Gemini - O Planeta Sombrio (2022)
Eu tenho um pouco de vergonha em dizer que, talvez em toda minha vida, eu só tenha visto no máximo uns… 5… talvez 8 filmes russos. Eu tenho mais vergonha ainda de dizer que esse é um deles. Assistir esse filme foi como mastigar uma maçã com um casca levemente polida, mas quase vazia, farelenta e sem gosto em sua carne. Mas calma que eu explico.
Um país que liderou a corrida espacial deveria, no mínimo, ter mais imaginação ao falar sobre isso. Ao se dobrar aos maneirismos hollywoodianos, Gemini - O Planeta Sombrio peca, acima de tudo, por não confiar em si mesmo. Chegando atrasado pelo menos 40 anos em um gênero virado e revirado pela indústria cinematográfica americana, o filme se comporta como um exercício de futilidade, ao tentar reinventar a roda usando os piores argumentos pra isso.
O roteiro é uma boneca russa de clichês, com ecos de Interstellar, Prometheus, Alien, Predador e qualquer outro grande título da ficção científica de 1975 pra cá. A criatura xenomorfa invasora, a corrida contra o tempo para encontrar uma nova Terra, o paradoxo temporal que permite consertar as coisas… tudo isso costurado com a destreza de um babuíno com parkinson.
O valor de produção é ok. Para um episódio de Dr. Who entre 2005 e 2011. Não que isso seja ruim, mas preferia que tivessem investido em ter uma história para contar, como em Dr. Who. A fotografia é afetada, com luzes neon que tentam o tempo inteiro nos convencer que estamos em outro planeta, mas fazem com que nos sintamos em um quarto de gamer. Os efeitos especiais são nem um pouco especiais. A blocagem de cena é confusa e prejudica a geografia pobre que o filme já tinha pra começar. O elenco é caricato e apático, entregando o nível de canastrice esperado de um roteiro tão fraco. Um dos piores recursos são os flashbacks explicativos, com cenas de um romance que não se presta a convencer ninguém e backgrounds de personagens que ninguém se importa.
Uma das coisas que estranhei do primeiro segundo até o fim foi o estranho ADR que ocorre com os atores. Eu senti a impressão de que estava vendo um filme russo dublado em inglês. Depois de averiguar que era exatamente isso que estava acontecendo, fiquei muito encafifado com o fato de que o movimento labial dos atores era mesmo em inglês… mas levemente “off”. Suspeito que o filme tenha usado alguma tecnologia de deep fake para reinserir a boca dos atores no idioma da dublagem do país de distribuição. Vi um artigo sobre isso alguns meses atrás, e me pareceu ser o caso. Se for, talvez esse seja o único motivo pra assistir este filme.
Eu tenho grandes ressalvas em analisar um filme sem levantar nenhum ponto positivo. Eu acredito no cinema como uma arte democrática e entendo o esforço e coordenação que se coloca na produção de um filme. Gemini não vale esse esforço. A vida é muito curta pra isso.
Marcel Trindade não é crítico de cinema, mas gosta de falar sobre. Você pode ver o trabalho dele como ilustrador em www.marceltrindade.com
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Este artigo foi escrito por Marcel Trindade e publicado originalmente em Prensa.li.