Um Crime, Duas Versões: O Ponto de Vista Dela
Dirigidos por Mauricio Eça e roteirizados por Ilana Casoy e Raphael Montes, os filmes foram lançados diretamente para Streaming pela Amazon Prime. Ilana é criminóloga e já escreveu alguns livros de não ficção crimes famosos, incluindo esse. Já Raphael, é escritor de livros policiais de ficção.
Os dois se uniram pela primeira vez ao escreverem juntos o livro Bom Dia, Verônica que se tornou uma série na Netflix, a qual ambos adaptaram o roteiro. Nesses dois filmes, eles se basearam nos autos do processo, especialmente no depoimento dos envolvidos.
Aliás, o filme todo é narrado pela Suzane, interpretada por Carla Diaz, durante o julgamento. Isso explica o porquê do filme parecer condescendente com ela no começo, mas logo é esquecido que a história está sendo contada sob o ponto de vista dela.
Digo isso porque é muito visível que o roteiro já estava enviesado a dar autoria do crime para a Suzane. O que não faria sentido com a intenção principal de ambos os longas, de fazer o público questionar e julgar qual das versões é a verdadeira.
Mas esse não é o maior dos problemas. O roteiro em si é ruim e dá a sensação de que tem algo faltando. E não é por ter sido dividido em dois. Além de se basear nos autos e no julgamento em si, ele toma algumas liberdades artísticas, mas ainda assim não funciona. O artigo do Wikipédia é mais coeso que o enredo do filme.
A atuação da Carla nas cenas do julgamento não é convincente. É até meio preguiçosa, às vezes. Em uma cena onde a personagem expressou autopiedade, a atriz deu uma revirada de olhos muito explícita, como se não acreditasse no que dizia. Nas cenas de flashback, a personagem estava ainda mais forçada e caricata, apesar das tentativas da atriz de dar mais veracidade nos momentos de drama.
O filme usa como desculpa o uso de drogas para a mudança de comportamento dela, mas não se sustenta. É gratuito assim como as cenas sensuais entre Suzane e Daniel Cravinhos. Falando nele, é aqui onde ainda fica mais visível o quão inclinado o texto está contra a Suzane.
A transformação do personagem do Leonardo Bittencourt em um vilão abusivo e assassino foi por pura conveniência tanto da Suzane quanto do roteiro em si. Pois não é mostrado um confronto direto entre Manfred, interpretado por Leonardo Medeiros, e Daniel.
Eles só se encontraram duas vezes. Durante a ceia de natal na casa da família dela e um jantar na casa da família dele. O que o Daniel sabia do pai dela foi o que ela contou para ele, dando a entender que ela o convenceu de matar os seus pais, indiretamente. Não é dado um motivo plausível para ele ter planejado o crime além do dinheiro dela.
Os atores veteranos também fizeram o que podiam com o texto que receberam, mas se saíram melhor do que os mais jovens. Eram mais críveis e a diferença de personalidades era mais notável, assim como o preconceito da família Richthofen, segundo Suzane, em relação à família dos Cravinhos.
O filme se propôs apenas a ser uma dramatização, mal feita, dos relatos da Suzane e com o julgamento como pano de fundo, não mostrando a conclusão do mesmo e nem os momentos pós-crime, como o funeral dos pais dela e a prisão dos três. A produção apenas colocou um texto no final, dizendo que Suzane e os irmãos Cravinhos foram condenados e o tempo da pena para cada um. Simples assim, bem insatisfatório.
Imagem: Divulgação
Este artigo foi escrito por Fabio Farro de Castro e publicado originalmente em Prensa.li.