Trabalho remoto além do trabalho – Como ficam as conexões humanas?
O trabalho remoto que pode ser feito de casa, de cafeterias, praias, coworkings e outros ambientes distantes do prédio da empresa já é uma realidade para muitas pessoas há um bom tempo, até antes mesmo da pandemia do covid-19 que tanto acelerou essa transformação.
Já sabemos que essa forma de trabalho promove muitos benefícios para os colaboradores e para as empresas, assim como demanda certas mudanças de atitude, treinamentos e recursos específicos para se ter um bom funcionamento e gerenciamento.
Agora, se ninguém (ou ao menos parte) da equipe não trabalha presencialmente, com as pessoas próximas umas das outras, como ficam as conexões humanas e o engajamento profissional entre os integrantes e com a própria empresa?
O ser humano, por natureza, é uma criatura que necessita viver em sociedade. Seja por motivos de segurança física, psicológica, afeto ou vários outros fatores, o coletivismo é algo intrínseco de nossa espécie.
Sabemos que o fato de a pessoa não ir fisicamente até o ambiente de trabalho não significa que ela não se integra aos vários outros núcleos afetivos da sociedade como seus núcleos familiares, amigos e colegas de outros ambientes que frequenta em sua vida.
Contudo, ainda que haja interações com outros grupos sociais que as pessoas em trabalho remoto possam usufruir, a relação com as pessoas específicas do ambiente de trabalho é muito importante e vantajosa para cada uma, incluindo para os desejos comerciais da própria organização.
Dentro dos ambientes empresariais, principalmente, a sinergia entre os envolvidos e o senso de pertencimento ao time são fatores muito importantes para o funcionamento a longo prazo e para a alta qualidade dos trabalhos. Nesse contexto, podemos citar:
- Colaboradores que criam um laço – de forma saudável – com os princípios e as pessoas que fazem parte da empresa, estimulando um senso de pertencimento, têm mais motivos e chances de continuarem a trabalhar na organização por mais tempo.
- Colaboradores que criam e mantêm conexão com outras pessoas da organização, conhecendo suas tarefas, rotinas diárias e estresses – sejam da mesma equipe ou não – conseguem ter mais clareza sobre os motivos e necessidades em entregar os projetos que essas pessoas demandam, diminuindo gargalos e eventuais e atrasos.
- Colaboradores que têm com quem descontrair, desabafar ou mesmo falar de forma mais aprofundada sobre dúvidas, ideias para o trabalho e até questões pessoais sentem-se mais informados, menos estressados e, assim, mais motivados e satisfeitos emocionalmente para poder focar e inovar em seus trabalhos.
Como em qualquer dinâmica social, a troca e o aumento do leque de informações, questionamentos e imaginação promove a criatividade e potenciais soluções inovadoras, além do próprio bem-estar e da satisfação dos participantes.
As próprias pessoas são tão importantes quanto as tarefas elas executam para a empresa. As pessoas precisam sim de interação umas com as outras no ambiente de trabalho, mas isso não significa que precisa ser uma interação presencial – não obrigatoriamente, pelo menos.
Além das muitas ferramentas digitais que permitem documentações de processos, desenvolvimentos, gerenciamento de tarefas, custos e cronogramas, há diversos métodos online que ajudam a promover a socialização, dinâmicas de descontração e o engajamento entre os indivíduos.
Essas dinâmicas podem promover um ambiente mais saudável e estimulante para todos durante o dia a dia.
Quadro para indicações
Podem ser usados quadros virtuais onde cada pessoa lista filmes, séries, livros ou viagens pelas quais tem interesse e que indica aos colegas.
Semanalmente, esse quadro pode ser acessado por todos em uma reunião online, permitindo que as pessoas conheçam mais sobre os interesses uma das outras, vejam as semelhanças e coincidências entre cada uma e conheçam coisas novas por recomendação uma das outras.
Esse aumento de repertório, além de influenciar no crescimento individual de cada um – seja pessoal ou profissional – permite que todos compartilhem suas opiniões sobre as obras e os itens listados, gerando empatia entre os envolvidos e ajudando-os a encontrar laços em comum.
