Depressão: de filho para pai
Há três dias um rio de lágrimas se apossou do meu rosto. Não que eu deságue a ponto de alimentar as turbinas de Itaipu, porém pingo como uma goteira cuja origem ninguém conhece. A alma mais parece as barragens sob responsabilidade da Vale, segurando com uma força ancestral a energia que cedo ou tarde irá vazar. Estou falando de depressão.
A tristeza tem fim, felicidade também e assim se repete o ciclo. Deprimido, a gente nem percebe. Bom, ruim, feliz, triste, tudo passa sem que nem se perceba. A vida continua, mas parece estar parada, presa a uma espécie de areia movediça que nem precisa do nosso movimento para nos afundar. Estou falando de indiferenciação.
Quando estou doente, sim, depressão é doença, receber um prêmio e um tapa produzem quase o mesmo efeito na minha cabeça — “ah! tá bom”. O que é ruim faz parte da vida, o que é bom nem é mesmo tão legal assim. Lentamente vou deixando as alegrias de lado e simplesmente deixo meu corpo cair sobre o sofá. Não falo de relaxamento, ócio ou preguiça, o papo aqui é de paralisia.
Obviamente, já estive do outro lado, sendo o amigo que tenta estimular a quem se ama, porém não entende a razão da incapacidade de agir. Já julguei e por alguns segundos pensei que fosse fraqueza. Não me condeno por isso, pois realmente tal fato versa mais sobre mim que acerca do comportamento alheio. A depressão também me torna crítico.
Tal como nada é bom o suficiente e que todos os contratempos são previsíveis. Ninguém ao meu redor age conforme os elevados padrões comportamentais estabelecidos por minha versão adoentada. Todos estão errando e é uma vergonha que sigam agindo assim. Será que só eu observo as coisas em perspectiva? Sou realmente tão superior assim? Talvez esteja só me defendendo.
Do que me defendo? Preciso mesmo responder? O mundo não me recebeu de braços abertos, olha que eu nem sou parte de minorias, também não sofro nenhum tipo de perseguição específica. Ainda assim, a realidade me fere. Tem gente demais no mundo, alguns ocupam tanto espaço e recebem tanta atenção que para mim fica sempre faltando. Mas que se dane o mundo, hoje é o amor que me leva ao chão e às lágrimas.
Tornei-me adulto de uma vez por todas. Após casar, separar, enlouquecer, curar, viajar, sofrer, voltar, trabalhar, curtir e amar, tive que assumir responsabilidades cujo peso parecem exceder minha capacidade de carga. Não botei uma criança no mundo, nem adotei um cachorro. Apenas vi minha mãe doente e o meu pai fraco. Desde então, sou eu quem cuido, prevejo e protejo. Não adiantou fugir, a vida cobrou a conta e eu não tinha dinheiro em caixa para pagar.
Este artigo foi escrito por Felipe Loureiro e publicado originalmente em Prensa.li.