É de planta e muito gostosa
Praticar o vegetarianismo e o veganismo já é um fenômeno global há várias décadas, se intensificando cada vez mais, agregando, anualmente, milhares e milhares de adeptos ao consumo exclusivo – ou quase – de comidas e produtos de origem não animal no Brasil e no mundo.
Estima-se que 30 milhões de brasileiros, 14% da população, se declaram vegetarianos, segundo pesquisa do Ibope Inteligência conduzida em 2018, com um crescimento de 75% em relação a 2012. Não há pesquisa oficial no Brasil sobre o número atual de veganos. Fato é que ambas as práticas de consumo, inclusive o flexitarianismo ou semivegetarianismo, prática menos habitual de comer carne, são tendências bastante comuns e crescentes nos dias atuais com previsão real de maior ascensão em curto prazo de tempo.
Essa transformação de consumo tem levado, há um bom tempo, indústrias, marcas produtoras e estabelecimentos comerciais de alimentação a repensarem seus portfólios e cardápios, incluindo produtos e pratos desse segmento para atingirem cada vez mais consumidores que preferem optar por comidas de origem vegetal, como as carnes à base de plantas – alimento de sucesso que tem movimentado o mercado vegetariano no país. Dentre uma extensa lista de opções para os vegetarianos substituírem a proteína animal, as carnes vegetais são destaque na dieta desse relevante público.
Plantas saborosas e lucrativas
Portanto, como está esse mercado atualmente? “O mercado desta nova geração de produtos à base de plantas ainda está numa fase incipiente, mas com muitas empresas investindo pesado em tecnologias e parcerias para atingir novos patamares. Prova disso é que os grandes frigoríficos são os grandes investidores nesse segmento de domínio global. Se o mercado não fosse promissor, eles simplesmente esperariam essa moda passar.
"Não é o caso”, introduz Franz Carioba, sócio-diretor da Galunion Consultoria, empresa especializada no setor de alimentação, atuando como uma catalisadora de conhecimento, networking e inovação alimentar. Franz explica que os produtos à base de plantas, conhecidos como plant-based, já estão presentes em diversas categorias de produtos, desde aqueles que “imitam” o sabor e a textura dos produtos de proteína animal, assim como produtos que são vegetais na sua essência.
“Em outras palavras, os vegetais estão ocupando cada vez mais espaço no centro do prato e que, portanto, têm mais protagonismo na composição das refeições e snacks.” Já há muitos anos era comum encontrar produtos de carne vegetal no formato de almôndegas, hambúrgueres e embutidos como salsichas, mas, basicamente, atendiam a um público específico, de veganos e vegetarianos.
Mais recentemente, vemos uma evolução muito grande, com melhoras significativas no formato, textura e sabor dos produtos à base de plantas de forma que esta evolução foi capaz de atingir públicos mais diversos, como os flexitarianos. “Além de hambúrgueres, almôndegas e carne moída relacionadas à carne bovina, já vemos essas opções para frango e porco e também no formato de carne em tiras.
Em viagens recentes aos Estados Unidos, vimos também alternativas de peixes, camarões, entre outros”, complementa o sócio-diretor. Sobre o investimento nesse mercado, Franz comenta que as hamburguerias, tanto aquelas consideradas premium quanto as grandes redes locais e globais, já têm opções à base de plantas em seus cardápios e, por estarem presentes nas praças de alimentação e nas plataformas de delivery, trazem bastante visibilidade a esses produtos.
“De forma gradual, esses produtos estarão sendo incorporados nos cardápios, seja na forma de carne, como em outros ingredientes como queijos, margarinas, molhos, maioneses, cremes culinários para preparo de pratos salgados como estrogonofe ou sobremesas, como mousses, coberturas de bolos e chantilly. Em outras palavras, produtos à base de plantas vão além da carne, inclusive.”
Um grupo só de plantas
Por ser um sucesso constante na alimentação vegetariana, algumas empresas no Brasil já oferecem produtos e refeições com carnes vegetais que são destaque a seguir. O Grupo Planta é uma delas. Criada com o propósito de acessibilizar alimentos à base de plantas com ingredientes de alto padrão de qualidade e rastreabilidade, desde 2018 trabalha com um vasto portfólio produzido dentro das próprias cozinhas com análogos de carnes e queijos vegetais exclusivos, produzidos em fábricas 100% vegetais e, consequentemente, promovendo baixo impacto ambiental.
Entre as marcas do grupo, como Plant Burger e Açougue By Green Kitchen, é oferecida uma grande variedade de tipos de carnes vegetais que preenchem o seu portfólio verde, tais como, Feijoada, Strogonoff de “frango”, Polpetone, Pancetta, Kafta, Arroz Caldoso com linguiça de ervas, Hambúrgueres de “carne”, “frango” e “cordeiro” e muito mais.
