Universo Estendido da DC: Necessidade de Mudanças
Reboot já se tornou algo rotineiro na cultura nerd. Praticamente é o ato de reiniciar uma história e recontar ela de forma atualizada com pequenas ou grandes alterações. Podemos ver isso em filmes, séries de TV, animação e nas Histórias em Quadrinhos.
O primeiro caso de reboot nas HQs foi justamente na DC quando, no fim dos anos 50, uma nova versão do Flash, Barry Allen, surgiu no intuito de revitalizar o gênero e atrair novos leitores. Em 1961, a DC lançou a história “Flash de Dois Mundos” onde trouxe de volta o Flash original, Jay Garrick, e apresentou, pela primeira vez, o conceito de Multiverso. Na história, cada Flash pertencia a uma Terra diferente.
Conforme a criatividade de seus roteiristas e o crescimento da própria editora, que comprava personagens de editoras menores, o Multiverso da DC se expandiu até se tornar muito confuso tanto para os leitores antigos quanto para os novos. Então, em 1985, foi publicada a Crise Nas Infinitas Terras, uma saga em 12 partes que eliminou o excesso e juntou o que sobrou em um único universo, o reiniciando do zero.
E não seria a única vez. Nas décadas seguintes, a DC publicou outras sagas que, ou corrigiram algumas incongruências como Zero Hora e Crise Infinita, ou mudariam tudo de novo drasticamente como Flashpoint.
Com esse histórico é de se esperar que os fãs da DC sejam receptivos à mudança, certo? Apesar de tanto Crise Nas Infinitas Terras quanto Flashpoint já terem sido adaptadas para o audiovisual, no caso as séries da CW, não repetiram a mesma ousadia de suas fontes originais. No máximo, unificaram algumas séries no mesmo universo, confirmaram que os universos cinematográficos fazem parte do multiverso e só.
A questão é que surgiram boatos que o filme do Flash vai apagar a cronologia estabelecida por Zack Snyder e criar uma nova. Junto com isso, veio uma onda de reclamações, criticas e até medo por parte dos fãs de que os rumores sejam confirmados. Mas não há motivos para pânico. Primeiro, porque já era algo esperado.
O Universo Estendido da DC até aqui
A Warner e o Snyder são criticados desde Homem de Aço de 2013. Tanto pelo final polêmico quanto pelo tom, dito por muitos como incompatível com a essência do personagem. Não havia sido criado pensando em um universo compartilhado, deixando isso para a sua sequência: Batman V Superman – A Origem da Justiça.
Com um enredo visivelmente feito às pressas, Batman V Superman é confuso. Precisou de uma versão estendida para que muitas partes fossem compreendidas. Sem falar que as referências à futura Liga da Justiça simplesmente foram jogadas ali apenas como um aceno para o filme da equipe. As críticas em relação ao tom excessivamente sombrio continuavam, apesar de defensores do universo concebido por Snyder terem começado a surgir.
O primeiro filme a sofrer interferências dos executivos do estúdio foi Esquadrão Suicida de David Ayer. Planejado, inicialmente, para seguir o mesmo tom dos filmes do Snyder, ele foi alterado pela Warner para que agradasse um público mais acostumado com os filmes da Marvel. Outro erro. Reeditado pela mesma empresa que havia feito os trailers, o filme representava como as coisas estavam confusas na Warner/DC.
Já Mulher-Maravilha de Patty Jenkins, é bom, apesar do sofrível terceiro ato. O que não se pode dizer do filme seguinte: Liga da Justiça. Além dos conflitos com os executivos da Warner, Zack Snyder teve que lidar com uma tragédia pessoal que o motivou a sair do projeto. Em seu lugar, entra Joss Whedon que teve um curto tempo para fazer refilmagens e alterar o tom do filme. Detestado por muitos, esse filme jogou a última pá de cal sobre o universo cinematográfico planejado por Snyder.
Apesar dos filmes seguintes, Aquaman de James Wan e Shazam de David F. Sandberg, terem referências ao filme da Liga e aos filmes do Superman, já é notável a preocupação em se distanciar do tom apresentado por Snyder. São filmes leves e coesos.
