Os museus históricos e suas conversas com a gente
Um pouquinho sobre a percepção de museu no tempo histórico:
A concepção de museu vem se transformando ao longo do tempo.
Na Grécia Antiga, Mouseion denominava o templo das nove musas, filhas de Zeus com Mnemosine, e se destinava à contemplação e aos estudos científicos, literários e artísticos.
Durante a idade média, os museus foram pouco explorados, não havia uma consciência na época para desenvolver tal concepção.
O interesse por esse tipo de conhecimento reapareceu por volta do século XV, quando o colecionismo tornou-se moda em toda Europa.
Organização das coleções em espaços específicos e com critérios:
Do século XV em diante as percepções foram marcadas pelo movimento sócio histórico de cada época.
As coleções foram se especializando, sendo organizadas a partir de critérios, abandonando assim a função de saciar a mera curiosidade.
Como por exemplo, durante o Iluminismo, os conjuntos de peças tinham responsabilidade de difundir a crença de que colecionar exemplares era uma das maneiras de conhecer cientificamente a natureza.
E os museus hoje?
Você tem visitado, presencial ou virtualmente, museus históricos, ou museus em geral?
Afinal o Brasil foi um dos 20 países que mais buscou por museus virtuais em todo o mundo nesses tempos de pandemia.
Esse tour digital reforça a ideia de se pensar os museus históricos como um lugar dinâmico.
Não é mais compatível pensar os museus hoje em dia como locais que dispõem apenas objetos do passado. Como espaços pouco dinâmicos, sem interação com as pessoas e com as suas realidades. Esse é um conceito desclassificado do nosso acervo conceitual contemporâneo.
Em outras palavras, pensar que os museus são espaços descomprometidos com as realidades e com as diversidades: cultural, étnica, de gênero, social, é inibir características multidimensionais que habitam esses espaços.
Pois são justamente essas camadas culturais que comunicam narrativas através da disposição dos acervos. Ir a um museu histórico é ter um dedo de prosa com as temporalidades, e não apenas se deparar com objetos do passado.
Guardar para ver, com a palavra Antônio Cícero:
Guardar...Guardar...Guardar
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la
Em cofre não se guarda nada
Em cofre perde-se a coisa à vista
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la
Mirá-la por admira-la
Isto é, iluminá-la e ser iluminado por ela
Estar por ela
Ou ser por ela
O Museu Histórico não pode ser um cofre estático, pesado em sua estrutura cinza de metal, o museu precisa se comunicar com a gente, ou seja, deixar os objetos manifestarem as suas narrativas e discursos históricos, sociais, culturais e antropológicos.
E nessas conversas com as peças, com o acervo, é que a gente pode apreender as contradições do humano (e por análise e extensão, as nossas próprias contradições) dentro dos grupos histórico-sociais que coabitam.
Museus e suas dimensões:
Segundo a pesquisadora Letícia Julião os museus atuam em três campos interdisciplinares e complementares:
Preservação (prolongação da vida útil dos bens culturais),
Comunicação (relação sujeito – bem cultural) e
Investigação (que tem o papel de ampliar as possibilidades de comunicação dos bens culturais).
A pesquisadora faz uma crítica em relação à atuação dos museus nos dias atuais, pois ela percebe que a maioria das instituições museológicas têm relegado para segundo plano as atividades de pesquisa, e em decorrência disso, é possível observar um crescente empobrecimento dos processos comunicativos.
Também podemos destacar outro ponto para a discussão, que é a estrutura organizacional dos museus.
Como por exemplo, a disposição e escolha dos objetos, as narrativas implícitas, a didática do acervo, que muitas vezes é conservadora, e o direcionamento das visitas por uma lógica disciplinar tradicional.
Nas palavras do pesquisador Mário de Souza Chagas, essa configuração das peças museológicas, deixam transparecer as relações de poder, pois os museus não são templos inocentes de memória.
Encerrando filosoficamente:
Pensando em Walter Benjamin:
O passado é um porvir...
Referência Bibliográficas:
JULIÃO, Letícia. Apontamentos sobre a história do museu. In: CADERNO de diretrizes museológicas. 1. Brasília: Ministério da Cultura / Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional/ Departamento de Museus e Centros Culturais. Belo Horizonte: Secretaria de Estado da Cultura/ Superintendência de Museus, 2006. 2º. Edição.
Musas, Revista Brasileira de Museus e Museologia número 3-2007, In: Márcia Scholz de Andrade Kersten e Anamaria Aimoré Bonin (p.117-178).
CHAGAS, Mário de Souza. Memória e poder: focalizando as instituições museais. In: Interseções – Revista de estudos Interdisciplinares, Uerj, ano 3, n 2, julho-dezembro, Rio de Janeiro, 2001.
Este artigo foi escrito por Fabiana Kretzer e publicado originalmente em Prensa.li.