Fabio Zukerman, CEO do Grupo Planta, diz que “nosso diferencial, além de qualidade, é desenvolver as receitas tradicionais na versão vegana sem abrir mão do sabor. No que chamamos de Açougue de Plantas, nossos produtos são embalados a vácuo e congelados.” A média de preço varia de R$ 25 a R$ 90 nesse açougue e os pratos prontos de R$ 30 a R$ 60. O mais interessante é que, em média, 80% dos clientes das marcas do grupo não são veganos.
“Este é o nosso melhor momento, quando observamos nossos clientes se surpreendendo com o avanço dos alimentos à base de plantas desenvolvidos pela Green Kitchen (uma das marcas do grupo), como também os novos clientes que se permitem a experimentar, retornando e tornando-se clientes da casa”, orgulha-se o CEO. Fabio salienta que em menos de uma década, se a população mundial não melhorar seus hábitos de consumo, o ser humano entrará numa espiral inversa no que tange a sustentabilidade. “Hoje, no Brasil, 59% da população está em situação de insegurança alimentar, como mostra fontes oficiais. As carnes vegetais são uma alternativa, nutritiva, saborosa e sustentável.”
O CEO ainda diz que mercado está superaquecido. “Grandes corporações mundiais já aderiam e estão se adaptando rapidamente para suprir esse nicho de mercado. Basta ir ao supermercado mais próximo. Por isso, somos democráticos na nossa produção. Todas e todos são bem-vindos.”
Peixe à base de planta?!
Ricardo Bottura, sócio-proprietário do Let's Poke, rede de restaurantes havaianos especializada em poke, da cidade de São Paulo, inaugurada em 2017, com cinco unidades próprias espalhadas pela capital paulistana, conta que no começo deste ano fecharam uma parceria exclusiva com a foodtech brasileira plant-based The New Butchers, empresa especializada em proteínas vegetais.
“Trouxemos para o cardápio da rede o The New Fish, salmão vegetal à base de ervilha, com textura e sabor de peixe, fonte de ômega 3 vindo de algas, livre de soja, glúten, adição de açúcar, transgênicos e colesterol, produzido pela foodtech.” O Let's Poke é o primeiro restaurante havaiano do Brasil a possuir em seu cardápio um poke preparado com salmão plant-based.
A nova proteína foi incluída de duas maneiras no cardápio da rede: 1ª) Opção do ingrediente dentro do produto ""Monte seu Poke"" (clientes montam o poke escolhendo todos os itens). Preço de R$ 44,80 no salão; 2ª) Poke vegano já preparado com a nova proteína e chamado de New Fish. Sua composição de ingredientes é: shari (arroz japonês temperado), salmão vegetal, sunomono, manga, tofu temperado, shimeji grelhado, cenoura e crisp de couve. Preço de R$ 41,90 no salão.
O sócio-proprietário comenta que seus clientes vegetarianos e veganos, há algum tempo, pediam alternativas de proteínas vegetais além do shimeji grelhado. “Quando firmamos a parceria com a The New Butchers e trouxemos a novidade, a receptividade do lançamento foi ótima, porque atendemos diretamente um desejo de parte do nosso público consumidor.
Nos primeiros quatro meses do produto, tivemos um crescimento de 383% na venda dos pokes vegetarianos e veganos, volume puxado pelo salmão vegetal New Fish.” Parte da clientela carnívora dos restaurantes da rede, de acordo com Ricardo, é curiosa e está disposta a provar uma nova opção de proteína saudável e saborosa.
“E isso de fato tem acontecido. Com base em tudo isso, queremos fazer parte desse mercado que será cada vez maior. Continuaremos buscando soluções que atendam a necessidade de uma parcela importante dos nossos clientes.”
Carnes vegetais e tecnologia
E por falar em foodtech brasileira plant-based, a The New Butchers, fundada em setembro de 2019, que atende o Let's Poke e também está presente nas principais lojas varejistas do Brasil, oferecendo um saboroso portfólio de carnes à base de plantas, conta com uma fábrica de 2000m² em São Paulo, e com uma capacidade de produção de 80 toneladas por mês, para desenvolver produtos ligados à inovação e idênticos às carnes de origem animal, sem abrir mão da saudabilidade e da reconexão com os alimentos.
Bruno Fonseca, CEO e fundador da marca, conta que a companhia produz hoje “salmão”, bolinho de “bacalhau”, filé de “frango” e hambúrgueres à base de proteína de ervilha, todos 100% vegano e sem utilização de soja, gordura hidrogenada de palma, sem glúten, sem açúcar, transgênicos ou antibióticos.
