Minimalismo, filosofia do máximo com o mínimo
Minimalismo, filosofia do máximo com o mínimo.
Confesso que sou um curioso auto-declarado. Talvez o termo mais adequado, uma das expressões da moda, é que eu um seja lifelong learner. Em outras palavras, sou aquele que está sempre buscando novos conhecimentos e aprendendo coisas novas. Na minha área profissional, a tecnologia, é questão de sobrevivência, mas não me limito a ela. Sou curioso sobre muitas coisas, incluindo filosofias de vida.
Foi mais ou menos por aí que conheci e comecei a me interessar, indo um pouco mais a fundo, por um tal de minimalismo. Antes de me aprofundar no assunto, exerci o meu poder humano onipotente de ser preconceituoso, julgando sem conhecer, carimbando o minimalismo como algo radical demais - afinal o que eu pensava ser era algo que transformaria a vida em algum test-drive de privação, próximo de uma vida monástica, abrindo mão de tudo e vivendo em abstinência total de coisas materiais.
Não é bem assim, muito pelo contrário. Está certo, como em todas as filosofias, há os praticantes mais radicais. Não é incomum depararmo-nos com casos de pessoas que abrem mão de quase tudo, que vivem com o que cabe numa mochila, têm casas quase vazias, e assim por diante. Claro, um dos princípios pregados pela filosofia é o de desfazer-se do excesso de coisas sem importância ou que não sejam essenciais, daí talvez venha o preciosismo. De qualquer forma, justamente para não ser levado por ideias dos outros é que eu gosto de me aprofundar nos temas. Eis que consegui compreender a essência do conceito, que por sua vez acabou me cativando.
Antes de prosseguir, é importante deixar claro: não sou fanático e não tenho a intenção de “converter” ninguém. Tampouco tenho a pretensão de julgar que um ou outro estilo de vida seja melhor, então por favor prezado leitor, entenda que não existe melhor ou pior, e que você não precisa concordar. Minha intenção é apenas compartilhar alguns conceitos e relatar o porquê de eu simpatizar com eles. Quem sabe mais gente pense parecido. Mais um ponto que acho conveniente esclarecer: minimalismo em sua essência é uma filosofia de vida, mas tem sido utilizado também como um estilo de design e decoração, talvez como uma adaptação ou consequência do princípio.
Com as devidas venias, podemos prosseguir.
Faz um bom tempo que tenho adotado uma opção de vida mais low-profile, digamos assim, me interessando menos por aparência, ostentação e consumo. Já tinha abandonado marcas, minhas roupas já não eram marcadas com cavalinho ou jacarezinho, não usava mais relógio, faz tempo que não tenho telefone da maçã, coisas assim. Cada vez vinha frequentando menos restaurantes, não gosto do ritual. Desisti, por opção, desisti de querer ter carro de status, de ter para os outros.
Pensando bem, acho que a pademia me ajudou a refletir mais a fundo sobre isso. Quando nos recolhemos aos nossos lares, quando a vida social de todos foi interrompida, percebi com mais convicção que muitas coisas que em geral são super-valorizadas não têm importância nenhuma. Ficava pensando, que importância tem um relógio de grife pra ficar em casa? E caneta com ícone de neve? Parece cliché, mas eu realmente comecei a pensar, que diferença um carro importado de luxo faz? Eu, pelo menos, não dou mais importância para os outros acharem que estou bem na vida por causa de um carro. Devido à pandemia, consegui realizar algo que planejava há tempo, saí de uma cidade grande, capital, e mudei para o interior. Hoje vivo em uma cidade do interior, belíssima, tranquila e segura, longe da agitação - o local onde moro, inclusive, é isolado dentro da cidade pequena. Continuo trabalhando em home-office e me sinto bem com isso, e, claro, isso facilita o estilo de vida menos formal que adotei.
Voltando ao minimalismo, como já dei a entender, não significa abrir mão de tudo, doar todos os bens e viver sem coisa nenhuma. O princípio fundamental é abrir mão daquilo que não é importante ou essencial, daquilo que não agrega valor à vida, e, pelo contrário, adiciona complexidade. Essa é a diferença. Caso contrário, seria uma vida escassez. Ah, importante não esquecer de frisar, é fundamental que esse processo não provoque sofrimento. No meu caso, o conceito “encaixou” justamente porque pra mim aqueles tipos de coisas já não tinham mais importância nenhuma. Daí para o próximo passo foi mais tranquilo.
Comecei a praticar alguns outros princípios do minimalismo com mais naturalidade, como por exemplo o de não comprar o que que não fosse necessário. Só pra exemplificar: eu citei que me visto de forma simples, é verdade. Praticamente só uso camisetas lisas, sem estampa (fazia isso mesmo antes da pandemia, quando não trabalhava em casa), adoro camisetas . Sou praticante de corrida, adoro tênis de corrida.
Percebi que tenho muuuiiiitas camisetas e vários pares de tênis, então, mesmo gostando e tendo alguma vontade de continuar comprando, simplesmente o fiz. São praticamente dois anos sem camisetas ou tênis novos. Pra dizer a verdade, desde o início da pandemia só comprei umas duas peças de roupa, um calção de corrida e uma camiseta de inverno, isso porque foram reposição de peças de que literalmente se acabaram...
Podem acreditar, prezados leitores, eu não sofro por isso. Nas redes sociais, assim como todo mundo, também sou bombardeado por propaganda de coisas bacanas, tênis, novo modelo de GPS pra corrida, camisetas incríveis, mochilas maneiras, meias coloridas, etc. O impulso e a vontade algumas vezes são de comprar, mas felizmente eu me dou conta de que não preciso e pronto, não sofro. O curioso é que quando se começa a praticar isso como filosofia de vida, o propósito vai se ampliando, passa a ser mais natural. Por mim, eu não compro mais nada que não seja necessário, que tenha uma justificativa. Alguns chamam isso de consumo consciente. Outros de pão-durismo (embora eu insista que não é).
Outro ponto em que o minimalismo me ajuda, como filosofia, é aplicar esse conceito de abrir mão do que não se precisa para o emocional. Em outras palavras, eu exercito a tentativa de não acumular ações ou atos que levem a emoções que não sejam necessárias. Isso envolve decisões de deixar de fazer certas coisas para evitar o que no popular fala-se “se incomodar”. Citei o exemplo do carro, de que comprei um mais simples pra facilitar a vida. A decisão teve a ver também com diminuir a complexidade de manutenção, buscando uma marca que tivesse assistência na minha cidade, ou, em outras palavras, para me incomodar menos. Praticar o minimalismo me ajuda nisso também.
Pra finalizar, gostaria de esclarecer mais um ponto importante sobre o minimalismo. Se alguma coisa é importante para o indivíduo, que não se abra mão dela. Isso quer dizer que pode-se, sim, acumular coisas. Por exemplo, se alguém adora colecionar relógios ou LPs, ótimo, colecione-os. Como eu disse no início, o conceito é abrir mão do que não é importante. Eu mesmo criei na minha casa um canto da leitura, do churrasco e da música que é um verdadeiro caos, onde acumulo dezenas de objetos antigos que são sentimentais, uma verdadeira coleção de quiquilharias; eu mesmo chamo o ambiente de “caos”, e convivo bem com isso. São bugigangas sentimentais e têm valor afeitvo.então não acho que eu deva abrir mão.
Acho que dá para resumir bem dessa forma: se descobrirmos o que não é importante e não carregarmos o peso do que é supérfluo, a vida fica mais leve, a qualidade de vida tende ao máximo. Literalmente.
Este artigo foi escrito por Juliano Statdlober e publicado originalmente em Prensa.li.