☕Vamos fazer uma pausa?
Pausa Para Um Café, um convite cultural em meio às avalanches de informação e demandas de trabalho.
A Pausa Para Um Café é construída por colunas assinadas pelos criativos que colaboram com a Prensa. A newsletter é um convite para uma pausa diante das avalanches de informação e das demandas de trabalho. Ela é uma seleção de conteúdos sobre cultura, comunicação, literatura, ciências, comportamento e sociedade. Saiba mais sobre o projeto e cada uma das colunas aqui.
No volume 1 da Pausa Para Um Café você verá:
A Caixa de Ferramentas do Intelecto: a ciência e a expressão artísticas são antagônicas? É com essa provocação que o editor audiovisual
abre a newsletter de hoje.Birdsong: o documentário que investiga a língua dos pássaros virou o monotema da redatora
nas reuniões diárias. Prepara um fone de ouvido antes de começar a ler, combinado?As Heroínas de Tejucupapo: a designer pernambucana
compartilha uma história que é contada de mães para filhas na Zona da Mata Norte de Pernambuco, onde aconteceu a primeira batalha protagonizada por mulheres na história do Brasil.A Vida dos Outros: o redator
sempre tem na manga uma fofoca sobre a MPB, ele finaliza a newsletter de hoje com Rita Lee, Elis Regina e Tom Jobim.
PORTAL PARA ESTA DIMENSÃO
por Júlio César
Se você fosse eleger apenas um conhecimento como mais importante, qual seria? A localização da Terra em relação ao centro da Via Láctea? A tabela periódica? A geração de eletricidade? A invenção da escrita? Nesta coluna inaugural, darei minha sugestão: a metodologia científica, que é um conjunto de ferramentas intelectuais, auxiliadas, claro, por instrumentos físicos, que nos permitem descobrir os mecanismos do mundo.
Por que começar por este tema? Primeiramente, pretendo começá-lo aqui, mas não findá-lo. É um assunto profundo e carrega consigo séculos de debates e livros. Comecemos por uma noção bastante básica: metodologia científica é o mecanismo da ciência. É a análise sistemática de dados objetivos sobre o mundo, do qual se extraem leis e teorias. A despeito de debates sobre o assunto, quando um caçador-coletor de 50.000 anos atrás investiga as pegadas de uma manada, de certo modo ele está fazendo ciência.
Uma vez que estamos numa newsletter de cultura, seria pertinente perguntar: a ciência e a expressão artísticas são antagônicas? Não as vejo como antagônicas, as vejo como capacidades humanas disjuntas e que atuam em dimensões diferentes. Acredito que Leonardo da Vinci, um grande curioso pelos mecanismos do mundo e um dos artistas mais celebrados da história, concordaria comigo.
A ciência fornece à arte recursos técnicos e novas fontes de inspiração. A arte dá à ciência novas ideias a serem sonhadas e pesquisadas (alguém falou em Star Trek?), mas também dá o meio de expressão estética que humanos precisam para apreender o mundo de modo mais intuitivo. Não apenas isso, a arte possibilita a expressão de encantamento e assombro com o mundo que é desnudado.
“A imensidão só é tolerável por meio do amor” - Carl Sagan
O método científico não traz verdades prontas. Esta caixa de ferramentas serve rigorosamente para se testar a validade das afirmações sobre o mundo disponíveis no mercado de ideias. O corpo do conhecimento científico é apenas consequência desse processo. Dito de outra forma, esta caixa de ferramentas também pode ser entendida como um processo no qual as conclusões são menos importantes do que a jornada em si.
Imagine o conhecimento como um grande quebra-cabeça. Ao longo do tempo você montou algumas ilhas de peças. Aos poucos mais peças se encaixam, ao ponto de se fundirem em continentes de conhecimentos integrados. A bem da verdade, ninguém possui o quebra-cabeça completo. Encontrar a próxima peça que se encaixa é uma boa metáfora para o desenrolar do processo científico.
Neste momento espero que tenha ficado claro que esta coluna pretende ser algo mais do que apenas uma coletânea de curiosidades sortidas sobre o mundo. Quero estimular o pensamento. Nosso fio condutor será a ciência e a filosofia.
Deixe sugestões de temas na caixa abaixo. Até a próxima!
REALISMO FANTÁSTICO
por Fernanda Waisman
(♫ Para ler ouvindo Blackbird, dos Beatles)
Você já imaginou conseguir falar a língua dos pássaros?
Eu confesso que nunca havia pensado no assunto mas, recentemente, assisti ao documentário Birdsong e, desde então, não consigo tirar isso da cabeça.
O documentário, produzido pelo The Guardian, investiga as tradições de assobio do povo Hmong, no norte do Laos. Ele acompanha as histórias de três pessoas que enfrentam o desafio de manter viva uma tradição que está desaparecendo: a linguagem musical que fala sobre a vida sem usar palavras.
Inspiradas pelo canto dos pássaros, essas pessoas abordam de uma forma única o amor, a vida em sociedade, as belezas da vida.
“Se todos pudessem entender e ouvir o som dos pássaros, como eu consigo, nós compreenderíamos mais uns aos outros. Não haveria mais conflito ou violência. Não haveria guerra.”
Parece maluquice mas é sério e eu fiquei absolutamente encantada. Recomendei o documentário para todas as pessoas com quem conversei desde então e não poderia deixar de fazer essa indicação pra você, também. Pensei muito na minha mãe, que sempre me disse que queria ser um passarinho. Lembrei do Renato Russo, que cantou sobre falar a língua dos homens e dos anjos e concluiu que isso de nada valeria sem o amor.