“A marca prioriza o sabor e em produzir um alimento saudável, por isso, em todos seus produtos, a The New Butchers utiliza gordura natural do coco. As carnes feitas à base de planta da fábrica também possuem nutrientes, ferro e vitaminas.” A The New Butchers abrange públicos bem diversos, vegetarianos, veganos, mas o público maior, 83%, são os flexitarianos: os já citados carnívoros curiosos e que buscam reduzir o consumo de proteína animal.
Como marca produtora de carnes vegetais, Bruno tem notado cada vez mais uma abertura nesse mercado, com grandes players participando da revolução. “Vemos isso como algo positivo, com mais espaços para esse nicho, abertura em grandes redes de varejo e também com o trabalho de ‘educar’ o consumidor para o novo, para uma nova forma de consumir proteína à base de planta.”
O CEO da foodtech ainda diz que dados mostram que para fazer um hambúrguer bovino utiliza-se quantidade de água equivalente ao suficiente na produção de 40 hambúrgueres de ervilha. “Ou seja, para a produção de 1 kg de ervilha, são utilizados 358 litros de água, para a carne bovina, utiliza-se cerca de 15.561 litros.”
Pionerismo brasileiro vegetal
A Superbom é uma indústria de alimentos nacional, fundada em 1925 na cidade de São Paulo, ofertando um portfólio atual que já ultrapassa 120 produtos diferentes distribuídos tanto no mercado nacional quanto internacional. Pioneira brasileira na fabricação de alimentos substitutos da carne, em 1970 a Superbom lançava seus três primeiros produtos da linha: salsicha, bife e carne moída, todos de origem vegetal, à base de glúten e soja, sem nenhum tipo de conservante.
Cinco décadas depois, a Superbom possui mais de 20 opções diferentes de substitutos da carne, para todo e qualquer momento do dia, desde hambúrguer, mini empanados, steak, salsicha, linguiça e até itens como coxinha, almôndega ou frango em pedaços, todos igualmente de origem vegetal.
“Hoje nós possuímos duas linhas de produtos substitutos da carne animal: Linha de Produtos Enlatados, que não necessita de refrigeração, possui dois anos de validade sem nenhum tipo de conservante e a Linha de Congelados, mais moderna e com grande semelhança de aroma, textura e sabor dos produtos de origem animal, mas sendo 100% vegetal, com 12 meses de validade e com o implemento de vitaminas A, B9, B12 e os minerais ferro e zinco”, conta David Oliveira, diretor de Marketing da Superbom.
Vale salientar ainda que a Superbom se destaca não apenas pelo pioneirismo de produtos vegetais, mas também pelo seu rigor e padrão de qualidade, possuindo hoje a certificação internacional IFS Global Markets e na última fase da certificação FSSC 22000. David diz que a receptividade dos clientes que consomem as carnes vegetais da marca é muito boa.
“Há muita procura por produtos mais saudáveis nos últimos anos, especialmente nos últimos tempos em meio à pandemia que vivemos. No entanto, com uma experiência de mais de 50 anos, podemos afirmar com solidez que a população tem buscado alternativas à carne animal há décadas.
Em 1970, a Superbom só possuía três produtos na linha produtora, já em 2008, a linha chegava a 13 produtos diferentes. Isso há 13 anos, onde não se falava nada sobre veganismo ou produtos plant-based.”
Food Trends Report 2021 e o movimento plant-based
Além de atender às demandas de um público cada vez mais aberto a inovações e ligado as tendências globais, a adoção de produtos à base de plantas vai se tornar cada vez mais estratégico do ponto de abastecimento. A população mundial continua em crescimento, demandando por alimentos cada vez mais saudáveis e o planeta tem recursos limitados.
O ciclo de produção de vegetais como soja, ervilha, arroz, grão de bico entre outros é muito mais curto e demanda menos recursos que a produção animal e, consequentemente, a um custo menor. Em um curto espaço de tempo, veremos a balança pender mais para o lado de proteínas vegetais, desde que mais palatáveis, saudáveis, sustentáveis e acessíveis.
E sobre este tema tão importante, neste ano, a Galunion lançou o Food Trends Report 2021. No levantamento, a empresa de consultoria pôde verificar que, também alavancado pela tecnologia, o movimento plant-based ganhou força: 33% dos consumidores afirmam que as novidades apresentadas por produtos plant-based são uma tendência.
O destaque nesta área é que muitas propostas buscam uma composição que traga o sabor, aroma e textura característicos da proteína animal. Além do já conhecido hambúrguer – já presente no varejo e redes de fast food – tem chegado ao mercado opções como patties de hambúrguer, almôndegas, linguiças e, em breve, até aves, peixes e ovos.
Este artigo foi escrito por Bernard Lopes e publicado originalmente em Prensa.li.