Inteligência Artificial | Computação Cognitiva
O que define uma Inteligência Complexa?
Conhecer, utilizando sensores, e compreender, utilizando padrões de decisão.
Estes são alguns dos requisitos da inteligência. Porém, aprender é algo muito mais complexo, até mesmo para seres biológicos, como já vimos anteriormente.
Antes de nos aprofundarmos na Inteligência Complexa, precisamos entender o que é o Aprendizado, a fascinante capacidade da inteligência.
Vamos tentar entender melhor os conceitos de conhecer e compreender, observando o comportamento dos girassóis. Todos nós aprendemos que o girassol sempre segue o sol, certo?
Estas plantas possuem sensores para Conhecer e localizar a origem da luz do sol.
Os girassóis executam algoritmos para Compreender esta informação e mudam a posição da flor na direção da origem da luz.
Esta poderia ser uma explicação razoável para este fenômeno. Contudo, não é assim que funciona. Por uma simples razão: depois de adultas estas plantas interrompem este movimento.
Durante a fase de crescimento, os girassóis tem um crescimento desigual de suas células. Durante o dia, apenas um lado do talo cresce, enquanto o outro lado do caule, cresce somente à noite.
É este crescimento desordenado, que faz parte do ciclo de vida dessas plantas, o responsável por este fenômeno.
É chamado de Ritmo Circadiano, uma espécie de relógio interno, um mecanismo pelo qual muitos organismos se regulam entre o dia e a noite, assim como nós.
Todas as plantas são rítmicas. Elas possuem muitos ritmos diários, responsáveis pela abertura das flores, emissão de fragrâncias, germinação, fotossíntese, etc.
O crescimento desequilibrado do caule do girassol é apenas mais um nessa longa lista de ritmos circadianos.
A parte do caule virada para o lado nascente (leste) cresce durante o dia, enquanto a parte voltada para o poente (oeste) fica estacionada. Este crescimento do lado oriental, faz com que a flor seja erguida do oriente para o ocidente, fazendo com que pareça estar acompanhando o movimento do sol.
À noite, ocorre o contrário. A parte do caule virada para o lado poente (oeste) começa a crescer, fazendo a flor amanhecer virada novamente para o nascente (leste).
Evidente, há um algoritmo responsável pelo ciclo circadiano alternar o crescimento durante o dia e durante a noite.
Contudo, em algum momento, este movimento cessa e o girassol permanece virado para o nascente até o fim da sua vida.
Quando os girassóis param de girar ?
Quando adultos. Quando param de crescer, deixam de girar.
O giro é uma competição. Plantas maiores recebem mais luz, mais calor e, portanto, tornam-se mais atrativas aos polinizadores, garantindo uma reprodução mais abrangente.
Crescei e multiplicai-vos. Esta recomendação não foi apenas uma frase, ela foi garantida com a implantação deste algoritmo.
Voltemos ao Aprendizado.
Cientistas da universidade da Califórnia tentaram modificar o comportamento dos girassóis. Plantados em vasos, eles os submeteram a certas condições, visando forçá-los a mudar sua conduta. Alguns, foram sistematicamente virados para o poente (oeste) na parte da manhã.
Resultado: as abelhas deixaram de se interessar por aquelas flores. Contudo, quando a mesmas flores foram aquecidas artificialmente, passaram a atrair os polinizadores.
Então, os cientistas foram mais longe. Imobilizaram os talos, impossibilitando os giros e simularam ciclos diários de 30 horas, no lugar de 24.
Resultado: os girassóis perderam 10% de biomassa e as folhas se reduziram em tamanho e quantidade.
O estudo não teve o propósito de incutir às plantas um novo aprendizado. O objetivo foi entender a importância do heliotropismo, o giro, para a fotossíntese e para o fomento da produção de auxinas, os hormônios de crescimento das plantas.
Contudo, não se pode deixar de observar esse estudo como uma tentativa de ensinar um novo comportamento aos girassóis. Plantas não aprendem, simplesmente porque não possuem Inteligência Complexa, apenas Inteligência Estruturada.
Seres dotados de Inteligência Complexa possuem a função da Cognição.
cog·ni·ção
(latim cognitio, -onis, ação de conhecer)
substantivo feminino
1- Faculdade de adquirir conhecimento;
2- Percepção, conhecimento.
