Violência - Substantivo Feminino
O mundo muda, os termos sobre fenótipos e genótipos do sexo e da sexualidade tem se multiplicado, à titulo de classificação, e dizem as bolhas, que dar nomes ajuda a discutir e estereotipar o mal.
Mas agressão continua sendo um substantivo feminino.
Gramaticalmente ele não se modifica.
Mas a agressão teve sua tecnologia renovada com mais rapidez que a comunicação atingiu nos últimos 100 anos. Uma tecnologia que com ótima intenção uniu mulheres de raças e credos diferentes, mas ignorou que a atrocidade humana se utiliza do conhecimento e de nuances particulares para o propósito de requintar crueldades.
Eu estou falando é de MULHER. Pode parecer daqui para frente que estou falando de moda, mas não, é de mulher.
A moda, a roupa em si, e suas transformações durante os séculos, metaforizam muito bem a evolução das formas de limitar, diferenciar e até ferir o corpo feminino.
A história da Beleza - Por falar em moda, me veio em mente o livro de Humberto Eco. Fala de senso estético como um todo, como o título diz "A Beleza". Será que o que declaramos, durante tantos séculos, como "belo" corresponde em nosso íntimo ao espetáculo que nos felicitamos em contemplar?
A lógica diz que se correspondesse, a crueldade impingida a nós em tais séculos não manteria nos sonhos femininos face horrendas, repleta de personagens predadores. Houve um tempo em que era digno correr atrás de bizões portando tochas para que eles sejam devorados após caírem nos despenhadeiros.
Eram os provedores que levariam tais troféus inclusive para nos alimentar. Acredito eu, que era um rito, que apesar dos requintes de crueldade, refletiam conceitos estéticos de nossa primitividade.
Pode estar difícil ligar um ponto ao outro deste meu raciocínio, mas eu vou tentar esclarecer de formas mais práticas e nesse momento eu não tenho como não falar de minhas próprias experiências, que comento apenas à título antropológico.
Eu aprendi, erroneamente, o que é violência, quando apanhei fisicamente pela primeira vez. Eu tinha 26 anos e hoje tenho 50 anos.
Hoje, eu me pergunto, enxergando centenas de nuances de violência contra a mulher, onde estava o senso crítico que nos fazia lavar as mãos mais vezes do que nesses últimos 2 anos de pandemia. Banalização da agressão? Memórias Ancestrais? Educação familiar? Eu vou dizer qual é a minha terrível teoria: O tal provedor ainda existe, o seu espetáculo de dominação ainda não é questionado como deveria ser. A justiça se desenvolveu? Nossa mente não, e nossos complexos ainda não nos permitem lutar contra o injustificável.
Voltando para a moda: Como quando as mulheres não podiam mais ser machucadas com os espartilhos, e passaram a ser machucadas por soutiens ou por saltos altos torturantes, por mais que a lei em si evolua, e o tal provedor (ou não) não possa mais atingir a sua vítima a atirando em despenhadeiros, vocês podem ter certeza, ele vai buscar novos caminhos para ferir esta mulher.
Seja desacreditando, seja alienando, seja prejudicando patrimonialmente, seja... É.... O mundo tem evoluído. A violência continua sendo um substantivo feminino e apesar de nos últimos tempos eu estar tentando exercitar a esperança, o que move a habilidade do HOMEM de se adaptar à diversas circunstâncias de sobrevivência, é a sua capacidade de renovar os sentidos e as novas formas de violência com mais competência do que criar soluções para a própria sustentabilidade de nossa existência.
Eu não quero mais gastar a minha, tentando entender por que a violência contra a mulher evolui, muda de forma. Eu prefiro EXISTIR acreditando que de alguma forma, eu mulher, essa simples existência representa um perigo muito grande à esse sistema cruel.
Este artigo foi escrito por Erika Pessanha e publicado originalmente em Prensa.li.