Seriam os vírus seres vivos?
Ser vivo ou só vírus mesmo? CDC/Unsplash
O que é “estar vivo”? Essa pergunta, profundamente filosófica, é a chave para entender se os vírus – que ultimamente queremos tanto matar – possuem vida. A questão permanece sem resolução há anos, e os cientistas se desdobram para encontrar definições de “vida” que coloquem esses organismos dentro ou fora do seleto grupo dos “seres vivos”.
A definição do que separa um ser vivo de qualquer outra coisa é uma questão crucial na biologia, diz o pós-doutor em micro-organismos Átila Iamarino. A rigor, somos um aglomerado de moléculas, da mesma forma que uma cadeira ou a tela em que você lê este texto. No entanto, como essa comparação ignora muitas diferenças importantes, os biólogos estabeleceram algumas regras básicas para definir o que é um ser vivo – e o que não é.
Os vírus acabam reprovados em alguns critérios: eles não são formados por células nem têm metabolismo próprio. Isso quer dizer que, ao invés de cápsulas com divisões de tarefas bonitinhas que produzem proteínas e energia (as quais nós chamamos de células), eles se constituem de um simples envelope com material genético dentro. Sem a célula de um hospedeiro, que os vírus roubam para replicar seu DNA e RNA e produzir suas proteínas, eles são só pacotinhos esquecidos por aí.
Acontece que, em outros quesitos, os vírus se dão muito bem: eles são capazes de evoluir (as incursões do novo coronavírus pelo alfabeto grego que o digam), habilidade exclusivíssima dos seres vivos. Além disso, alguns deles conseguem controlar quais genes propagam. São os Sputnik, que podem infectar outros vírus maiores, os mimivírus.
Ao dominar o processo de replicação, os Sputnik conseguem modificar, a seu bel-prazer, o genoma que o mimivírus está copiando. Assim, esses saquinhos de DNA e RNA, munidos da habilidade de interferir no que acontece com seu conteúdo, deixam de ser meros pacotinhos ao léu.
Samba Vírus, mimivírus encontrado no Rio Negro. Bem maiores e com DNA bem diferente dos demais vírus (graças às alterações dos Sputnik), os mimivírus foram por anos confundidos com bactérias. UFMG/Reprodução
A conclusão desse debate, contudo, não existe (pelo menos ainda). Para os cientistas que valorizam mais o metabolismo e as células, como Átila, os vírus são... só vírus mesmo. Já para quem dá mais importância à capacidade de evoluir e de controlar a propagação genética, como o virologista francês Jean-Michel Claverie, descobridor dos mimivírus, eles estão junto conosco no grupo dos seres vivos – e, com vacina, alguns podem logo figurar entre os mortos.
Este artigo foi escrito por Diogo Leite e publicado originalmente em Prensa.li.