Quando encontrei com Pixinguinha
Como nesse ano não vai ter carnaval bora de crônica.
Quando achei Pixinguinha.
No último carnaval encontrei com Pixinguinha. O encontro foi na Banda de Ipanema que soprava a todo vapor seus metais em plena Orla Carioca. O saxofone se destacava. Contemplava a melodia do instrumento e veio-me a lembrança de um dos músicos mais criativos do Brasil: Alfredo da Rocha Viana Filho; O Pixinguinha. Tal lembrança assaltou-me não porque era carnaval. Tão pouco porque ao fundo se podia ver a cúpula da Igreja Nossa Senhora da Paz, lugar aonde nosso maestro veio encontrar Olodumare. A lembrança daquela tarde de 1973 não se esgotava no fato jornalístico dado por um menino que saira gritando pelas ruas de Ipanema: “Pixinguinha morreu”. Também não era porque logo após a Banda de Ipanema saber da noticia mudara a musica que tocava.
De Paris ele trouxe um saxofone, desses cheios de alma. “Olha ele agora é do Jazz”, “virou americanizado!”. Falavam aquelas línguas maldosas acerca do líder dos Oito Batutas. O homem preto, alto, vestido com um terno elegante, ignorava os desavisados e empunha seu saxofone com maestria. As notas mais brasileiras que um músico pode tirar de seu instrumento eram ouvidas. Não pensem cá que o bom músico se resume a tocar bem sua ferramenta de trabalho. Não! É necessário algo mais que técnica para ser um artista. Pixinguinha pegou um instrumento antes exclusivamente Jazzístico e o tornou brasileiro. Revestiu de características novas o já conhecido. Trouxe o saxofone para a brasilidade, para o samba, o choro e para toda a herança musical africana que cabia dentro dele. A criatividade! Talvez isto diferencie o artista do técnico em arte.
Naquela tarde de carnaval não chovia como na tarde em que ele nos deixou. Tão pouco os acordes que eram soprados saiam dos pulmões e da genialidade de Pixinguinha. O que trazia a lembrança dele bem ali, diante de min? Há um provérbio iorubá que diz: "estamos onde estamos hoje porque estamos sentados nos ombros daqueles que vieram antes de nós". É isso, só se pode tocar saxofone dessa forma sentado nos ombros do Pixinguinha.
Este artigo foi escrito por Ifaponle Ayinla e publicado originalmente em Prensa.li.