Desconfiar também é uma forma de cuidar
Assisti à palestra do Paul Romer, prêmio Nobel de Economia, durante o Febraban Tech desse ano e refleti muito sobre confiança. O resultado você lê na Prensa Tech de hoje!
A gente fala muito sobre confiança como se fosse um sim automático — uma entrega plena que acontece sem interrogações. Como se confiar fosse sinônimo de se abrir por inteiro, sem filtro, sem ressalva, sem rede.
Mas precisamos rever essa narrativa. Muitas vezes o que é chamado de confiança total pode ser só uma forma elegante de negligência: com os próprios limites e sinais, com o que a realidade já mostrou.
Na palestra que mais gostei de acompanhar durante o Febraban Tech deste ano, Paul Romer, prêmio Nobel de Economia, chamou atenção para algo que transcende a tecnologia: o risco de perdermos os sistemas que nos ajudam a buscar a verdade. Ciência, jornalismo e o judiciário só funcionam porque há pessoas dentro deles comprometidas com fatos — e porque, nesses ambientes, a reputação ainda importa.
Romer nos lembra que, para que a confiança exista, é fundamental saber quem está falando, de onde vem a informação e qual compromisso há por trás dela. Isso vale para máquinas, para sistemas… e também para as relações humanas.
Em tempos de IA generativa, deepfakes e desinformação programada, mais do que nunca, a confiança precisa de lastro. Como o especialista destacou, a confiabilidade exige saber quem está falando, de onde vem a informação, qual o compromisso por trás dela.
No fundo, ele está falando de algo que aparece em muitos dos nossos dilemas pessoais e profissionais: como saber em quem, ou em que, confiar? A resposta, talvez, passe menos por certezas e mais por critérios (e por se dispor a recalibrar esses critérios sempre que for necessário).
Desconfiar, nesse sentido, não é um ato de dureza. É um exercício de cuidado, por reconhecer que nem todo laço precisa ser apertado de imediato, que vínculos se constroem com tempo, presença e coerência. E que não é desconfiança destrutiva aquela que nos protege da repetição de ciclos que já machucaram antes.
É como (supostamente) disse Mario Quintana: “O amor é isso. Não prende, não aperta, não sufoca. Porque quando vira nó, já deixou de ser laço”. A frase fala do amor, mas se aplica também à confiança.
A confiança verdadeira não vem da ausência de riscos, mas da construção de um espaço onde seja possível estar sem precisar se defender o tempo inteiro. Ela não exige pressa, exige constância.
Talvez você esteja num momento em que está reavaliando em quem ou no que tem confiado demais — ou de menos. E talvez essa seja uma boa hora para ajustar senhas (reais ou metafóricas), rever acessos e criar camadas mais consistentes de proteção entre o que é essencial e o que apenas parece urgente.
Afinal, na vida, assim como na segurança digital, confiança não se força: se conquista.
Essa foi a Prensa People de hoje! Até semana que vem.