Pegasus: O "Cavalo de Troia" da espionagem cibernética
Trinta e sete smartphones foram alvo de um spyware de nível militar, licenciado pela empresa de vigilância israelense NSO Group. Dentre as pessoas atingidas há jornalistas, advogados, executivos, diplomatas, ativistas e até mesmo o presidente francês Emmanuel Macron e o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom. Também foi revelada a existência de uma lista com 50 mil nomes de pessoas influentes de 45 países
A descoberta tem sua origem no Projeto Pegasus, uma série de reportagens investigativas, realizadas por 80 jornalistas de 17 organizações midiáticas com a Anistia Internacional e Forbidden Stories, ONG de direitos humanos que auxiliou nos testes em smartphones infectados.
Como o Pegasus age
De acordo com os veículos de mídia, o celular das vítimas era monitorado pelo spyware israelense Pegasus. A investigação indicou um abuso generalizado e contínuo do mesmo. Já que o malware infecta dispositivos mobile e pode extrair uma série de informações como:
Mensagens em chats;
Fotos;
Vídeos;
E-mails;
Localização;
Histórico de navegação.
Outra preocupação é sua capacidade de ativar a câmera e microfone, bem como gravar as chamadas. Tudo de forma silenciosa.
Em suas primeiras versões, a ferramenta precisava que o usuário clicasse em algum link enviado. Com o tempo, o Pegasus passou a se aproveitar de falhas de segurança nos códigos de dispositivos móveis, tanto iOS quanto Android. Ele também se infiltrava por meio de brechas em aplicativos como WhatsApp e iMessage.
Em função das invasões secretas, a Apple e o Google já corrigiram falhas que permitiam a espionagem do Pegasus, mas o software ainda se aproveita de aparelhos que não foram atualizados ou de novas falhas.
Apesar do NSO Group afirmar que sua solução tem como propósito apenas o combate a criminosos e terroristas, os casos de “desvio de função” do Pegasus não são incomuns. O programa já esteve envolvido em escândalos em mais diversos. A série de reportagens divulgou que os dados extraídos pelo spyware teriam sido usados por dez governos e constavam nos registros da NSO desde 2016.
Quem estava na mira
Um dos clientes do NSO Group seria o governo mexicano, que investiu, segundo o jornal norte-americano The New York Times, US$ 80 milhões entre 2011 e 2017 para usar o Pegasus. Na época, os celulares de opositores do então presidente Enrique Peña Nieto recebiam um link que permitia a instalação do spyware e dava início ao monitoramento.
Outros países que requisitaram os serviços do NSO Group foram Azerbaijão, Bahrein, Cazaquistão, Marrocos, Ruanda, Arábia Saudita, Hungria, Índia e Emirados Árabes Unidos.
E quando o assunto são pessoas de interesse, além de Emanuel Macron, outros líderes foram alvos do spyware:
Cyril Ramaphosa, presidente da África do Sul, alvo selecionado por Ruanda;
Saad Hariri, ex-primeiro ministro do Líbano, selecionado pelos Emirados Árabes Unidos;
Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, escolhido por Marrocos;
Imran Khan, primeiro-ministro do Paquistão, escolhido pela Índia;
Felipe Calderón, ex-presidente mexicano, escolhido por um cliente não identificado quando sua mulher, Margarita Zavala, disputou a presidência;
Robert Malley, chefe diplomático do acordo nuclear Irã-EUA, apontado como persona de interesse por Marrocos.
A análise de registros realizada pela Forbidden Stories apontou que pelo menos 180 jornalistas tiveram seus telefones selecionados por 20 países clientes do NSO Group. Um dos nomes nessa lista é Cecilio Pineda Birto, repórter mexicano.
Credenciais de imprensa de Pineda - Reprodução: The Guardian
Os documentos indicam que o profissional era alvo de interesse de um cliente mexicano nas semanas anteriores a seu assassinato em março de 2017. As suspeitas são de que o spyware denunciou sua localização. Entretanto, seu celular não foi encontrado com o corpo, o que impediu testes no aparelho.
A investigação também identificou jornalistas da grande mídia internacional, incluindo a Associated Press, CNN, The New York Times e Reuters como potenciais alvos. Uma das jornalistas de maior destaque foi Roula Khalaf, editora do Financial Times.
Outro caso relacionado ao Pegasus foi o assassinato do jornalista e ativista saudita Jamal Khashoggi, na Turquia, em 2018. Ele era colunista do Washington Post e crítico ao regime da Arábia Saudita.
Segundo análise do Laboratório de Segurança da Anistia Internacional, o telefone de Hanan Elatr, mulher de Jamal, foi alvo do Pegasus 6 meses antes do assassinato. Já o de sua noiva, Hatice Cengiz, foi invadido dias após a morte do jornalista.
Até a Lava Jato
A sofisticada ferramenta de espionagem agora desperta interesse de procuradores da extinta força-tarefa da Lava Jato. Em petição protocolada no dia 26/07 no Supremo Tribunal Federal, a defesa do ex-presidente Lula indicou que procuradores em Curitiba negociaram a contratação de diversos softwares de espionagem, incluindo o Pegasus.
Em nota, o Ministério Público Federal declarou que “a força-tarefa jamais negociou a aquisição de qualquer equipamento ou sistema, nem tinha atribuição para isso".
Este artigo foi escrito por Luana Brigo e publicado originalmente em Prensa.li.