O Talibã está retornando ao poder, mas quem são eles?
Imagem: REUTERS/Stringer
O Afeganistão está novamente em estado de turbulência.
Cenas de caos e desespero foram vistas no Aeroporto Internacional de Cabul, no Afeganistão, em meio à tentativa de fuga em massa depois que o grupo fundamentalista Talibã entrou na capital e tomou o controle da totalidade do país no domingo (15/08).
A operação seguiu rapidamente desde a retirada das tropas americanas do país no mês passado por ordem de Joe Biden. A saída ocorre quase 20 anos depois que os militares dos EUA expulsaram a mesma facção de Cabul em 2001.
Os insurgentes declararam o país um “Emirado Islâmico” enquanto milhares tentavam deixar a cidade. Ao mesmo tempo em que o presidente Ashraf Ghani abandonava o palácio presidencial e fugia.
As imagens mostram o culminar de semanas de tensão no país, que viu o Talibã retornar ao poder - mas quem é o grupo e por que as pessoas estão tentando desesperadamente deixar um país agora sob seu controle?
Imagem: BBC
Quem são os talibãs?
O movimento talibã ganhou destaque em 1994 durante a Guerra Civil Afegã. O grupo era composto por jovens afegãos que estudaram em escolas islâmicas sunitas no Paquistão após fugirem do Afeganistão durante a ocupação soviética de 1979-1989.
Muitos dos membros do grupo haviam sido combatentes da resistência mujahideen que lutaram contra o governo soviético.
A palavra Talibã vem de ‘talib’, a palavra árabe para estudante. O grupo foi fundado por Mullah Baradar e Mullah Omar no início de 1990. Prometendo restaurar a ordem e a justiça, eles receberam apoio substancial do Paquistão.
Os Estados Unidos também apoiaram o grupo de rebeldes em sua luta contra seu próprio inimigo da Guerra Fria, tanto que Sylvester Stallone lutou ao lado do “galante” mujahideen em Rambo III (1988).
O grupo então conquistou o poder em 1994. Eles tomaram a cidade de Kandahar quase sem lutar. Depois disso, avançaram continuamente para o norte e por fim chegaram a Cabul em setembro de 1996.
O governo do temor
Depois de assumir o comando do Afeganistão, o governo impôs aos cidadãos do país as interpretações mais estritas da lei Sharia - um dos principais motivos pelos quais as pessoas agora estão tentando fugir.
As pessoas também estão preocupadas com a possibilidade de o país mergulhar no caos ou de o Talibã realizar ataques de vingança contra aqueles que trabalharam com os EUA ou o governo.
Em 1998, o Talibã controlava 80% do Afeganistão, mas só foi reconhecido como governo legal pelo Paquistão, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita.
O governo brutal do Talibã foi então abruptamente encerrado pelas forças da coalizão liderada pelos EUA em dezembro de 2001.
A ação foi uma retaliação ao devastador ataque terrorista fundamentalista no World Trade Center na cidade de Nova York, que matou 2.996 pessoas e deixou 25.000 feridos, uma atrocidade orquestrada pelo líder da Al Qaeda, Osama Bin Laden, de dentro do santuário do Afeganistão controlado pelo Taleban.
No início de dezembro daquele ano, o governo havia caído e seus líderes fugiram para seus redutos no sul e no leste do país, ou através da fronteira com o Paquistão.
A empreitada até o poder novamente
Apesar da derrota, os combatentes do grupo posteriormente se reagruparam como uma insurgência e, desde então, continuaram a batalha para recuperar o país das forças armadas dos EUA.
O Talibã já havia procurado a administração de Donald Trump quando o republicano assumiu o cargo em 2017, e posteriormente assinou um acordo de paz em Doha, Qatar, em fevereiro de 2020.
O acordo favoreceu os EUA, que viram os extremistas prometerem que impediriam os inimigos da América de atacarem o país em futuros embates terroristas. Em troca, os Estados Unidos retirariam suas tropas do Afeganistão e libertariam 5.000 prisioneiros.
O acordo foi cumprido pelo atual presidente americano, Joe Biden. No início de julho o exército americano começou a deixar o país.
Hoje, o grupo deixa claro quais são os motivos de estarem em busca do poder novamente: a ressurreição completa do emirado islâmico que governou de 1996-2001.
Quando falamos em ressureição do governo talibã, entendemos o porquê da população afegã estar aos prantos e com medo de continuar no país. Principalmente as mulheres.
O controle sobre as mulheres
Sob a versão radical da lei Sharia que o Talibã impôs na última vez em que estiveram no poder, as mulheres e meninas afegãs eram proibidas de estudar ou trabalhar.
O uso da burca era obrigatório em público e as mulheres não podiam sair de casa sem um companheiro do sexo masculino.
Aquelas que descumprissem qualquer uma das regras eram chicoteadas e executadas em praça pública.
Filmes, música e outras influências culturais não islâmicas também foram proibidas e artefatos históricos, como as estátuas do Buda Bamiyan, destruídos.
A expulsão do Talibã não significou o fim dos diversos abusos, mas nas últimas duas décadas, os direitos humanos melhoraram, especialmente nas cidades grandes, pois as mulheres foram “autorizadas” a frequentar as universidades e tiveram mais oportunidades de trabalho.
Algumas semanas atrás, antes de retornar ao poder, o grupo procurou tranquilizar as pessoas e disse que afegãos não deveriam temê-los, além de garantir que não se vingariam daqueles que apoiaram a aliança dos EUA.
Em uma mensagem postada nas redes sociais, o cofundador do Talibã, Abdul Ghani Baradar, pediu que seus combatentes continuem disciplinados após assumir o controle da cidade.
“Agora é hora de testar e provar, agora temos que mostrar que podemos servir a nossa nação e garantir segurança e conforto de vida”, disse ele.
O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, recentemente pediu ao Talibã e todas as partes a “exercerem moderação” e disse que os direitos das mulheres e meninas devem ser protegidos.
No entanto, o medo e o ceticismo permanecem, dadas as leis que existiam durante o seu governo anterior.
O mundo precisa voltar-se para o Afeganistão e ficar atento à população e, principalmente, às mulheres, meninas e crianças que podem viver uma nova era sem diretos humanos.