A definição científica de Cognição é: faculdade que alguns Seres Biológicos possuem, utilizando a percepção, a memória e o raciocínio, para construir conhecimento.
Não à toa, Percepção nos remete a Conhecer, Memória nos remete a Compreender e, finalmente, Raciocínio nos remete a Aprender
Portanto, os pilares da Cognição apóiam a definição de Inteligência.
Vamos analisar primeiramente um Ser Biológico com Inteligência Complexa de baixo nível: as galinhas.
A cientista Siobhan Abeyesinghe, da Universidade de Bristol, no Reino Unido desenvolveu uma pesquisa com um grupo destas aves.
Constatação: machos dominantes possuem um comportamento típico para atrair fêmeas: realizam uma espécie de dança da comida, sempre que encontram algum petisco.
Também observaram, que alguns machos subordinados, realizavam a dança da comida, imitando o macho dominante.
Porém, o mais interessante foi observar que alguns machos subordinados, mesmo não tendo comida por perto, também dançavam com o intuito de atrair fêmeas. Isso mesmo: eles enganavam as fêmeas.
Por outro lado, algumas galinhas percebiam o engodo. Após os machos realizarem a tática com frequência, passando a evitá-los.
Eis dois interessantes exemplos de Comportamento Cognitivo.
Os machos subordinados observaram o macho dominante, conhecendo/percebendo a ação dele e os resultados daquela ação. memorizaram/compreenderam os efeitos e raciocinaram/aprenderam que seria possível atrair as fêmeas imitando o macho dominante.
As fêmeas, por sua vez, conhecendo/percebendo o engodo, memorizaram/compreenderam que aquele macho dançava sem petisco algum por perto. Raciocinaram/aprenderam que aqueles machos subordinados dançavam à toa, desistindo deles.
Notem a sequência de ações: perceber, memorizar e raciocinar. Cognição.
É dessa forma que todos os Seres Biológicos aprendem, utilizando sua faculdade cognitiva para perceber, memorizar e raciocinar, para desenvolver Aprendizado.
A Cognição pode ocorrer nos Seres Artificiais?
Uma calculadora pode derrotar qualquer ser humano no que tange a calcular raiz quadrada. Porém, ela nunca vai aprender absolutamente nada além daquilo para o qual foi programada originalmente.
Assim como a fêmea da galinha aprendeu que não devia confiar em alguns machos embusteiros, uma criança de 5 anos pode aprender a jogar xadrez e avançar em um processo de aprendizado, que pode levá-la a se tornar campeã do mundo algum dia.
Da mesma forma, um Ser Artificial pode fazê-lo. Desde que seu desenvolvimento tenha se utilizado de Computação Cognitiva.
Mas o que vem a ser Computação Cognitiva?
É uma tecnologia que imita o cérebro dos Seres Orgânicos.
Essa tecnologia permite aos Seres Artificiais perceberem dados não estruturados, ou seja, dados não organizados, tratados ou previamente analisados, como acontece em programas tradicionais de computadores.
Na computação cognitiva, a Percepção se dará por meio de dados complexos oriundos de imagens, textos ou áudios.
Uma vez percebidos, os dados serão consultados na Memória para identificar se aquele tipo de dado, foi previamente armazenado. Se tiver sido armazenado, o Raciocínio tentará associar o dado percebido com algum dado armazenado.
Perceba, o processo é muito semelhante ao processo cognitivo orgânico. Assim como os orgânicos, os Seres Artificiais Memorizam dados com o objetivo de estabelecer vínculos associativos entre uma imagem e um texto, um áudio e uma imagem, ou um áudio e um texto, da mesma forma que o ser humano faz.
Usemos um copo como exemplo.
Como sabemos que um copo é um copo e não uma xícara?
Poderíamos usar a técnica do argumento, que seria mais ou menos assim:
Premissa1: xícaras tem asas
Premissa2: o objeto se parece com uma xícara, mas não tem asas.
Conclusão: o objeto é um copo.
Certo, mas por que a conclusão não foi um balde? Ou um dedal? Ou outro objeto qualquer?
Para chegarmos ao copo, nosso cérebro escaneou a imagem e a comparou com outras.
Possuímos centenas, talvez milhares de imagens de objetos semelhantes. Estas imagens estão reunidas em um conjunto, cujo rótulo poderia ser: vasilhames.
Dentro desse conjunto de imagens, há outros subconjuntos, tais como: copos, xícaras, cálices, taças, etc.
