ter tantas dificuldades, mas não quero mudar... É difícil? Sim, mas o que posso fazer?
Somos a soma de nossas escolhas. Não posso desmoronar à chegada do vento. Por que deveria? Não fiz nada de errado, nem devo. Por que tudo precisa ser tão difícil? Tenho certeza de que há uma solução simples e elegante para todo problema. Por que não tentamos mais isso? Por que não chegamos a um acordo? Somos escravos da mediocridade? Somos tolos? Rejeito tal hipótese. Que apele! Que vá ao inferno! Que se afunde em areia movediça! Mas, se não for fazer nada, faça o favor de explicar o que está acontecendo.
Por que as estrelas brilham? Por que a terra gira? Por que mentimos? Por que matamos? Por que amamos? Por que casamos? Por que pensamos? Existe uma razão. Creio piamente. E, se não houver, minha amada, me abrace e me beije, pois tenho medo. Estou perdido na escuridão. Estou deitado no frio mármore do Vaticano. Rezo por paciência, peço ajuda. Mas não consigo. Pode me socorrer? Pode me amar? Não consigo viver sozinho. Não consigo viver sem você, querida.
Este artigo foi escrito por E.J. e publicado originalmente em Prensa.li.