Meta lança Sphere mirando o fakend na Wikipédia
As fake news tornaram-se uma preocupação mundial como os vírus, ransomware, spyware e outras funções maléficas que circulam na rede. O combate às fake news envolve plataformas, governos e organizações por conta do prejuízo que podem causar à imagem de pessoas, empresas e políticos, além de prejuízos econômicos.
A inteligência artificial já é usada para produzir o deep fake. É uma técnica para reconhecer padrões em bancos de dados por meio de algoritmos, também conhecida como deep learning. Bem populares, os vídeos produzidos por meio da técnica atingem personalidades e pessoas comuns. Treinada com base nos dados de como a pessoa se comporta, a técnica usa outro sistema: a rede contraditória (GAN, na sigla em inglês) para reproduzir os movimentos e fala do alvo do vídeo.
A Meta – antiga Facebook Inc. – lançou a Sphere (Esfera), uma ferramenta baseada na inteligência artificial que se utiliza de um banco de dados (dataset) com mais de 134 milhões de artigos da web pública. Ainda em fase de testes, é anunciado como o primeiro modelo de IA com potencial para analisar centenas de referências de uma só vez e verificar se correspondem ao conteúdo declarado.
A Sphere poderá ser o início do caminho para o fakend?
Wikipédia
Consultando a Wikipédia, sphere vem do grego antigo sphaîra (σφαῖρα, significando globo, bola), um objeto geométrico tridimensional. Fundamental em vários campos da matemática, esferas e quase esferas também aparecem de forma natural, como as bolhas, e na indústria. A própria Terra é aproximadamente uma esfera e a esfera celeste é um importante conceito na astronomia. E é isso, resumindo o artigo.
Agora o verbete abrange outro significado. A Wikimedia Foundation é a primeira cliente da Meta para a sua nova ferramenta. O time de editores da plataforma Wikipédia passa a contar com a IA para revisar as referências e citações dos mais de 17 mil artigos novos que dão entrada todos os meses.
É uma grande preocupação da organização checar sua imensa base de informações que até hoje tem sua credibilidade contestada pelo grande número de fontes. Embora tenha o mérito de ser uma plataforma colaborativa, nem todos os autores são confiáveis e a referência de informação retirada da Wikipédia não é bem aceita nos círculos acadêmicos e jornalísticos, por exemplo.
Um exemplo da dificuldade da Wikipédia em filtrar as publicações foi a denúncia do jornal The Guardian em 2020, quando se descobriu 20 mil entradas e 200 mil edições de artigos por parte de adolescente americano que desconhecia a língua na qual baseava suas publicações.
A ferramenta pode mudar a realidade da plataforma e a forma de combate às fake news, cuja checagem é feita por agências e checadores de fatos e ideias.
Depois dos conceitos teóricos na definição de esfera da enciclopédia, aparecem uma série de equações e propriedades geométricas que nem tenho capacidade para entender, quanto mais dizer se estão ou não corretas.
A checagem disso vou deixar para a Sphere da Meta.
Fake News
Não há estimativas confiáveis sobre a quantidade de fake news em circulação. Se houvesse, seria fake também. É um problema complexo e longe de ser somente virtual, pois produz impactos reais na saúde pública, na política, nas finanças públicas e privadas.
Sobre o potencial das fake news há mais informação. Em 2018, o MIT realizou um amplo estudo e concluiu que as fake news tem uma velocidade 70% superior em sua disseminação quando comparadas a notícias verdadeiras. E podem atingir até 100 vezes mais pessoas.
Se considerarmos a história da comunicação, as fakes não são uma novidade. O historiador americano Robert Darnton escreveu A Short Guide to History of Fake News que relata as raízes da mentira dentro do universo político. Ele começa no século I A.C., quando Otávio (depois conhecido como o imperador Romano Augusto) difama Marco Antonio, então amante da rainha egípcia Cleópatra, acusando-o de ser bêbado e mulherengo.
Já na era inaugurada por Gutemberg, jornais divulgavam notícias falsas ampliando o público exposto. O potencial da comunicação foi amplamente explorado por Joseph Goebbels em 1933 através da imprensa e do teatro para divulgar discursos de ódio, racismo e xenofobia. Aqui na ditadura militar não foi diferente com a manipulação da imprensa, quando a censura impunha alterações nos textos ou os veículos simplesmente divulgavam sem checagem as notícias oficiais.
A Sociedade da Informação, essencialmente informática e comunicacional, ofereceu outra dimensão para a circulação de informações sérias e maléficas. O fenômeno das redes sociais e seu desenvolvimento oferece mais oportunidades tanto para um lado quanto para outro. Porém, as fake news vem levando vantagem pela sua velocidade de compartilhamento, capacidade de manipulação da informação e interfaces com o senso comum, preconceitos, recalques e ódios atávicos.
Por isso o lançamento da Sphere gera a expectativa de virada de jogo contra as fake news no futuro. Espero que mais plataformas venham a aderir à ferramenta e outras surjam com o mesmo objetivo.
A Inteligência Artificial
É um termo que se refere a qualquer comportamento comparável a humano demonstrado por um sistema ou máquina. Computadores, por exemplo, podem ser “ensinados” a imitar comportamentos humanos utilizando uma ampla base de dados. Assim podem saber desde a diferença entre animais até assumir tarefas complexas.
Até por conta da Sci-fi, pensamos na IA como máquinas ou humanoides capazes de pensar e ameaçar a humanidade. Não chegamos a isso e pesquisas sérias duvidam da possibilidade de substituírem pessoas, pois temos habilidades praticamente inatingíveis pelas máquinas.
Apesar de sempre projetar o futuro quando abordamos a inteligência artificial, ela é bem mais antiga e está na nossa rotina há muito tempo. Desde a época em que foi possível “ensinar” a um computador jogar damas contra uma pessoa já existia a IA. A épica disputa entre o campeão mundial de xadrez Gary Kasparov e o computador Deep Blue nos anos 90 demonstrou até onde a IA poderia ir e a supremacia humana (Kasparov venceu a última partida de uma série de seis).
Temos a IA num sistema de controle de qualidade, pilotos automáticos, fabricação de serviços financeiros e de saúde, análises visuais, entretenimento e outras áreas.
E agora também no combate às fake news.
Este artigo foi escrito por Renato Assef e publicado originalmente em Prensa.li.