Sempre que você vê um copo, seu cérebro roda um algoritmo mais ou menos assim:
Algoritmo de verificação de imagem
Comparar imagem recebida com imagens armazenadas
Se Imagem semelhante for encontrada
Verificar padrão
Calcular probabilidade
Se probabilidade for maior que 75%
Recuperar rótulo
Se probabilidade for maior que 50%
Confirmar com fonte externa
Se Fonte Externa confirmar
Recuperar rótulo
Iniciar Algoritmo de Memorização
Fim da condição Fonte Externa
Senão
Consultar fonte externa
Referenciar rótulo
Iniciar Algoritmo de Memorização
Fim da condição Fonte Externa
Fim da condição Imagem
Algoritmo de Memorização
Comparar imagem recebida com imagens memorizadas
Se Imagem não memorizada
Localizar conjunto de imagens
Se Conjunto de imagens for encontrado
Memorizar imagem no conjunto encontrado
Senão
Criar novo conjunto ou subconjunto
Memorizar imagem no conjunto encontrado
Fim da condição Conjunto
Fim condição Imagem
Contudo, os nossos algoritmos não são estruturados.
O nosso cérebro funciona a base de sinapses, existentes em tanta quantidade quanto o número de estrelas das mais de 200 bilhões de galáxias possíveis de serem observadas com a tecnologia atual.
Na computação cognitiva o processo é muito semelhante. Tudo é baseado em conjunto de dados, intercalados entre si por semelhanças, com um rótulo associado, que determina a que classe aquele dado pertence.
A memorização é até simples de entender, mas como se criam os algoritmos no cérebro humano?
Esta imagem mostra dois neurônios se aproximando um do outro, preparando-se para ativar uma sinapse, que resultará na construção de um aprendizado.
Este é o grande desafio da Computação Cognitiva. Se estes algoritmos tivessem que ser implantados no Ser Artificial não haveria inteligência. Haveria apenas um grupo de instruções fixas, semelhante ao programa da calculadora que calcula a raiz quadrada.
Para reproduzir a inteligência em um Ser Artificial é preciso aplicar os conceitos da Rede Neural, uma tecnologia capaz de emular o ambiente do cérebro humano, imitando a maneira que os neurônios se comunicam entre si.
Tudo começa em um dos nós de entrada, simulando um neurônio, que se conecta a uma ou várias camadas ocultas e, por fim, a uma camada de saída.
Cada nó pode se conectar com qualquer outro nó, que possui peso e limites associados.
Se a saída de qualquer nó for superior ao limite associado, o nó será ativado, enviando dados para a próxima camada.
Esta Rede Neural precisa de dados de treinamento, que vão passar pelas várias camadas, para ensiná-la a melhorar sua precisão ao longo do tempo.
Contudo, quando esta aprendizagem está afinada, transforma-se em uma ferramenta poderosíssima, permitindo classificar e agrupar dados em alta velocidade.
Para entendermos melhor este processo, imagine um cenário, no qual uma Rede Neural precisa ser treinada para reconhecer imagens de animais.
Cada imagem de animal será quebrada em milhões de pixels, que, ao passar pelas diversas camadas da rede neural, vão estabelecer pesos e limites para criar um fluxo padrão para cada tipo de animal.
Dependendo de quantos tipos diferentes de animais foram utilizadas no aprendizado, poderá haver milhares de caminhos dentro da rede neural, cada um com um padrão, formando o aprendizado.
Ou seja, cada imagem de animal terá um caminho aberto por dentro da Rede Neural, de modo que toda imagem parecida seguirá o mesmo caminho.
Assim, quando um nó de entrada recebe a imagem de um gato, vai iniciar um tipo de "raciocínio", utilizando os milhões de pixels, que vão passar pelas várias camadas. A imagem seguirá um fluxo padrão, de acordo com os pesos e limites criados durante o aprendizado.
Ao final, haverá uma probabilidade daquela imagem ser de um gato.
Isso não é semelhante ao que nós fizemos com o copo?
Agora que entendemos um pouco sobre Cognição, Computação Cognitiva e Redes Neurais, sabemos que as máquinas podem simular a inteligência humana.
No próximo capítulo vamos nos aprofundar na Computação Cognitiva e entender como as Redes Neurais estão contribuindo com o ser humano.
Este artigo foi escrito por Marcelino Costa e publicado originalmente em Prensa.li.