Quem canta seus males espanta!
De hoje em diante, vamos abrir espaço para uma nova abordagem da cultura pop: vamos falar de filmes, música, TV, quadrinhos e outras formas de comunicação desse mundão, mas sempre buscando histórias diferentes e curiosas sobre essas produções.
Nossa primeira incursão vai falar do filme Sing - Quem Canta Seus Males Espanta, de 2016, que apesar do subtítulo brasileiro um tanto desanimador, é uma animação de primeira linha, guardando boas surpresas sob vários aspectos.
Dirigida por Garth Jennings, esta produção da Illumination Studios (a mesma das franquias Meu Malvado Favorito, Pets e é claro, dos Minions) traz a história de Buster Moon, um empresário falido, no comando de um teatro decadente. Cabe citar que o Sr. Moon é um coala.
Um show animal
Todo o elenco deste filme é formado por bichos, com comportamentos bem humanos, habitando uma metrópole com todos os problemas que uma cidade humana tem direito. Poderia ser ambientado em Zootopia, outra excelente animação, que ficará para outro dia.
Nosso amigo Sr. Moon tem uma ideia: criar um concurso para descobrir novos talentos musicais, oferecendo tudo o que tem como prêmio, torcendo para que o valor levantado com as inscrições e ingressos evite que o teatro seja tomado pelos credores.
O problema é que o “tudo o que tem” é um valor tão irrisório que dificilmente atrairia algum candidato em sã consciência. Mas um pequeno acidente envolvendo Dona Quiqui, assistente do Sr. Moon (não vamos entrar neste assunto porque senão perde a graça) faz a divulgação do evento tomar proporções monstruosas.
Centenas de candidatos se aglomeram na fila de inscritos para as audições classificatórias (ok, é um filme pré-pandemia), dando voltas no quarteirão. A cena das seletivas (no melhor padrão Ídolos) é hilária, com vários estilos musicais sendo defendidos pelas mais variadas espécies animais. Há uma sucessão de gags visuais e sonoras, que merecem ser assistidas mais de uma vez.
É a partir deste ponto que começa a verdadeira mágica de Sing. Seis finalistas são escolhidos e suas histórias se entrelaçam, enquanto Buster faz o impossível para tocar o plano em frente. Essa fórmula batida poderia resultar em um dramalhão ou no mínimo uma bruta confusão, mas não é o que ocorre. O roteiro, bem construído, emociona e faz rir na medida certa.
And the winner is...
Eis os finalistas: Rosita (uma estafada porquinha dona-de-casa, mãe de vinte e cinco leitõezinhos); Mike (um camundongo de índole, digamos, bastante duvidosa); Johnny (um jovem gorila buscando fugir da vida ilícita de seu pai), Gunther (um porco alemão dançarino e sem noção); Ash (uma ouriço adolescente) e Meena (uma elefanta talentosa e totalmente dominada pela insegurança).
Detalhes obrigatórios a se destacar nesta produção: preste muita atenção à cena de reconciliação entre Johnny e seu pai, embalada por uma interpretação vibrante de I Still Standing, clássico de Elton John. Fique atento às sutilezas desta cena, principalmente aos detalhes da iluminação. Muito da história é contada ali, de modo quase subliminar.
Imperdível também é a interpretação do camundongo Mike. Sim, um típico ratinho branco de laboratório fazendo uma versão espetacular de My Way, talvez a obra máxima na voz de Frank Sinatra, no qual o personagem é claramente inspirado. Arrisco dizer que esta versão fica entre as três melhores, ao lado da cantada por Elvis Presley e a do próprio Sinatra. A versão do ratinho é absolutamente grandiosa, e nem poderia ser de outro modo. Não posso me alongar aqui senão estrago a surpresa.
Não menos impactante é a revelação da porquinha Rosita, que finalmente mostra à sua família um lado desconhecido, oculto há anos por seu papel de mãe, esposa e dona-de-casa, desvalorizada pelos filhos e pelo marido insensível. Sim, é uma animação, dedicada principalmente ao público infantil, mas traz temas sérios, como se pode notar.
Um elefante impressiona muita gente
Já a elefanta Meena, sabotada o tempo todo pela timidez (e em boa parte pelas ações de Mike) protagoniza uma das cenas mais fantásticas do filme. Fique de olho nos detalhes técnicos, que colocam essa animação acima da média, sem dever nada para as produções da Disney/Pixar ou Dreamworks.
Quando Meena finalmente se põe a cantar, é possível ver o crescimento do personagem em tela de maneira tão poderosa, que ela sozinha mereceria uma indicação ao Oscar® de melhor atriz, caso não fosse um personagem animado. É impossível não se contagiar. Assim como a ouriço Ash, descobrindo no decorrer da história seu verdadeiro valor.
E não podemos deixar de destacar o melhor alívio cômico de Sing. Dona Quiqui, a assistente, braço direito e faz-tudo de Buster Moon.
Ela é uma camaleão de idade avançada, aparentemente trabalhando no teatro desde a fundação e não mede esforços para que os planos do patrão deem certo. Não me atrevo a contar, mas ela tem um papel decisivo em toda a história.
Pequenas (e divertidas) surpresas
Há várias brincadeiras, diversos easter eggs nesse filme. Se na infância você assistiu ao desenho animado As Aventuras de Babar, irá perceber uma pequena homenagem ao conhecer a família de Meena. Há um sem número de referências a outros filmes, personalidades, e mesmo à outras animações da própria Illumination.
Uma informação necessária: Sing deve ser visto tanto no original quanto na versão dublada. Ambas, excelentes. O original conta com a participação de Matthew McConaughey, Reese Witherspoon, Scarlett Johansson, Seth MacFarlane, entre outros.
A versão nacional conta com Mariana Ximenes, Sandy, Marcelo Serrado, Fiuk e Wanessa Camargo, além de um time de dubladores profissionais de primeira. Se você tem algum preconceito contra os atores citados, jogue fora e assista mesmo assim. Vale dizer que a interpretação de Wanessa Camargo, no papel de Ash (na original é a Viúva Negra Scarlett Johansson) não fica nada atrás, muito pelo contrário.
Sing - Quem Canta Seus Males Espanta pode ser encontrado em DVD, Blu-ray e nos bons streamings de vídeo à disposição. Não sei qual sua opinião a respeito de animações com bichinhos, mas eu recomendo fortemente dar uma chance a este filme. Você vai se surpreender.
O filme faturou a bagatela de 875 milhões de dólares nos cinemas do mundo todo; pode parecer modesto perto de Procurando Dory, lançado na mesma época pela Disney/Pixar. O suficiente para a Illumination preparar uma sequência que está para sair do forno, com o elenco original e ninguém menos que Bono, consagrado líder da banda U2, em um papel de destaque. O trailer já está disponível na internet.
Planejado originalmente para 2020 e adiado devido à pandemia, Sing 2 tem estreia prevista para 23 de dezembro de 2021 em circuito nacional.
Este artigo foi escrito por Arthur Ankerkrone e publicado originalmente em Prensa.li.