Ainda na monomania aviária, reli Fernão Capelo Gaivota, um livro belíssimo do Richard Bach que conta sobre uma gaivota em busca de um significado para a vida que vá além de seguir as regras de seu bando.
Gosto muito da história deste livro porque, afinal de contas, não estamos todos em busca desse tal significado para nossas vidas? Tenho quase certeza que sim - e torço com todo o meu coração para que o encontremos.
“Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!”
Mário Quintana
ÓCIO CRIATIVO
por Maytê Emilly
Um massivo conjunto de eventos marcou, em algum nível, a história da humanidade e permaneceu gravado em nossas memórias. Eles resistiram à erosão do tempo como resultado direto dos esforços daqueles empenhados em mantê-los vivos, e uma das maneiras mais antigas utilizadas para transferir saberes através de gerações é a tradição oral: o esforço de manter a história viva pela fala, contando-a de pai para filho. No entanto, eu gostaria de inaugurar a Ócio Criativo abordando uma que é passada de mães para filhas.
Interagindo com pessoas de outros estados, recentemente descobri que a história da Batalha de Tejucupapo, que eu acreditava ser amplamente divulgada, na verdade é um evento canônico apenas na vida dos goianenses que entram em contato com ela em salas de aula, indo assistir o teatro oficial no último domingo de abril ou até mesmo no Hino Municipal:
“Salve! A mais gloriosa trincheira
Da fé brasileira no ardor varonil
– onde nossa vovó com o filho guapo,
Em Tejucupapo salvou o Brasil!”
Hino de Goiana – PE
Tejucupapo é um distrito da cidade de Goiana (onde fui criada), localizada na Zona da Mata Norte de Pernambuco, e é também palco da primeira batalha protagonizada por mulheres na história do Brasil. Em abril de 1646, as chamadas Heroínas de Tejucupapo saíram vitoriosas de um confronto contra invasores holandeses, munidas apenas de armas improvisadas, como pedaços de madeira e panelas de barro cheias de água fervente e pimenta.
A história, passada principalmente por mulheres orgulhosas de suas antepassadas, relata que tudo aconteceu em um domingo: cerca de 600 holandeses invadiram e atacaram o povoado em busca de comida, acreditando que se encontrariam em vantagem pela ausência dos homens, que viajavam até Recife aos domingos para vender os frutos da pesca e produção agrícola local. No entanto, foram surpreendidos pela resistência das mulheres.
Organizadas e lideradas por 4 Marias (Camarão, Clara, Quitéria e Joaquina), as moradoras da vila se posicionaram em trincheiras e usaram estratégia e inteligência para superar a força física e quantidade dos invasores. Como resultado do confronto, cerca de 300 homens foram mortos, e os sobreviventes bateram em retirada, selando a vitória das heroínas.
Este é um dos muitos acontecimentos que evidenciam a força e, ao mesmo tempo, revelam o apagamento histórico de mulheres protagonistas, especialmente se elas são nordestinas. É também um convite para valorizar o esforço de um povo que se utiliza das poucas ferramentas que dispõe para honrar e preservar a memória daquelas que, contra todas as chances, defenderam com sucesso sua terra.
GELEIA GERAL
por Gal Florentino
Nada me entretém mais do que uma biografia. Em todos os formatos possíveis, adoro ler alguém escrevendo sobre si. Comecei 2023 carregando de um lado para o outro a capa alaranjada de Rita Lee: Uma Autobiografia, terminava um capítulo, abria o streaming e escutava o disco completo ou uma sequência de músicas que ela havia contado histórias sobre. Não foi fácil assimilar sua morte depois de tanta intimidade, um encontro seguido de uma despedida. Sem melancolia, afinal, a própria Santa Rita de Sampa já havia feito sua Profecia.
Certo dia, decidi fazer um coffee-office em Pinheiros. Para a minha sorte, o lugar para onde iria estava fechado. Andei alguns quarteirões e me deparei com a Cinesala, um dos cinemas de rua que ainda resiste em São Paulo. Em cartaz: Elis & Tom. Faltavam cerca de duas horas para a sessão. Era o que eu precisava para terminar alguns trabalhos e - sem planejar - assistir o documentário que narra a colaboração turbulenta dos dois artistas brasileiros.
Quando o assunto é Elis Regina, inevitavelmente lembramos do recente episódio onde a montadora Volkswagen recriou a imagem da cantora com o uso das inteligências artificiais. Ao lado de Maria Rita, embaladas pelo hit atemporal Como Nossos Pais. A mãe Elis dirigindo a vintage - nunca velha - Kombi dos anos 50, e a filha Maria Rita com as mãos na versão moderna batizada de VW ID.Buzz.
Essa não foi a primeira controvérsia tecnológica que serviu de encruzilhada na carreira da cantora que recebe o título de maior do Brasil até os dias de hoje. Do rádio à TV, do banquinho e violão à guitarra elétrica, da metade do século passado ao ano de 2023. De Tom à Elis, personagens ativos nas revoluções da arte e da comunicação. O que podemos refletir sobre inovação, modernidade e comunicação com os Encontros e Despedidas de Elis & Tom?
A Pausa Para Um Café é uma newsletter quinzenal. Saiba mais sobre o projeto e cada uma das colunas aqui.
Até a próxima Pausa,
Time Prensa