Quadro para conhecer o time
Também podem ser usados quadros mais personalizados onde os integrantes dos times compartilham imagens que representam assuntos que gostam, assuntos que não gostam e experiências que já viveram ou que sonham em viver em suas vidas.
Sem escrever nenhuma palavra, todas as explicações a respeito de cada imagem ocorrem em dinâmicas de interação e conversas online, aumentando a participação, a curiosidade e o engajamento do time.
Com um ritmo de stortytelling, uma pessoa segue a dinâmica escolhendo uma imagem por vez e conversando com as outras a respeito de seu significado em sua vida e narrando os acontecimentos. Após compartilhar alguns pontos sobre sua vida de forma aberta e descontraída, é a vez de passar o bastão para outro colega e assim por diante.
Isso permite que cada membro do time vá se sentindo cada vez mais à vontade para compartilhar sua personalidade e conhecer pontos diferentes e pontos em comum com a vida e os sonhos dos outros colegas.
Kudo Box
O uso das famosas “Kudo Box” pode fazer com que cada um troque feedbacks, elogios e agradecimentos às pessoas da equipe de modo a relembrar para todos e reforçar as atitudes realizadas pelos colegas durante os períodos de trabalho. Assim, o valor positivo que as pessoas geraram e que, muitas vezes, poderia passar desapercebido, relembra e floresce a dedicação de cada um.
Baseada em cards de reconhecimento e valorização dos aspectos profissionais ou pessoais dos membros do time, essa dinâmica apoia no fortalecimento da sensação de afinidade e estima entre os envolvidos, demonstrando as ações que as pessoas fizeram ao longo do tempo e que nem imaginaria que despertasse tantos bons sentimentos nos demais.
Usando com bom senso
Independente da dinâmica ou da ferramenta usada, é importante que elas não sejam usadas de forma rígida. Quem permitir e conduzir esses processos de engajamento deve, igualmente, permitir que as pessoas possam ter conversas livres umas com as outras.
Mais do que um “processo”, essas atitudes devem influenciar uma sensação real e natural de relacionamento saudável entre os colegas.
O objetivo não é obrigar ninguém a conversar sobre algo que não se sinta à vontade, a forçar a criação de amizades e nem mesmo permitir essas conversas só para os líderes aparentarem uma falsa imagem de preocupação com as pessoas e sua socialização.
Da mesma forma, como isso ocorre em um ambiente de trabalho – ainda que seja remoto – as pessoas precisam ser lembradas de que há comportamentos que não podem fugir do profissionalismo e nem mesmo da ética ou do respeito.
Conflitos devem ser mediados, impedimentos devem ser identificados e removidos, e até mesmo a “dominância” do tempo de fala por determinadas pessoas, o que diminui a participação dos demais, deve ser um dentre outros fatores de ética e comunicação sempre presentes no radar das lideranças e de seus envolvidos para fomentar as conexões sem liberar válvulas para qualquer desinformação ou mesmo ofensa.
Um bom gerenciamento de processos de trabalho conciliado com dinâmicas de conexão entre as pessoas envolvidas deve ser feito de forma responsável, mas não autoritária. Se essa condução for feita de uma maneira intimidadora para os membros da equipe, nenhum estímulo real de socialização pode nascer.
A sensação de liberdade e de segurança – mediadas pelo respeito – é o que dá as pessoas os principais estímulos para interagirem umas com as outras de forma natural.
Com essa promoção da socialização, ainda que muitos dos funcionários não virem grandes amigos, o relacionamento no dia a dia de trabalho se mostrará muito mais fluído e positivo com essas técnicas.
Assim, cada time fica cada vez mais engajado em seus processos cotidianos, reduz grande parte da possível insegurança e até da possível sensação de abandono que um trabalho fisicamente distante dos demais colegas pode causar a pessoas com determinados perfis, assegurando que a vida das pessoas terá benefícios e que o ambiente de trabalho pode evoluir muito com eles.
Este artigo foi escrito por Gabriel Tessarini e publicado originalmente em Prensa.li.