Homem-Aranha e o recurso do falso vazamento de informações
Você consegue se lembrar da primeira vez que viu um truque de mágica? Confesso que não tive o prazer de ver pessoalmente quando criança, mas achava incrível pela televisão. Eu sabia que aquilo não era verdade, que existia uma ilusão. Mas o que mais atraia era justamente o fato daquele mentiroso, astuto, conseguir enganar a todos, fazendo algo que parecia ser impossível, acontecer.
O destaque não estava no conteúdo, que podia ser um baralho pequeno ou uma gigante guilhotina. O foco também não estava no personagem, o mágico, normalmente vestido de preto e chamando menos atenção do que suas assistentes, que atraíam os olhareres do público, justamente para favorecer o verdadeiro atrativo do negócio: a mentira.
A publicidade moderna, amparada pelas suas assistentes de palco, as redes sociais, começou a se apropriar dessa "mágica". O mistério, o suspense, o desconhecimento do público a respeito dos métodos e a farsa que parecia ser muito mais envolvente e atraente que a realidade.
Quantas fotos vazadas das novas versões dos iPhones da Apple? Ou de camisetas de times de futebol?
Com tantos milhões envolvidos nos projetos, chega a parecer fantasioso acreditar que vazamentos de imagens "confidenciais" seja real e não planejado. E como numa atração de um mágico, nem existe a preocupação de se negar, de fazer o expectador acreditar realmente que aquilo seja verdadeiro. Podemos até saber que é mentira, que é um truque, mas o simples fato de sua existência já é motivo para atrair os olhares.
E a discussão sobre ser ou não real, gera uma expectativa ainda maior sobre o produto. Comentários, desejo de comprovação ou de refutação. O cenário está criado! E o que se ganhou com o desenvolvimento é muito maior do que o resultado final.
Homem-Aranha: Sem Volta Pra Casa, o próximo filme da Marvel a ser lançado em 17 de dezembro de 2021 e, de longe, o principal nome desse começo de nova fase do seu Universo Cinematográfico, pode ser considerado o exemplo de maior sucesso do uso desse truque. Os fãs estão absolutamente enlouquecidos diante da possibilidade do encontro entre os três protagonistas de todos os filmes do herói. Fomentando essa polêmica, mas negando veementemente que isso irá acontecer, os envolvidos deixam pistas e fazem os comentários nas logarítimicas redes sociais explodirem.
O produto "Homem-Aranha" tem seu mérito? Evidentemente que sim. A obra de arte do eterno Stan Lee é icônica, mas em qualidade de desenvolvimento cinematográfico e história do personagem, ficaria devendo para o Super-Homem da concorrente DC/Warner?
O que está em jogo nos atuais formatos de negócio da atualidade, seja num simples produto de baixo custo do dia a dia ou até mesmo no convencimento do voto democrático na política, é a publicidade viral muito mais enraizada no nosso fascínio imaginário em relação a algo do que na realidade sobre alguma coisa.
Nesse modelo, muitas vezes as empresas não se preocupam em desenvolver o melhor produto possível, tendo em vista que na sua divulgação ele pode acabar sendo considerado "bom demais pra ser verdade". Preocupam-se mais em criar recursos que dão uma pequena amostra de algo que pode ser verdade ou não. Muitas vezes até testam se devem realmente fazer algo ou não, fingindo que isso já está em produção, criando um simples rumor.
Na sociedade que valoriza e desvaloriza milhões em ações, de acordo com postagens no Twitter de alguém poderoso e sequer conhece os cientistas por trás de grandes inovações tecnológicas que talvez nem sejam popularizadas por falta de investimento, a mágica se faz dominante, a mentirosa e charlatã que nos faz acreditar no que não é real ou no que simplesmente poderia ser, mas a gente mente pra esconder o jogo e valorizar mais, pois a dúvida vende mais que a comprovação.
Este artigo foi escrito por Eder B. Jr. e publicado originalmente em Prensa.li.