Consciência negra: mentes em risco
Se você já assistiu o filme Corra, deve ter percebido o terror nos olhos do personagem preso em um corpo dominado pela mente de um homem branco. De início parece uma loucura sem fim, sem pé nem cabeça. Mas pensando na crítica por trás da obra, a relação com o racismo é direta.
A conexão com o filme é só uma forma de tornar menos abstrato o que pode acontecer na mente de uma pessoa preta em uma sociedade que carrega a herança do racismo. O problema é histórico: no Brasil, mais da metade da população se identifica como negra e junto com a identificação vem uma mala repleta de traumas.
De acordo com a visão da psicologia, a constante exposição à situações de racismo, principalmente durante a infância, resulta em um estado frequente de alerta. Problemas como estresse, ansiedade e depressão são alguns dos resultados na vida de uma pessoa preta. Existem dados concretos sobre o assunto: segundo o Ministério da Saúde em 2018, é 45% maior a probabilidade de homens adultos cometerem suicídio quando em relação aos brancos.
As situações de racismo são, por definição, violentas. Não são somente casos extremos como o de George Floyd - ou muitos outros casos de violência policial contra a população negra -, mas também o desprezo, o preconceito e a perpetuação de estereótipos. Quer um exemplo? Você já deve ter ouvido expressões, como de que negros são mais fortes e resistentes, mas sabe de onde surgiu essa afirmação? Sim, da escravidão. Carregar o estigma da escravidão na pele, no corpo e na mente é doloroso.
Atualmente, a conscientização sobre a importância do tratamento psicológico põe em xeque essa reflexão e destaca a perpetuação dos esteriótipos na mente dos próprios negro. A desumanização sofrida há aproximadamente 500 anos faz com que a busca por cuidado seja posto de lado.
Um caso concreto disso é que homens negros são minoria nos consultórios psicológicos, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística): representavam nesse período 14,8% em relação às mulheres e 19% em relação aos brancos, sendo maior apenas que o número de pardos - que representam 17%.
Diante dessas afirmações, é necessário à sociedade reestruturar as construções arcaicas baseadas na dor e no sangue de escravizados. Como diria Elza Soares, a carne mais barata do mercado é a carne negra. E a carne simbólica, não escapa nem um pedaço.
Fontes:
Precisamos falar sobre a saúde mental da população negra
Racismo faz mal à saúde mental, mas falar sobre ele é forma de prevenção
Impacto do racismo na saúde mental dos negros é tema de debate
A Psicologia Preta e a saúde mental dos negros no Brasil
Homens ainda veem terapia como tabu: "Ouvi que devia beber em vez de fazer"
Este artigo foi escrito por Amanda Casado e publicado originalmente em Prensa.li.