Resenha-ensaio: um mergulho no curta-metragem Saludo
Imagem: twenty20photos / Envato Elements
Na ficção, uma orelha visita um hospital psiquiátrico e meus olhos visitam o curta-metragem, sem entender quase nada. O tempo rouba de mim uns cinco minutos para que eu compreenda as intenções da viagem quase obscura e sem diálogos. Assisto a uma parte do corpo que ouve o mundo sob outras dimensões. A música, o som indiscreto à sua volta, a engrenagem e o relógio. Ponteiros se movimentam da mesma forma taylorista de sempre, tudo em branco e preto. Passam por cima dos números romanos, mas eu não estou em Roma.
Assisto o passeio até o fim. Olhos de pérola se deslocam para um neutro labirinto. Assim o vejo. Nunca pensei na possibilidade de falar a respeito de labirintos e muito menos na neutralidade deles. Pensei que fosse a melhor palavra para substituir a ideia da cor branca.
Não estou no Antigo Egito, onde os labirintos eram quadrados ou retangulares. Estou em mim e se não é fácil fugir de minhas próprias armadilhas, não quero me dar ao trabalho de visitar labirintos a mim não destinados. [Que cada um seja capaz de cumprir seu próprio destino, cheio de armadilhas]. Assim foi com Agripina, que esteve em Roma, e com Sêneca. Não escaparam das armadilhas de Nero. [Que cada um de nós consiga escapar de nossos neros e neuras contemporâneas].
Minha viagem durou cinco minutos e precisei multiplicá-los por três para escrever estas linhas. Para que meu texto não se torne um labirinto, por hora não falarei mais em Agripina, Nero ou Sêneca. Falarei do filme.
Enquanto assisto a animação boliviana Saludo, penso em como os cinco sentidos podem se manifestar por meio da audição. O ouvido capta quase tudo à sua volta. O grito, o toque do telefone, a canção. O ouvido enxerga ruídos do dia obscuro de hoje, tateia as paredes em ruínas, fala com a mente perturbada que se encontra sozinha em uma sala pequena.
O ouvido vê a mente perturbada em um labirinto e sente o gosto do tempo distorcido quando as grandes cortinas vermelhas se abrem. Mas não fiquemos iludidos. O espetáculo continua, mesmo que nem todos percebam. Os labirintos estão ocultos. Diferentes formatos e não existe neutralidade.
Sem sombra de dúvidas, estamos destinados a percorrer labirintos. Então, vamos economizar tempo nesta jornada. Não adianta desviar-nos do tempo que nos resta. Que seja percorrido o labirinto com maestria e sem neuras, se a isto estamos destinados aqui, em Roma ou no Egito.
Filmografia
SALUDO. Direção: Esteban Medrano. Produção: Esteban Medrano. Bolívia. 2020. 5 min. Disponível em: https://www.retinalatina.org/video/saludo. Acesso em: 16 abr. 2022.
Este artigo foi escrito por Rosa Acassia Luizari e publicado originalmente em Prensa.li.