Aves de Rapina de Cathy Yan e Mulher-Maravilha 1984 de Patty Jenkins seguiram pelo mesmo caminho, leve e colorido, apesar do longa-metragem dirigido por Yan ter sido classificado para maiores de 18 anos, por causa da violência e drogas no filme. Mas ambos tiveram bilheterias baixas.
Então, no ano passado, graças à pressão dos fãs do Snyder, estreou a versão de Zack Snyder do filme da Liga no streaming da Warner, HBO Max. Com 4 horas e 2 minutos, sendo o filme de super-heróis mais longo até agora, ele agradou tanto aos fãs quanto aos críticos. Mas não foi unânime. Muitos acharam o filme longo demais, com muitas cenas dispensáveis e excesso de câmera lenta.
Antes do lançamento do filme do Flash, a Warner trouxe O Esquadrão Suicida de James Gunn, ainda no ano passado, e logo teremos Adão Negro de Jaume Collet-Serra e O Batman de Matt Reeves em 2022. Sendo que esse último não faz parte do universo estendido da DC.
Eu já comentei sobre o filme do Esquadrão Suicida aqui em dois textos, um com spoilers e o outro, sem. Por estar em pós-produção, não foram divulgadas muitas informações sobre Adão Negro. O que se sabe é que terá a participação da equipe conhecida como Sociedade Da Justiça. Nas HQs, a Sociedade foi um grupo anterior a Liga, atuando décadas antes. Não foi revelado se será esse o caso no filme.
Além disso, havia a dúvida de qual das duas versões do filme da Liga iria valer ou se o estúdio iria continuar com os planos de Zack Snyder. Mas recentes fotos de bastidores do filme Batgirl, aparentemente, responderam essa questão.
Indícios do Fim
Já foi confirmado que Michael Keaton voltará como Bruce Wayne/Batman, tanto em Flash quanto em Batgirl. Ben Affleck confirmou publicamente que irá interpretar a sua versão do homem-morcego pela última vez no filme do velocista escarlate.
E no dia 10 de janeiro foi divulgada uma foto dos bastidores de Batgirl: Um mural com a dupla dinâmica desenhada nele. É possível ver que o uniforme do Batman nessa arte está mais próximo da versão do Michael Keaton do que da versão do Ben Affleck.
Imagem: Mural com arte do Batman e Robin nos bastidores do filme de Batgirl/Andrew Milligan/PA Wire
Juntando tudo isso com o rumor de que o filme do Flash irá modificar, não só o passado do Universo Estendido da DC como aspectos visuais, tudo leva a crer que será esse mesmo o caminho.
A Faca e o Queijo na Mão
A Warner/DC tem de um lado todo um histórico de sagas das HQs que alteraram origens e outros pontos importantes do passado dos personagens e do outro, um filme que se baseou em uma dessas sagas e que, tudo indica, pode alterar a cronologia dos filmes. Só não acontecerá se não quiserem ou souberem fazer.
Como citei anteriormente, as séries da CW tiveram a mesma possibilidade, mas preferiram não arriscar, resultando em uma história inferior ao que prometia. Flash é o personagem perfeito para consertar o Universo Estendido da DC, por estar sempre envolvido com viagens no tempo e alterações de realidades, é só saberem usar tudo isso direito na grande tela.
Vingadores Ultimato pode ter tido uma viagem no tempo. Loki pode ter apresentado o conceito do Multiverso para os fãs dos filmes da Casa das Ideias. WandaVision pode ter mostrado alteração de realidades. E o filme do Homem-Aranha pode ter tornado válidos os universos de suas versões anteriores.
Mas nenhum deles alterou o passado a ponto de ter sérias ramificações no presente como, possivelmente, o filme do Flash poderá fazer. Sim, tem o segundo filme do Doutor Estranho que irá sair em maio. Mas iremos falar mais sobre isso em um futuro texto.
Não importa se a Marvel fizer antes, se a DC quer ter um universo cinematográfico coeso e consistente, precisa dar esse passo adiante e se reconstruir. Nem que, para isso, tenha que desconsiderar os filmes feitos por Snyder e provocar a ira de seus fãs.
Este artigo foi escrito por Fabio Farro de Castro e publicado originalmente em Prensa.li.