O livre arbítrio só vai até onde o medo permite
Nascer, ir para a escola, passar em uma boa faculdade, pegar o tão sonhado diploma, ser contratado por uma boa empresa, se aposentar (o que parece cada dia mais difícil) e finalmente poder descansar dessa longa jornada que passa como um sopro, popularmente conhecida como VIDA.
Particularmente acho muito estranho como eu consegui descrever as histórias passadas (e até mesmo o futuro) de milhões de pessoas em apenas 4 linhas. Como que centenas de milhares de seres biologicamente únicos podem ter uma jornada tão semelhante mesmo tendo um oceano os separando?
A verdade é que existem tantos limites em nossa sociedade que ela acaba criando uma espécie de forma, semelhante às que encontramos nas fábricas de sapatos, alguns se diferenciam um pouco no tamanho e no estilo, mas em essência possuem a mesma finalidade.
E por limites eu não quero dizer apenas os legais e éticos, esses são essenciais para garantir a manutenção de uma convivência harmoniosa. Os limites que critico são aqueles instituídos basicamente pelo medo: o medo de errar, o medo de desapontar alguém que amamos, o medo de ser humilhado, o medo de não conseguir. Receios esses que, infelizmente, são construídos e alimentados desde o jardim de infância.
O medo é um sentimento naturalmente humano, ele funciona muito bem para o que foi criado: PARA NOS MANTER VIVOS. Ele está junto a nós desde a idade das cavernas, era ele que instintivamente fazia com que nossos antepassados fossem para as cavernas durante a noite para se proteger.
Porém, com o passar dos anos, esse sentimento passou a se transformar em rédeas toda vez que os chefes ameaçam seus funcionários caso não atinjam a meta do mês, toda vez que as mães ameaçam seus filhos caso tirem uma nota abaixo da média na escola, toda vez que os professores ameaçam os alunos caso não o deixem dar aula. O medo passou a fazer parte do nosso cotidiano, para os pais de hoje em dia, a maneira mais fácil e eficiente de se educar uma criança não é mais por meio do diálogo, e sim com o MEDO.
E basicamente com o medo e com a estruturação da sociedade podemos voltar para o primeiro parágrafo desse artigo, o qual sintetizei a trajetória de milhares de pessoas em apenas 4 linhas. A atual estrutura da nossa sociedade é basicamente NASCER --- ESTUDAR--- TRABALHAR --- MORRER, toda nossa educação básica é voltada para essa formatação, e para sair dessa “trilha natural” não é fácil justamente porque exige uma qualidade que diminui a cada vez que o medo aumenta: A CORAGEM. Coragem para ouvir as pessoas dizendo constantemente que não vai dar certo, e seguir em frente, coragem para fazer o que ninguém espera, coragem para se libertar das rédeas do medo.
Vamos fazer um teste!
Imagine você, no auge dos seus 18 anos, depois de muito esforço você ganhou uma bolsa integral para estudar em Harvard, uma das melhores universidades do mundo. Porém, logo no 2º período da faculdade, durante uma aula de cálculo 2, você tem uma ideia para um projeto que acredita que pode ser gigantesco um dia, e a necessidade de colocar isso em prática te consome tanto que você decide largar a faculdade e pegar um empréstimo de R$20.000,00.
Ao ler essa história, qual o seu primeiro pensamento?
“Tá maluco? Nunca que eu iria largar uma faculdade dessa para começar um projeto, ainda mais se endividando dessa forma.
“Com certeza faria isso!”
Eu não sou muito bom com adivinhação, mas tenho quase certeza que você, assim como eu, pensou na opção 1. Ah! E antes que pensem que eu inventei uma história muito extrema que nunca aconteceria, recomendo que assistam ao filme “A Rede Social”,que conta a história de como surgiu o facebook (vocês vão notar algumas semelhanças com esse exemplo aí de cima).
E o mais legal disso tudo, quando comecei esse artigo eu comentei o quão estranho eram pessoas completamente diferentes tendo uma trajetória de vida tão semelhante. E agora, no parágrafo de cima, temos uma prova de como grande parte de nós está amarrado por essas rédeas do medo, no momento em que nós, pessoas de estados, países e quem sabe até de continentes diferentes, que nunca nos vimos na vida, tivemos como reação instintiva o mesmo pensamento!
Este artigo foi escrito por Vinicius Cabral e publicado originalmente em Prensa.li.