Tecnologia assistiva: além dos olhos
Não faz muito tempo, o colega Arthur Ankerkrone publicou nesta Prensa uma série bem interessante de artigos sobre tecnologias da ficção que tornaram-se reais.
E não é que encontrei outra? Justamente na franquia onde o colega enfileirou várias: Star Trek.
Vou dar o contexto aqui, já que ninguém tem obrigação de ser fã ou conhecer o conteúdo de 11 séries e 12 longa-metragens.
Em Star Trek: The Next Generation, mais conhecida por aqui como Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, o engenheiro chefe da nave Enterprise, Geordi La Forge (vivido por LeVar Burton) é deficiente visual total desde o nascimento. Mas como alguém nestas condições pode chegar a um posto tão alto numa nave estelar?
Muito bem: La Forge usa o V. I. S. O. R., um gadget que parece a mistura de um óculos com o filtro de ar de um automóvel. O equipamento capta o ambiente em sua volta e transmite todas as formas e sensações através de pulsos emitidos diretamente ao seu córtex cerebral. Legal, né? Tecnologia comum no século 24.
Mas acredite, apesar de ainda não tão avançado, há um equipamento israelense que quebra um galho e tanto para quem tem limitações visuais, desde parciais até totais.
Trata-se do OrCAM My Eye. E melhor: o equipamento já pode ser usado, gratuitamente, em algumas bibliotecas públicas da cidade de São Paulo e em algumas instituições de ensino.
Enxergando sem ver
O equipamento é chamado de "óculos de tecnologia assistiva". Em resumo, uma microcâmera com um sistema de reconhecimento, que se prende diretamente a qualquer armação.
Embora não transmita pulsos diretamente ao cérebro, lê qualquer texto, de perto ou longe e o fala “ao pé do ouvido”. O nível de reconhecimento de texto e interpretação é impressionante. A média de leitura são 280 palavras por minuto.
Equipado com uma câmera de 13 megapixels, o sistema inicia a leitura apenas com o gesto de levar um dedo em frente às lentes. Parar também é simples: basta levantar a mão aberta. Assim como o V. I. S. O. R. da ficção, o My Eye não se restringe apenas à leitura. O equipamento também faz o reconhecimento de cores e mais importante, pessoas.
Atualmente, já 57 destes óculos, distribuídos em 56 bibliotecas paulistanas. Pelo senso comum, pode parecer suficiente, mas não é o caso. Há demanda para muito mais, tanto que a Prefeitura da capital paulista pretende ter cinco destes equipamentos em cada biblioteca.
Quem também disponibiliza os óculos "inteligentes" é a Universidade Federal de Juiz de Fora. A instituição mineira adquiriu em abril de 2022 quinze unidades, cedidas a alunos indicados pelo Núcleo de Apoio à Inclusão.
Gasto ou investimento?
Porém, a vontade pode esbarrar no custo. Cada unidade do My Eye sai em torno de R$ 14.200,00. E como todo investimento em saúde e educação neste país, costuma ser encarado como gasto.
Se esta é a realidade na cidade com maior capacidade financeira do país, imagina-se que a aquisição deste tipo de equipamento para outros rincões brasileiros levará mais tempo.
Vai além da boa vontade. Passa também pela vontade política.
Conhece alguém que se beneficiaria deste tipo de tecnologia? Conte pra nós!
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Eu volto.
Este artigo foi escrito por Clarissa Blümen Dias e publicado originalmente em Prensa.li.